Delegados do Chega impedidos de propor eleição directa das bases

A tensão sobre o reforço da democracia interna no Chega foi evidente no quarto congresso do partido, em Viseu. A eleição directa das estruturas das bases — as concelhias — mantém-se na prateleira.

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Militantes que se tinham preparado para apresentar e defender as suas propostas perceberam que a mesa do congresso mudara de planos LUSA/NUNO ANDRÉ FERREIRA

Sem explicações, o quarto congresso do Chega, que termina este domingo em Viseu, pôs na prateleira sete propostas para eleições directas das concelhias, adiando mais uma vez o pedido de reforço da democracia interna do partido.

No programa original do congresso, estavam reservadas quase quatro horas para a participação dos militantes na tarde de sábado, num item chamado “intervenções políticas” e “apresentação e votação das recomendações feitas pelos congressistas”. A seguir, às 18h45, esperava-se o discurso de André Ventura, fundador e presidente do partido, para apresentar a sua moção estratégica global.

Chegada a hora, os militantes que se tinham preparado para apresentar e defender as suas propostas, perceberam que a mesa do congresso mudara de planos. Para espanto de alguns — mas sem agitação visível —, a mesa decidiu perguntar se os congressistas queriam ouvir as recomendações (na prática, nada distingue as “recomendações” das “moções” apresentadas nos congressos).

Aberta a votação de “aceitação das recomendações”, a maioria dos militantes votou para não ouvir os seus colegas. Houve 213 votos contra, 168 a favor e 35 abstenções. Sete das nove recomendações propunham que as estruturas das concelhias deixem de ser nomeados pelas distritais — como acontece neste momento — e passem a ser eleitas pelos militantes de forma directa.

A moção de dez militantes de uma lista “independente” da distrital do Porto — com militantes cujos cartões vão do n.º 500 ao n.º 17.224 — “pede que definitivamente se decida a data” das eleições directas nas concelhias, as bases do partido e “primeiro nível da nossa estrutura”, e se acabe com “o limbo”. Actualmente, os presidentes das concelhias são nomeados pelas distritais e, em último caso, pela direcção nacional do Chega e o próprio Ventura.

Em nome do grupo, Fernando Arriscado, 61 anos, jurista e consultor de empresas, ia apresentar seis argumentos em defesa das eleições directas para as concelhias: “as nomeações pecam quase sempre por serem uma figura ligada ao amiguismo, quando não a nepotismos”; “a meritocracia fica em questão”; “as nomeações podem criar uma equipa de subservientes, incapazes e incompetentes”; “os que nomeiam, se forem autoritários, menos preparados ou receosos de perder os lugares, irão rodear-se de pessoas sem mérito”; trava as “discussões e lutas de alecrim e manjerona”, e trava a “perda de militantes, a falta de pagamento de quotas, a abstenção — só no Porto foi de quase 70% nas eleições para delegados [do congresso de Viseu]”.

“Se achamos que os militantes são capazes de votar para uma distrital que não conhecem, pessoas que nunca viram, com mais razão achamos que podem votar nas pessoas da sua terra, que vêem todos os dias ou conhecem pessoalmente”, lê-se no texto.

Os apelos para a eleição directa nas concelhias vêm já do congresso de Évora, em 2020, no qual foram aprovadas moções nesse sentido, mas sem consequências concretas. No congresso de Coimbra, em Maio deste ano, foram novamente propostas alterações e, num processo de negociação com a proponente de uma delas, a direcção nacional comprometeu-se a fechar o dossier após as eleições autárquicas de Setembro. Foi retirada do texto dos estatutos a menção à nomeação das concelhias pelas respectivas estruturas distritais e incluída uma nota de rodapé que diz que mantém-se a nomeação até decisão diferente em conselho nacional

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