Farmacêutico? Farmácia?

Se é responsabilidade dos farmacêuticos garantir a segurança e efetividade dos tratamentos prescritos, como se justifica que não tenham acesso à informação clínica dos utentes a quem têm o dever de garantir segurança e saúde?

O farmacêutico, mais frequente e carinhosamente conhecido por menino ou menina da farmácia (porque é nesse local que a população mais contacta com ele, embora ele “exista” noutros locais), é o profissional de saúde responsável pela segurança e correta utilização de tecnologias de saúde, nomeadamente os medicamentos e os dispositivos médicos.

É dele a responsabilidade de o tratamento prescrito ser fornecido à pessoa correta, na altura correta. É dele a responsabilidade de prestar todas as informações, ensinamentos e esclarecimentos sobre o tratamento: como, quando e durante quanto tempo tomar. É também dele a responsabilidade de confirmar que o que foi prescrito é o mais seguro e adequado para essa pessoa, tendo em conta todas as idiossincrasias individuais e as terapêuticas já instituídas, evitando possíveis problemas relacionados com a medicação: interações, duplicação de medicação, reações adversas evitáveis e contraindicações.

Para garantir que determinado tratamento é verdadeiramente seguro para o utente, o farmacêutico vê-se e deseja-se, pois não possui acesso à informação clínica. Não sabe que outros medicamentos o utente toma, que alergias ou doenças tem, estando inteiramente dependente da informação prestada pelo próprio, sendo que muitas vezes o próprio tem idade avançada, múltiplas doenças, consulta vários médicos e muitas, muitas, caixas de medicamentos em casa. Assim, como devem imaginar, garantir que não irão ocorrer problemas relacionados com a medicação torna-se complicado e esta deveria ser uma preocupação da sociedade em geral, particularmente para garantir a saúde dos mais suscetíveis: os nossos seniores e as pessoas com doença.

O que me leva a questionar: se é responsabilidade dos farmacêuticos garantir a segurança e efetividade dos tratamentos prescritos, como se justifica que não tenham acesso à informação clínica dos utentes a quem têm o dever de garantir segurança e saúde?

Além disso, é importante referir que é também dos farmacêuticos a responsabilidade de garantir que esse tratamento continua a ser seguro e eficaz para a pessoa ao longo do tempo. A responsabilidade dos farmacêuticos não acaba no ato da dispensa, tendo estes um papel preponderante na farmacovigilância: são eles os responsáveis por receber e interpretar as notificações de reações adversas de medicamentos e são eles que decidem (com base científica!), tanto no nosso Infarmed como na Agência Europeia de Medicamentos, se determinado dispositivo médico, medicamento ou vacina deve continuar a estar disponível ou ser retirado do mercado.

Nem toda a gente que trabalha numa farmácia é farmacêutico. Sei que isto poderá ser uma surpresa para alguns, mas existem também técnicos de farmácia e técnicos auxiliares de farmácia, que trabalham sob a orientação e responsabilidade dos farmacêuticos nesses locais. Da mesma forma, existem também outras “variantes” de farmacêuticos para além dos comunitários (os tais que trabalham em farmácias). Em hospitais, laboratórios de análises, na indústria farmacêutica, em entidades reguladoras, entre outros locais, trabalham farmacêuticos que desempenham o seu papel no acesso, segurança, correta utilização e inovação das tecnologias de saúde disponíveis.

Um farmacêutico não é uma pessoa que trabalha numa farmácia. Um farmacêutico é um profissional de saúde que, entre outros locais, pode trabalhar numa farmácia.

É importante entender que farmacêuticos e farmácias não são a mesma coisa, nem sequer é como tomar o todo pela parte. Não são as farmácias que vacinam ou testam (ou hipoteticamente renovariam a medicação), são os farmacêuticos.

E talvez venha desta confusão o problema na obtenção da resposta à pergunta que atrás coloquei. Por isso, entenda-se: os farmacêuticos precisam de acesso aos dados clínicos dos utentes para exercer o seu papel de forma sustentada e integrada com os outros profissionais de saúde, para garantir a segurança e a saúde de todos aqueles que servem.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

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