IPBES: uma década depois, o que se pode esperar?

Dispomos de um sistema global de observação do clima, mas não de um sistema global de observação da biodiversidade. Não há capacidade instalada para monitorizar as mudanças na biodiversidade e avaliar a eficácia da implementação das políticas com vista à sua conservação e uso sustentável.

Na nona reunião do plenário da Plataforma Intergovernamental para a Biodiversidade e Serviços de Ecossistemas – IPBES, a decorrer em Bona (Alemanha), entre 3 e 9 de Julho, deixo uma breve nota sobre esta entidade cada vez mais relevante para a conservação da biodiversidade global. Estabelecida em 2012, tem-se afirmado como entidade intergovernamental independente e aberta, disponibilizando aos decisores políticos avaliações científicas sobre o conhecimento do estado da biodiversidade e dos ecossistemas do planeta e dos benefícios que prestam às pessoas, bem como os meios para proteger e utilizar de forma sustentável os recursos naturais. Para cumprir esta missão, conta com os contributos da comunidade científica, proporcionando aos governos, sector privado e sociedade civil as evidências para incentivar políticas baseadas no conhecimento.

A primeira avaliação temática da IPBES foi conhecida em 2016, e debruçou-se sobre os polinizadores, a polinização e a produção alimentar, suscitando um novo olhar sobre a proteção e a importância de todos os polinizadores, os quais passaram a beneficiar de políticas mais fortes a nível global, nacional e local.

Agora na reunião IPBES 9, serão discutidos e submetidos a aprovação dois novos relatórios de avaliação científica: um sobre a utilização sustentável das espécies selvagens, e outro sobre os múltiplos valores da natureza e dos seus benefícios. Durante a reunião será também decidido o lançamento de um novo relatório sobre as empresas e a biodiversidade, a ser elaborado nos próximos anos.

No próximo ano, será publicado um relatório sobre espécies exóticas invasoras e o seu controlo, e dois outros relatórios estão já em preparação: um sobre o nexo entre a biodiversidade, a água, a alimentação e a saúde (e como alcançar simultaneamente os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável relacionados com a alimentação, a água e a saúde, abordando também o clima e a energia juntamente com a biodiversidade e os ecossistemas); e outro sobre a mudança transformadora, onde a IPBES procura interpretar os valores e comportamentos na origem da perda direta e indireta de biodiversidade. As causas subjacentes à perda de biodiversidade são complexas e muitas vezes negligenciadas, mas precisam de ser compreendidas para que possam ser devidamente abordadas.

O relatório sobre a avaliação global sobre a biodiversidade e os serviços dos ecossistemas, em 2019, destacou a atual perda de biodiversidade e a degradação da natureza, trajetória negativa que não permitirá cumprir os ODS 14 e 15, os dois mais diretamente relacionados com a biodiversidade. Com o uso excessivo de pesticidas, a perda da biodiversidade dos solos e dos polinizadores, entre outros, não conseguiremos cumprir o ODS 2 (acabar com a fome). A elevada desflorestação, a degradação dos solos e o uso excessivo de fertilizantes também não permitirão atingir os objetivos do ODS 13 – tomar medidas urgentes para combater as alterações climáticas e os seus impactos. A desflorestação ameaça igualmente o ODS 3 relacionado com a saúde; a proteção da biodiversidade não é apenas necessária para conservar a natureza, mas também para alcançar todos os outros ODS e proteger todas as outras contribuições da natureza para as pessoas.

Dispomos de um sistema global de observação do clima, mas não de um sistema global de observação da biodiversidade. Não há capacidade instalada para monitorizar as mudanças na biodiversidade e avaliar a eficácia da implementação das políticas com vista à sua conservação e uso sustentável. Atualmente, os dados relativos à biodiversidade são recolhidos de acordo com protocolos distintos, armazenados em bases de dados dispersas, com muitas lacunas e nenhuma capacidade operacional, sem estruturas dedicadas para garantir a recolha a longo prazo e o armazenamento adequado de dados.

Estas lacunas são particularmente importantes nos países em vias de desenvolvimento, onde se encontra muita biodiversidade. Vai ser necessário investir e desenhar mecanismos efetivos de apoio aos países com menos recursos! Há grande expetativa que este compromisso surja na 15.ª sessão da Conferência das Partes na Convenção sobre a Diversidade Biológica (COP15), a ocorrer em dezembro de 2022, no Canadá. O agravamento da crise climática e a rápida perda de biodiversidade a nível global continuarão a reclamar uma crescente intervenção da IPBES.

A autora escreve segundo o novo acordo ortográfico

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