Pessoas altamente sensíveis: “Nunca devemos culpar os outros por não nos entenderem”

Karina Zegers de Beijl fundou a Associação de Pessoas Altamente Sensíveis em Espanha, faz aconselhamento nesta área e escreveu Pessoas Altamente Sensíveis.

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"Todas as PAS são criativas e desde muito cedo" DR

Duas em cada dez pessoas têm uma maior sensibilidade perante a vida, o que pode provocar stress, incompreensão e até dor. A holandesa Karina Zegers de Beijl descobriu-o desde muito cedo — como daquela vez em que fugiu de uma amiga da avó, numa festa de aldeia, em Espanha, onde todos a olhavam com curiosidade por ser muito branca, muito loura e tão diferente dos demais —, mas só em 2004 conseguiu dar um nome ao que sentia. Foi por essa altura que se cruzou com o trabalho da psicóloga e investigadora norte-americana Elaine Aron que, em 1991, identificou não uma doença, mas um traço de personalidade de alta sensibilidade e chamou-lhe Pessoas Altamente Sensíveis (PAS). 

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Duas em cada dez pessoas têm uma maior sensibilidade perante a vida, o que pode provocar stress, incompreensão e até dor. A holandesa Karina Zegers de Beijl descobriu-o desde muito cedo — como daquela vez em que fugiu de uma amiga da avó, numa festa de aldeia, em Espanha, onde todos a olhavam com curiosidade por ser muito branca, muito loura e tão diferente dos demais —, mas só em 2004 conseguiu dar um nome ao que sentia. Foi por essa altura que se cruzou com o trabalho da psicóloga e investigadora norte-americana Elaine Aron que, em 1991, identificou não uma doença, mas um traço de personalidade de alta sensibilidade e chamou-lhe Pessoas Altamente Sensíveis (PAS). 

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A edição da Esfera dos Livros está à venda desde Maio (18,90 euros) DR

Como é que se identifica uma PAS? É alguém que se assusta ou chora facilmente, que sente intensamente quando cheira um perfume ou emociona-se desmedidamente quando vê um filme ou ouve um concerto. Mas também é aquela pessoa que desmaia perante uma má notícia ou que se angustia com o tanto que tem para fazer. Mas desengane-se quem pensa que os PAS são tímidos, introvertidos e querem viver protegidos do mundo, há 30% que são extrovertidos, identificou Aron.

Não há uma cura para as PAS, até porque não sofrem de qualquer doença, mas é preciso aprender a viver com este traço de personalidade. Karina Zegers de Beijl aprofundou os seus conhecimentos sobre este tema, fundou a Associação de Pessoas Altamente Sensíveis em Espanha, onde vive, faz aconselhamento nesta área e escreveu Pessoas Altamente Sensíveis, publicado em Maio pela Esfera dos Livros.

Como é que alguém descobre que é uma PAS?
Sinceramente, não sei. Depende da pessoa e das suas circunstâncias. Normalmente, as pessoas começam a procurar no Google a razão por que se sentem diferentes, com um sentimento de não pertença, de estranheza porque os outros dizem-lhes que são demasiado sensíveis, ou porque stressam com facilidade, ou porque o mundo as magoa, sofrem com isso, com as injustiças sociais, ou porque têm que parar de trabalhar por causa de um esgotamento... Mas muitas pessoas também descobrem através dos seus filhos pequenos, depois de a escola as informar que há algo de “errado” com os seus filhos.

No entanto, não é uma doença, mas um traço de personalidade. Quem é o especialista que a identifica, um médico ou um psicólogo?
É uma característica e geralmente as pessoas podem identificá-la sem ajuda. Eu fi-lo, a maioria fá-lo. Contudo, existem testes que permitem verificar e, depois há a “ferramenta” dos quatro pilares — ou seja, as quatro características básicas da alta sensibilidade: a sobrestimulação, elevada capacidade sensitiva, a forte emotividade e empatia e, por último, a forma intensa de processar a informação recebida. Infelizmente, ainda não existem muitos profissionais de saúde que conheçam ou reconheçam esta característica, a não ser que também sejam PAS. 

O que devem saber os pais para identificar que o “problema” do filho é PAS e não hiperactividade ou autismo, duas das doenças que menciona no seu livro?
A diferença entre PAS e hiperactividade ou qualquer distúrbio de concentração é que a criança com PAS pode ficar sobrecarregada com o excesso de informações e vai desligar-se. Mas quando esta criança está em casa, onde está quieta, não revela qualquer problema de concentração; uma criança com hiperactividade é sempre hiperactiva e não será capaz de se concentrar. Em relação às crianças com Asperger difere principalmente no que diz respeito à empatia, e embora muitos Aspergers sejam capazes de aprender sobre empatia cognitiva e aplicar esse conhecimento em situações sociais, numa PAS a empatia é inata e decorre da inteligência emocional, digamos que vem do coração.

Uma criança que é uma PAS será uma pessoa criativa quando crescer?
Todas as PAS são criativas e desde muito cedo. O que é a criatividade? É a capacidade de criar algo novo. Este ‘algo’ pode ser um pensamento, uma ideia, uma solução, uma ‘obra de arte’, um relacionamento... A criatividade é um conceito enorme!

Como as PAS são mais empáticas, acabam por sofrer mais. Como podem proteger-se? Como é que os pais podem ajudar um filho PAS? Ou, uma PAS deve ser protegida?
É verdade que alguns PAS acabam por sofrer mais, mas “mais do que quem”? Ser empático não é igual a sofrimento. Uma pessoa pode estar ciente do sofrimento de outras pessoas, ou animais, sem sofrer por si própria. De facto, a situação ideal seria não sofrer, mas registar e entender os outros que sofrem e, a partir dessa realidade, tentar encontrar soluções para ajudar. A pessoa que absorve o sofrimento dos outros não poderá ajudá-los adequadamente e acabará por sofrer mais do que o outro que está a sofrer.

As PAS que sofrem tendem a ter muito activos os neurónios-espelho [que reflectem a actividade que estão a observar], e isso é um problema. Uma PAS pode aprender a separar as águas, discernir entre o que pertence a um e o que pertence a outro. Algum nível de introspecção pode ajudar, assim como o autoconhecimento e a autoconsciência ajudam muito. Obviamente, isso requer treino e não há uma solução instantânea. Os pais precisam de ajudar os filhos a ver as situações em perspectiva, mas, para isso, os pais precisam primeiro de entender o que é a autoconsciência. Contudo, há uma pergunta simples que a pessoa pode fazer a si mesma: “Em que posso ajudar?” Essa permite desviar a atenção do outro para si mesmo.

Uma PAS, porque se destaca das outras pessoas, pode ser vítima de bullying na escola ou de mobbing no local de trabalho? Como proteger-se?
O bullying é um problema social e não acontece apenas às PAS. No que diz respeito às crianças: as escolas são responsáveis, os pais podem e devem ajudar. É importante que os pais (especialmente os pais que são PAS) eduquem a criança com amor e respeito, mostrando-lhe sempre que não há nada de errado com ela. A diversidade é uma vantagem; o mundo precisa de tanta diversidade quanto possível. Ajude a criança a ver que todos são diferentes, seja de que maneira for; que um grupo de pessoas, grandes ou pequenas, precisa de umas que se importam com os outros e criam beleza, mas também precisa de pessoas que limpem, construam e combatam. Isso ajudará a criança a sentir-se digna de si mesma, a ter auto-estima. Um agressor não ataca crianças com auto-estima.

Quando ao adulto: um PAS adulto que sofre de mobbing geralmente tem baixa auto-estima e sente-se inseguro, inadequado e fraco. Isso pode ser consequência de um problema na infância, por exemplo. Por isso, o adulto precisa de trabalhar a sua auto-estima. 

Uma PAS deve exigir que os outros a tratem de maneira diferente?
Não! É importante que aceitemos que somos assim e assumamos a responsabilidade pelo que e como somos. Nunca devemos culpar os outros por não nos entenderem. No máximo, a pessoa deverá esperar ser aceite por quem é, da mesma forma que tem também de aceitar os outros como são. Funciona nos dois sentidos, não é? O meu truque é rir-me de ser diferente. Não dramatizando, saindo cedo ou não indo a lugares que sei que não me vou sentir bem, dizendo à família e aos amigos que há coisas que não funcionam comigo. E desculpo-me com um sorriso ou uma gargalhada porque a culpa não é de ninguém, porque nem todos gostamos das mesmas coisas.

Não sendo uma doença, mas um traço de personalidade, não pode ser combatido? Não podemos educar uma criança a não ser uma PAS?
Alguém pode mudar a cor dos olhos com que nasce? Se nascer com uma característica, essa permanece até ao final da vida. Então, por que quereremos contrariar isso? O traço é neutro, não é bom nem mau, não é positivo nem negativo. Uma PAS com uma educação positiva não verá essa característica como um problema, porque os adultos (pais e professores) não fizeram disso um problema. Uma PAS com uma educação mais difícil ou conflituosa pode acabar por ver a sua sensibilidade como um problema, porque não entende que é uma característica. Assim que essa pessoa perceber que não é o traço que é o problema, mas a maneira como não o integrou, essa perspectiva negativa mudará.

Uma PAS tem capacidade de se adaptar e reprimir essa característica ao crescer?
Sim, podem adaptar-se e, provavelmente vão fazê-lo, mas, mais cedo ou mais tarde, terão uma crise, porque só conseguimos fingir ser quem não somos por um certo período de tempo.

Mas não deveria ser mais importante a pessoa encaixar-se na sociedade em que vive?
Mas quem é que se quer encaixar? Queremos realmente vender a nossa alma? Não seria muito mais fácil e saudável conhecermo-nos, aprendermos a conhecer e a aceitar quem somos e quem queremos ser, e lutar por uma sociedade diferente e mais humana?