O Prémio e a terminação

Disse Santo Agostinho que a memória é o presente do passado. Cá estamos, passados 50 anos, a dar razão também a Walter Benjamin quando diz que a “memória é a mais épica das nossas faculdades”; e ética, também. Que o digam os muitos testemunhos que, utilizando o FB, de forma informal e espontânea confirmaram vivências marcantes em relação ao prémio Camões 2020; e já lá vão 50 anos!!!.

O jornal PÚBLICO acolheu um texto, pretensamente de resposta a considerações por mim emitidas no espaço de opinião que é o FB, com o título torguiano “é um bicho da terra tão pequeno”.

Título pouco poético, mas involuntariamente certeiro: quem denuncia é isso mesmo: um bicho da terra tão pequeno. Verdade que se impõe sem precisar de ‘correias de transmissão” nem de “assembleias de amigos”.

Pediram-me um artigo para uma revista e não o fiz. Uso preferencialmente o espaço do FB que é o que é: ponto de encontro para amigos e conhecidos que apreciam despretensiosamente a “espuma dos dias”; bem diferente é “preparar” um texto para a imprensa escrita como fez o autor da prosa a que agora respondo. Acontece que não se trata de ninguém que faça parte da minha lista de dialogantes. Poderá continuar, inflamado, o seu solilóquio, já que responde verdadeiramente ao que não existe. Agradeço, porém, a sua zelosa atenção, e sobretudo o que ela transmite: o claro reconhecimento da veracidade de todos os factos por mim lembrados, aos quais se vieram acrescentar muitos e muitos outros. De tudo isto, uma conclusão emerge, cristalina: quem escreve procura minimizar a real importância e significado dos factos, em nome da sua inabalável crença na capacidade da regeneração humana...

Não farei a hermenêutica desse texto. Não ignoro os instrumentos de análise que ‘explicariam’ e ajudariam a ‘compreender’ o quanto de hilariante, patético, farsesco se esconde sob a capa da arrogância argumentativa. Uma ‘narrativa’ com picos disfóricos, entre o socialismo de Sampaio, a democracia de Soares, e o meu couraçado ‘estalinismo’...   É um fato que não se me ajusta. Não me serve em nada e muito menos para um absurdo ‘ajuste de contas’.

Disse Santo Agostinho que a memória é o presente do passado. Cá estamos, passados 50 anos, a dar razão também a Walter Benjamin quando diz que a “memória é a mais épica das nossas faculdades”; e ética, também. Que o digam os muitos testemunhos que, utilizando o FB, de forma informal e espontânea confirmaram vivências marcantes em relação ao prémio Camões 2020; e já lá vão 50 anos!!!.

Job tem uma incomensurável paciência em certas circunstâncias... Dá sempre tempo a que se esconjurem os fantasmas em quem os tem... Tem Paciência. Relembro o pedido do autor do escrito em questão, para incluir, ao tempo, num dos seus blogs, o texto Santa Paciência de minha autoria. Podia relembrar-lho agora, com acrescida e insuspeitada propriedade. Duvido que ainda o aprecie, ao contrário de todos os meus amigos e leitores, naturais destinatários destes despretensiosos escritos:

Volto a olhar o horizonte e no silêncio da noite vou rezando um infindável terço:

- Paciência para a mediocridade instalada;
- Paciência para o arrivismo, essa filosofice dos invertebrados;
- Paciência com o poder; ele também é paciente e nem sempre há médico que o aceite;
- Paciência com o saber entronizado, catedrático, mas vazio e frágil como os fios de uma marioneta.
- Paciência com o impossível; é uma doença incurável, mas já diagnosticada;
- Paciência com o corpo; ele te sustenta e pacientemente te atura;
- Paciência com os pigmeus de espírito que parecem gigantes em terra de anões.

Paciência, calma, para enfrentar com vigor a mesquinhez, o postiço, o oco enfeitado por lantejoulas...

Paciência para a Vida, que a morte é paciente.

    Cajadães, 4 de Novembro de 2020

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