Por um voto postal se ganha, por um voto postal se perde

Se há três anos o voto era remetido dentro de uma caixa de cartão cujas instruções de montagem faziam inveja ao mais complexo móvel, agora basta um pequeno envelope verde com o boletim de voto no seu interior.

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Rui Gaudencio

Estando a residir em Inglaterra desde 2007, foi preciso chegar a 2022 para votar pela primeira vez para as eleições legislativas.

Minto, em 2019 também votei, e votei por voto postal. Infelizmente, sem quaisquer instruções em inglês no envelope de retorno de modo a assegurar o envio do mesmo, o resultado não podia ser outro senão a devolução do voto para a minha morada por duas vezes.

Querendo exercer este direito pelo qual tantos lutaram, acabei nos correios de Sua Majestade a pagar do meu bolso o envio com aviso de recepção e até hoje, três anos passados, ainda estou para saber se o meu voto chegou ou não ao destino final.

2022 e estamos no segundo round. Se o voto presencial no Consulado é agora possível, a presente pandemia não deixa outra escolha senão, e mais uma vez, o voto postal.

Assim, e antes de mais, o meu agradecimento à Comissão Nacional de Eleições pela simplificação do voto.

Se há três anos o voto era remetido dentro de uma caixa de cartão cujas instruções de montagem faziam inveja ao mais complexo móvel, agora basta um pequeno envelope verde com o boletim de voto no seu interior.

E se há três anos o boletim de voto, a cópia do Cartão de Cidadão e caixa de cartão não cabiam de modo algum dentro do envelope de retorno, hoje, e acabei de fazer a experiência, cabe tudo.

É possível. Mais. O envio tem instruções em inglês, francês e português! É mesmo possível. E mal posso esperar para, finalmente e volvidos mais de 14 anos, votar. No entanto, nem tudo está garantido.

O anonimato do meu voto não está garantido e esta discussão já é antiga. Para não falar na protecção de dados e alguém que nos diga sobre o fim dado à fotocópia do Cartão de Cidadão.

O envelope não tem remetente, impossibilitando a devolução caso haja algum problema no envio, problema esse possível ou não estivesse o porte pago mal traduzido por “reply paid” (resposta paga) ao invés do correcto “paid return envelope”.

Para além disto, o voto só é válido se chegar ao Ministério da Administração Interna na Praça do Comércio, Lisboa, até 9 de Fevereiro.

Independentemente do número de trabalhadores neste momento doentes ou infectados e onde se incluem os serviços postais de Sua Majestade. Sem esquecer as consequências do Brexit e as demoras no envio de correio e encomendas entre o Reino Unido e a Europa continental.

Conclusão: mais uma vez não há garantia de que o meu voto chegue ao destino. Sendo o voto presencial no Consulado e sendo o Consulado uma secção de voto, porque não a opção de envio para esta mesa?

Porquê a necessidade de envio dos votos postais por avião para Lisboa, mais a pegada ecológica de 300 quilogramas de dióxido de carbono?

A natureza agradece. E assim temos a certeza em como o nosso voto, a nossa escolha, em suma, a democracia, conta.

Até lá, este gesto, o envio de uma carta na esperança de que o mundo mude, não é senão simbólico.

Não obstante, acreditamos. Não obstante, saímos à rua. Não obstante, votamos. E passamos a palavra para que o mundo mude, se não para nós, então para quem vem a seguir. E não paramos.

Acabámos de votar!

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