Sudão vai criminalizar mutilação genital feminina

Num país onde quase 87% das mulheres entre os 15 e os 49 anos foram submetidas a mutilação genital, a prática passa a ser punível até três anos de prisão. A preocupação centra-se, agora, na clandestinidade da prática, já que é vista por muitas famílias como necessária para que as filhas tenham hipóteses de casar.

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JAMES AKENA

O Sudão vai aprovar uma lei que criminaliza a mutilação genital feminina, prática enraizada no país. É um novo passo na transição para a democracia, após a queda do regime ditatorial de Omar al-Bashir em Abril. O projecto de lei foi aprovado pelo governo sudanês a 22 de Abril e prevê penas de prisão até três anos, além da retirada de licença médica onde a operação for efectuada.

No Sudão, nove em cada dez mulheres entre os 15 e os 49 anos foram submetidas à mutilação genital, segundo a UNICEF. Esta prática é totalmente condenada pela Organização Mundial de Saúde (OMS), que a considera uma violação dos direitos humanos.

Um relatório divulgado em Março classifica como mutilação genital “todos os procedimentos que envolvam a remoção, parcial ou total, da genitália feminina externa ou que causem outras lesões a órgãos genitais femininos, por motivos não-médicos”. Segundo a OMS, estes procedimentos não trazem qualquer benefício à vida de uma mulher, podendo até causar graves hemorragias, infecções, complicações no parto e um agravamento do risco de morte do recém-nascido.

Estimativas das Nações Unidas indicam que, pelo menos, 200 milhões de mulheres e raparigas em todo o mundo foram submetidas a esta prática. Em países como o Egipto, o corte é proibido por lei, mas continua a ser praticado clandestinamente.

A clandestinidade é uma das razões que levam algumas organizações a verem esta medida com apreensão. Faiza Mohamed, directora regional da Equality Now em África, explicou à Reuters que esta é uma prática comum no Sudão e, deste modo, o Governo “pode enfrentar desafios na aplicação da legislação”. “As pessoas que ainda acreditam na prática podem não denunciar casos ou agir para o impedir quando sabem que isso está a acontecer”, acrescentou. 

Contudo, esta medida é uma “vitória para as mulheres sudanesas”, como a classifica Nahed Gabralá, chefe de uma organização não-governamental que protege as mulheres e crianças no Sudão. É um passo em frente por parte do governo sudanês na busca pela democracia e igualdade.

Segundo a BBC, houve tentativas prévias de proibir esta prática no país, mas o ex-presidente rejeitou todas as recomendações.

O governo de transição comprometeu-se a dar prioridade aos direitos das mulheres e o primeiro-ministro nomeou mulheres para cargos de gabinete nos assuntos externos, juventude e desporto, ensino superior e desenvolvimento laboral e social. Em Novembro, o novo regime tinha já revogado leis que restringiam as liberdades das mulheres, nomeadamente a liberdade de escolha do vestuário.

No entanto, ainda há um longo caminho a percorrer, pois, entre outros, a violação conjugal e o casamento de crianças não são considerados crimes no país.

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