Universidades: “Nas aulas estamos divididos, no exame todos juntos. De que vale isso?”

Salas lotadas, sem distanciamento ou janelas: há denúncias de universitários em relação às medidas sanitárias nas salas de exame. Presidente da Associação Académica de Lisboa e Federação Académica do Porto dizem não ter recebido queixas.

Foto

Catarina Rodrigues e a turma recusaram-se a fazer um exame do curso de Ciência Política e Relações Internacionais da Universidade Lusófona de Lisboa. “Nas aulas estamos divididos em dois turnos, mas no exame estamos todos juntos. De que vale isso?”, questiona a estudante que pertence à Quarentena Académica, uma plataforma que pretende dar respostas aos alunos do ensino superior relativamente às mudanças que a covid-19 está a provocar na educação.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

Catarina Rodrigues e a turma recusaram-se a fazer um exame do curso de Ciência Política e Relações Internacionais da Universidade Lusófona de Lisboa. “Nas aulas estamos divididos em dois turnos, mas no exame estamos todos juntos. De que vale isso?”, questiona a estudante que pertence à Quarentena Académica, uma plataforma que pretende dar respostas aos alunos do ensino superior relativamente às mudanças que a covid-19 está a provocar na educação.

O exame iria ser realizado numa biblioteca onde “não havia espaço para cumprir o distanciamento, filtragem de ar ou janelas”: “Dissemos que nos recusávamos a fazer o exame porque não havia segurança. A professora aceitou — e não houve exame.” Desde esse dia, refere, as queixas foram ouvidas e os requisitos sanitários impostos pela covid-19 passaram a ser cumpridos em todos os exames. “Mas é triste termos que estar a pedir pelos nossos direitos”, atira. E não poupa críticas: “O Governo continua a não responder às exigências dos estudantes e apelamos para que este tipo de situações não sejam ignoradas.”

Não é caso único. O P3 recebeu uma denúncia feita por um estudante da Faculdade de Arquitectura da Universidade de Lisboa, que não quis ser identificado. As imagens mostram uma sala lotada durante uma frequência, onde não é assegurado o distanciamento físico entre alunos: “Nem um metro de distância havia, não havia ventilação e éramos pelo menos 50 alunos dentro da sala”, assegura. “Durante todo o semestre tivemos horários alternados de forma a ter aulas online e presenciais, para diminuir o risco de contágio entre alunos e professores. Para agora ser tudo em vão e sermos todos expostos ao risco de contaminação.”

Foto
Imagem captada antes de uma frequência na Faculdade de Arquitectura da Universidade de Lisboa DR

O estudante refere que a turma manifestou o desconforto ao professor, mas de nada adiantou. “Eram ordens do reitor.” O exame aconteceu e todos os lugares que ainda aparecem vazios nas imagens foram ocupados, assegura. “Houve ainda outra sala onde aconteceu o mesmo.”

Hélder Semedo, presidente da Associação Académica da Universidade de Lisboa, acredita que “as regras têm sido cumpridas”. Pôde comprová-lo numa vista às diferentes faculdades da Universidade de Lisboa: “Num auditório onde caberiam 600 alunos, o máximo [agora] é de 100.” Por isso, acredita que o sucedido na Faculdade de Arquitectura terá sido um caso isolado. Refere ainda que, “por pressão da academia, todos os exames estão a ser feitos de forma presencial para evitar a desconfiança, o plágio, copianços ou pessoas contratadas a fazer os exames [em vez dos alunos]”, depois de ter havido um aumento de notas muito significativo após a transição para o online. 

Ao P3, a Faculdade de Arquitectura da Universidade de Lisboa garantiu que tem havido “muito cuidado na aplicação das recomendações da Direcção-Geral da Saúde”, tendo a faculdade, no início do ano lectivo, feito uma “adaptação dos espaços e dos procedimentos”. Entre as medidas, está a organização das salas de aula “com o adequado espaçamento frontal, lateral e diagonal” e dos auditórios, que foram “organizados com o espaçamento adequado entre as cadeiras, estando este espaçamento devidamente identificado através de sinalética”.

Foram também “colocados dispensadores de álcool gel junto a cada sala e à entrada de cada edifício, sendo assegurada a ventilação de ar adequada através da abertura das janelas de bandeira, das portas das salas para o exterior, bem como a extração forçada de ar em todos os edifícios da Faculdade”, garante a instituição. No caso dos exames, acrescenta, “foi previsto um distanciamento superior ao recomendado” e o Conselho Pedagógico fez saber que “a divisão dos alunos das Unidades Curriculares com várias turmas deverá ser efectuada em grupos mais pequenos para efeitos de avaliação escrita”.

Relativamente à sala em questão, a Faculdade de Arquitectura afirma que “tem capacidade para cerca de 90 alunos, garantindo a distância mínima de segurança recomendada pela DGS, tem extracção forçada de ar e portas de saída e entrada distintas”. “Durante os exames, todas as salas serão utilizadas para um número de alunos inferior ao da sua lotação máxima prevista para as aulas em pandemia, conforme nota interna do nosso Conselho Pedagógico”, acrescenta.

A Faculdade de Arquitectura da Universidade de Lisboa refere que a obrigatoriedade dos exames presenciais é uma determinação do Reitor da Universidade de Lisboa, que visa garantir a “credibilidade do sistema de avaliação”. “Compreendemos que, dada a situação do país, existam alunos que se sintam inseguros e não queiram realizar avaliações presenciais, mas a instituição providenciou todas as medidas de segurança, distanciamento e higienização necessárias e que se têm revelado eficazes”, conclui.

No Porto, a Federação Académica diz não ter recebido qualquer denúncia de incumprimentos das directrizes sanitárias para os exames. A Universidade do Porto refere que foi criado em Março de 2020 um Plano de Contingência que passou, em Abril, a conter “normas e recomendações para a realização de avaliações presenciais pelas faculdades”. Segundo o documento, é “obrigatório o uso de máscara, distância de dois metros radiais, utilização de espaços maiores (como auditórios ou até pavilhões gimnodesportivos ou bibliotecas) ou divisão das turmas em diferentes grupos para garantir o devido distanciamento físico entre estudantes das salas e reduzir a taxa de ocupação dos edifícios”.

A Universidade do Porto aponta ainda que as orientações dadas pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior às instituições foram no sentido de manter as aulas e avaliações em regime presencial “sempre que possível, cumprindo com todas as normas e recomendações das autoridades de saúde”. E, apesar de algumas faculdades terem adoptado um modelo de avaliação distribuída, com recurso a trabalhos e apresentações orais, tal não é “exequível em todos os casos”.

Actualizado às 11h32 de 11 de Janeiro de 2021: foram acrescentadas declarações da Faculdade de Arquitectura da Universidade de Lisboa ao P3.