A dislexia no ensino superior

Fará sentido um movimento de escola inclusiva também no nível de ensino superior?

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Primeira aula de uma cadeira de ensino superior: entre cerca de 100 alunos, 3 a 7 ficam para o fim da aula para falar com o professor – “Tenho dislexia”; “Tenho dificuldades na leitura e escrita, mas não tenho um diagnóstico identificado”; “Tenho défice de atenção” (testemunho dado por um professor universitário).

Entraram, na primeira fase de concurso de acesso ao ensino superior público deste ano, cerca de 51 mil estudantes. Quantos deles sofrerão de uma perturbação da aprendizagem específica na leitura (dislexia)? Quantos deles sofrerão desta problemática e nunca foram diagnosticados? Que dificuldades sentem os alunos com dislexia, no ensino superior? A dislexia condiciona a escolha do curso? Quantos alunos com dislexia terminam a formação superior? O seu desempenho é idêntico ao dos colegas, ou será mais baixo?

Estas são algumas perguntas que nos parecem pertinentes, e que seria importante investigar em Portugal, onde os estudos sobre a prevalência de estudantes com dislexia a frequentar a universidade são ainda escassos.

Atualmente, temos uma legislação para a escola inclusiva (DL 54/2018 de 6 de julho), que regula a aplicação de medidas educativas de acordo com uma abordagem multinível, de forma a garantir uma educação para todos até ao final da escolaridade obrigatória. Fará sentido um movimento de escola inclusiva também no nível de ensino superior?

Estudos científicos mostram que a dislexia é uma dificuldade que acompanha os sujeitos ao longo de toda a vida. Normalmente os estudantes conseguem desenvolver algumas estratégias que lhes permite lidar com as dificuldades na leitura, e os sintomas podem até ter diferentes manifestações de acordo com a fase da vida em que se encontram, mas existem dificuldades que persistem até à idade adulta, nomeadamente no processamento fonológico, linguagem escrita e memória de trabalho.

Adultos com dislexia mostram habitualmente dificuldades na precisão ortográfica, em organizar a escrita de um texto, em tirar apontamentos, na velocidade leitora, em compreender grandes quantidades de texto complexo, entre outras. Sendo a leitura e a escrita as atividades dominantes em ambiente escolar, não será difícil perceber que os alunos com dislexia necessitam de maior esforço e de dedicar mais tempo para conseguir o mesmo que os restantes colegas. Paralelamente aos efeitos no nível académico, existe um impacto importante nos níveis comportamental, emocional e social. Os estudantes com dislexia experienciam elevados níveis de ansiedade, sentimentos negativos em relação à sua competência, frustração, perda de motivação no investimento da aprendizagem, problemas na autoestima e no relacionamento interpessoal, devido a atitudes e crenças de colegas, professores e, por vezes até mesmo os próprios pais, que consideram que são alunos menos inteligentes e menos empenhados.

De acordo com a experiência que temos no CADIn, continuam a chegar-nos adultos que, apesar de terem sentido dificuldades ao longo da escolaridade e de terem consciência das mesmas, nunca tiveram acesso a um diagnóstico e procuram a sua confirmação tardia, ou estudantes que necessitam de uma fundamentação para pedir a adequação de medidas educativas na instituição de ensino superior que frequentam.

São muitas as entidades de ensino superior que implementam várias adaptações, permitindo tempo extra, o uso do dicionário, a leitura oral de enunciados, o recurso a tecnologias de informação e comunicação, valorizam o conteúdo em detrimento da organização ou ortografia, e utilizam métodos de avaliação diversificados, como a avaliação oral, etc., medidas essas que permitem uma melhoria no desempenho académico, mas também na sua qualidade de vida.

Em jeito de conclusão, consideramos que a importância da inclusão não termina no 12.º ano. Um aluno com dislexia pode ter dificuldades em realizar e concluir o ensino superior, mas consegue ter sucesso, desde que tenha uma resposta educativa e intervenção adequadas.


Psicóloga educacional do CADIn