Partidos apoiam reabertura da economia a metro e a medo

Último a ser recebido pelo Governo, numa maratona de dez horas, o PS elogiou os outros partidos. Mas não faltam preocupações com a reabertura da economia, por modalidades de 200, 400 e mais metros quadrados. A fé e o futebol vêm a caminho.

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Ronda de encontros do Governo com os partidos durou mais de dez horas, e à saída foram mais as preocupações do que os elogios LUSA/António Cotrim

A estratégia de reabertura gradual da economia ― que será hoje aprovada pelo Governo, após o confinamento ditado pela covid-19 ― parece reunir a aprovação da maioria dos partidos. Mas à saída de uma ronda de encontros que durou mais de dez horas, foram mais as preocupações do que o regozijo. Ainda que globalmente os partidos concordem com a estratégia de António Costa, insistiram nos avisos à navegação.

A poucos dias de terminar o terceiro estado de emergência, os partidos estão apreensivos com o fim abrupto dos apoios excepcionais e com a eventual inconstitucionalidade de medidas que pode trazer a declaração de estado de calamidade em lugar do estado de emergência. O PÚBLICO sabe que, para se precaver, o Governo prepara-se para substituir o apoio na lei pelo apelo à consciência. Deixa, por exemplo, de haver uma obrigação legal de confinamento; o executivo fala agora de um “dever cívico de confinamento”.

Seguindo as recomendações dos especialistas, o executivo desenhou um plano de reabertura gradual para arrancar já na  segunda-feira com os negócios de pequena dimensão na linha da frente: só abrirão espaços até 200 metros quadrados, para além dos negócios específicos de cabeleireiros, stands e livrarias. Abrem ainda bibliotecas, arquivos e serviços públicos desconcentrados. Excluídos desta fase continuam os restaurantes, que continuarão a ter de trabalhar em regime de take-away e entregas ao domicílio e todos os espaços comerciais com mais 400 metros quadrados, que terão de esperar por 18 de Maio.

Nessa data reabrem também as Lojas do Cidadão, mas obrigadas a não ultrapassar a lotação de cinco pessoas, funcionários incluídos, por 100 metros quadrados.

O futebol regressará no final de Maio, adiantou o deputado do Chega, André Ventura. Para 1 de Junho ficam os cinemas e outras salas de espectáculo, bem como as celebrações religiosas.

Segundo o presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), João Vieira Lopes, para 1 de Junho ficará também a reabertura do pré-escolar, bem como dos centros comerciais.

No entanto, o Governo insiste que a reabertura gradual da economia não será ainda sinónimo de normalidade. Para já, e no caso dos cabeleireiros e barbeiros, por exemplo, continuará a haver limitações na lotação dos espaços, para assegurar que se cumprem as regras de distanciamento social e, como já se antecipava, a realização destes serviços estará sujeita a marcação prévia. 

Ajustes possíveis

Apesar dos cenários traçados, a agenda não está fechada e é expectável que possa haver ajustamentos (e reaberturas adiadas). De acordo com o plano apresentado aos parceiros sociais e aos partidos, e como António Costa tem repetido, o impacto das medidas será reavaliado a cada 15 dias, à luz da evolução da pandemia.

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Rui Rio está preocupado com a violação da constitucionalidade com a substituição do estado de emergência pelo estado de calamidade LUSA/ANTÓNIO COTRIM

Foi nesse terreno de receio e prudência que os partidos optaram por centrar as suas preocupações. Do lado do PSD, a nova fase de resposta ao vírus através do recuo para o estado de calamidade “não traz qualquer problema, desde que seja salvaguarda a componente constitucional”. O líder social-democrata não escondeu a sua preocupação em relação à exequibilidade das medidas e preferiu manter o alerta, apelando ao Governo que aja “sem ferir a Constituição”.

Por outro lado, Rui Rio acredita que a declaração de estado de calamidade poderá ajudar as pessoas a perceber que o fim do estado de emergência não é sinónimo de segurança e de normalidade. “Os números que ouvimos na reunião com os especialistas não apontam para uma melhoria fantástica. O facto de estar melhor não é o suficiente para voltar a uma vida próxima da normalidade”, alertou à saída daquela que foi a reunião mais longa da ronda de encontros.

O líder do PSD apontou outras duas preocupações: a lentidão da chegada dos apoios às empresas por questões burocráticas; e as dívidas do Estado aos fornecedores. 

Já o BE disse estar especialmente preocupado com os apoios indexados ao estado de emergência. “É preciso planear o apoio social para lá do estado de emergência e isso ainda não está feito”, considerou a líder do BE. Catarina Martins alertou o Governo para a necessidade de alargar os critérios de atribuição do subsídio de desemprego e do subsídio social de desemprego, nomeadamente através da redução de prazos de garantia. Catarina Martins defendeu ainda a extensão dos apoios para os trabalhadores independentes “que têm sido excluídos”, bem como dos trabalhadores mais vulneráveis, como é o caso das trabalhadoras domésticas.

Ferramentas ou poderes suficientes

De acordo com a coordenadora bloquista, que não adiantou detalhes, o Governo está a estudar o prolongamento de apoios indexados ao estado de emergência, como a possibilidade dada aos pais de ficar em casa com os filhos menores de 12 anos (uma vez que a esmagadora maioria das escolas não reabrirá este ano lectivo).

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Jerónimo de Sousa diz que não faltam leis para responder à crise "faltam medidas" LUSA/ANTÓNIO COTRIM

Sem se alongar sobre o estado de calamidade, Catarina Martins prefere esperar “para ouvir o que o Governo tem a dizer”. No entanto, a líder do BE acredita que “a situação decorrerá com normalidade em Portugal” e está convencida que o Governo “tem as ferramentas constitucionais necessárias” para aplicar as medidas que precisar.

A mesma opinião tem o PCP. Os comunistas, que votaram contra o actual estado de emergência, acreditam que “existem poderes efectivos e leis suficientes” no estado de calamidade para combater a propagação do vírus. “Faltam é medidas”, considerou Jerónimo de Sousa, à saída do encontro. 

Os comunistas pediram ao Governo que sejam dadas garantias de segurança e de protecção aos trabalhadores e utentes, quer seja de creches, quer seja de fábricas. “Fizemos um apelo claro ao Governo para não esquecer os pequenos e médios empresários que não sabem o que hão-de fazer à vida”, declarou Jerónimo de Sousa.

No final da ronda de encontros, já depois das 22h30, o socialista José Luís Carneiro pediu “responsabilidade individual acrescida” para as exigências trazidas “pela transição gradual” e elogiou o diálogo e cooperação entre os partidos. O deputado adiantou ainda que estão a ser desenvolvidos mais apoios, nomeadamente para as autarquias.

De São Bento, o primeiro-ministro já não seguiu para o Palácio de Belém, onde o jantar com o Presidente da República foi cancelado, devido ao avançado da hora. Mas Costa reuniu-se por videoconferência com Marcelo Rebelo de Sousa. com P.C., P.F.E e S.J.A

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