Cartas ao director

Um planeta sustentável e abundante

Discordo das vozes que dão os políticos como todos medíocres, sedentos de poder e de tirarem benefícios próprios. É que, a bom da verdade, a generalidade manifesta uma genuína preocupação com o bem comum. Mas, lamentavelmente, continuamos a ter uma globalização baseada em tratados comerciais focalizados quase exclusivamente nos produtos a transaccionar e não nos modos como são produzidos e nos impactos que estes têm ao nível ambiental, laboral ou social. É neste contexto que, no meu entender, se insere a pandemia actual e a encruzilhada entre a crise ecológica e a desregulação global em que vivemos. Importa, por isso, estabelecer um novo contrato entre a humanidade, natureza e tecnologia. Assim sendo, urge combater as alterações climáticas, reflorestar, proteger a biodiversidade, investir na ciência e em novas tecnologias para transportes menos poluentes (...). Um rumo complexo e árduo, como é compreensível, embora para os verdadeiros decisores constitua o objecto de desejo político no horizonte: legar em boas condições um planeta sustentável e abundante aos nossos vindouros.

Manuel Vargas, Aljustrel

Brado de revolta

Andamos há semanas a ouvir as notícias cada vez mais avassaladoras sobre a situação no norte de Moçambique, situação que está a atingir um ponto de completa obscenidade e insanidade mental. Dá vontade de soltar um brado de revolta e um palavrão vernáculo. O Governo português está à espera de quê? Hoje mesmo, amanhã, tão breve quanto possível, devia estar a partir para lá um avião carregado de mantimentos e medicamentos e algum pessoal de saúde. Através da ONU temos tido tropa portuguesa em vários países da África Ocidental e Central, então agora não há nenhum país que faça o mesmo para Moçambique? A França, por exemplo, que aparece sempre como a grande protectora dos países africanos, não se chega agora à frente? E a ONU chefiada por um português?... E para que serve a CPLP? Deixem-se de reuniões e protocolos, de almoços e jantares “de trabalho” e enviem um pouco de auxílio para aquela parte tão sofredora da Humanidade, que até deve dizer alguma coisa aos portugueses (e ao Presidente Marcelo, que enche a boca com a sua amizade por Moçambique), mas é já, não é daqui a semanas. Puxa! Que falta de noção da urgência num caso tão dramático!<_o3a_p>

Fernando Santos Pessoa, Faro

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Sobre o editorial “O Brasil caminha sobre brasas”

O jornalista Manuel Carvalho, arguto analista das coisas políticas em Portugal e no mundo, escreveu um editorial muito crítico a Bolsonaro, com boa reflexão sobre a trágica realidade atual do Brasil. Infelizmente termina mal, com a frase: “E os militares, que têm revelado distância e responsabilidade institucional, enervam-se.”

Prezado jornalista: os militares, a começar do antigo chefe do Exército, general Villas-Boas, estão longe de “revelar distância e responsabilidade institucional.” É certo que a situação atual, com a demissão do ministro da Defesa e dos três chefes das Forças Armadas, configura uma crise militar. Mas também é certo que as Forças Armadas apoiaram ostensivamente o candidato Bolsonaro em 2018 e foram mesmo decisivas na pressão sobre o Superior Tribunal Federal que inviabilizou a candidatura Lula. Bolsonaro foi durante 28 anos, como deputado, uma espécie de “sindicalista” de militares, policiais e milícias. Eleito presidente, com o voto maciço destes setores da sociedade, entre outros, concedeu prebendas a militares, policiais e milícias. Facilitou o armamento para as milícias, fez uma reforma previdenciária com amplos benefícios aos militares e recrutou para postos civis do aparelho do Estado e de seu governo mais de 10 mil oficiais das Forças Armadas. O Brasil tem hoje, na prática, um governo-civil-militar. Altos oficiais da reserva, que ganham ótimas reformas, somam seus rendimentos com os salários de assessores especiais no Estado. A cúpula em torno de Bolsonaro tem vários generais da reserva e até da ativa, em postos políticos. Leia a ordem-do-dia do recém nomeado ministro da Defesa, general Braga Neto, sobre o golpe militar de 31 de março de 1964, um monumento à desonestidade intelectual sobre a História do Brasil.

Assim, prezado jornalista Manuel Carvalho, sugiro que complemente seu artigo, retratando esta realidade verde-oliva do panorama político-institucional no Brasil. Os golpes nos últimos tempos são mais sutis. Já não é preciso quarteladas.

Carlos Henrique Vianna, co-fundador e ex-presidente da Casa do Brasil de Lisboa

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