Os velhos e a recuperação económica

Para a recuperação do nosso bem-estar vão ser necessários trabalho, sacrifícios e determinação de todos: novos e velhos. Ninguém, em condições de boa saúde física e mental, deve ser dispensado ou marginalizado.

Envelhecer é um processo natural e, tal como os outros estádios da vida, tem os seus próprios valores, a sua própria sabedoria e as suas próprias alegrias e tristezas. Todo aquele que envelhece sabe que, apesar dos cabelos brancos ou da diminuição das suas forças, possui uma riqueza de conhecimento adquirido e de experiências vividas, é ainda capaz de aumentar a rede das suas relações e interdependências e que, desde que a memória esteja desperta, nada do que já passou se perde.

Pois bem, na sociedade actual, em que a esperança de vida é a maior que o homem já teve ao longo da história da humanidade, ser velho é um estigma.

E tornou-se recentemente usual compartimentar a sociedade em dois grupos: os novos e os velhos.

Com o eclodir desta pandemia provocada pelo novo coronavírus, a situação tem vindo a tornar-se cada vez mais difícil para os mais velhos. Considerados pelas autoridades de saúde de forma indiscriminada como grupo de risco, ficaram obrigados a um confinamento exigente, vivendo a maior parte deles sozinhos ou, se forem mais bafejados pela sorte, em casal, mas apartados dos filhos e dos netos.

Claro que os restantes, os mais novos, também estão forçados a cumprir uma quarentena para evitar contágio, mas uma quarentena familiar.

Partiu-se a sociedade em dois grupos. Embora a taxa de letalidade seja mais elevada entre os mais velhos, como é natural, não é justo considerar que a velhice é uma doença ou um mal. Claro que os mais velhos podem ser as maiores vítimas desta pandemia, mas não representam uma ameaça apenas por terem mais idade, sobretudo se forem saudáveis. E, felizmente, devido aos progressos da medicina nos últimos decénios e à melhoria dos regimes alimentares e dos hábitos de vida, muitos homens e muitas mulheres mantêm saúde até idades muito avançadas.

Em consequência, o que a sociedade deve pugnar, respeitando sempre o que for determinado pelas entidades de saúde, é a proteção de uns aos outros, sem essa maniqueísta ideia sobre a perigosidade dos mais velhos, defendida por alguns.

 A idade não pode nem deve ser nunca um critério numa sociedade que se preze para escolher, em caso limite, entre quem é mais velho ou é mais novo. A idade cronológica nunca deverá ser aceite como critério, mas sim a idade biológica. E essa, tanto poderá ser apanágio de quem ainda não chegou aos sessenta anos, como o poderá ser de quem é mais velho.

A riqueza de experiências e conhecimento, a serenidade e o autodomínio que a vida nos vai proporcionando, à medida que a mesma se desenrola, são um valor adquirido que deverá ser passado às gerações mais novas, pelo que deverá ser devidamente valorizado. Sobretudo, poderemos concluir que, mais novos ou mais velhos, todos fazemos parte de um todo que ficará sempre mais enriquecido se, por uma vez, deixar de se encarar o envelhecimento como uma menos-valia ou uma sobrecarga.

Esperemos que assim seja e confiemos nos profissionais da saúde, na sua competência, sabedoria e generosidade para combater a pandemia que, presentemente, tanto nos preocupa.

Esta preocupação, felizmente, tem sido expressa em artigos, comentários e entrevistas de personalidades tão diversas, como o cardeal Tolentino de Mendonça, o escritor Henrique Raposo, o jornalista Miguel Sousa Tavares, os ex-governantes Luís Filipe Pereira ou Maria Manuel Pinto Barbosa ou ainda Daniel Oliveira ou Manuel Alegre, entre muitos outros.

E a preocupação quanto aos aspectos relativos à saúde também se estende à economia.

Com o estado de emergência e a quarentena exigida, a vida económica do nosso país, tal como tantos outros países deste mundo global em que hoje vivemos, está paralisada, congelada. E evidentemente que terá os seus efeitos sobre a actividade económica, sobre a criação de riqueza, sobre o crescimento e desenvolvimento de Portugal.

São esperados impactos relevantes derivados da quebra da economia mundial, nomeadamente das maiores potências, bem como do lado da oferta, resultante de falhas nas cadeias de produção, do absentismo e, do lado da procura, resultante da maior incerteza e do adiamento de decisões de investimento, com repercussão na liquidez das empresas.

A resposta a todos estes problemas terá de ser dada não só pelos governos de cada país, mas de forma concertada no caso da União Europeia a que pertencemos, com as naturais dificuldades de serem 27 países, com níveis de vida e desenvolvimento diversos. Efectivamente, já foram aprovadas as primeiras medidas, da parte do Banco Central Europeu, do Banco Europeu de Investimento e do Mecanismo Europeu de Estabilidade. Outras decerto se seguirão, à medida da evolução da pandemia e dos efeitos perniciosos sobre a saúde e a economia. A Europa não pode falhar, tem de actuar com rapidez e com processos simplificados, de forma a combater este difícil e longo período. É fundamental saber a resposta da Europa a questões como: para quando a disponibilidade do fundo de recuperação da economia, vai a sua ajuda ser em forma de subsídios ou empréstimos ou um misto e, nesse caso, esses empréstimos serão acordados em que condições e com qual taxa de juro ou ainda vai o BCE aumentar as suas compras e até que montantes.

Portugal tem fragilidades particulares, com um nível de endividamento elevado e uma recuperação pós-troika assente nos sectores do turismo, imobiliário e exportador, talvez os sectores mais afectados pela presente crise.

Há, pois, que, contando com a indispensável e solidária resposta da Europa, repensar bem os caminhos a seguir por Portugal e que não devem afastar-se muito de privilegiar uma reindustrialização (como outros países europeus já anunciaram), atrair capital e investimento produtivo e iniciar reformas há muito identificadas e que deverão agora ser realizadas, até porque a consolidação orçamental volta a ser indispensável.

Como a chanceler Angela Merkel já afirmou, o bem-estar de qualquer dos países da União Europeia depende do bem-estar dos outros países europeus.

E, igualmente, acrescentaria que para a recuperação desse bem-estar vão ser necessários trabalho, sacrifícios e determinação de todos: novos e velhos. Ninguém, em condições de boa saúde física e mental, deve ser dispensado ou marginalizado.

A História mostra-nos que as epidemias têm um carácter cíclico e que devemos encarar este estranho presente que hoje vivemos com a possível normalidade e esperança.

E todos, novos e velhos, numa comunhão de esforços, experiências e coragem. Só assim venceremos os desafios que vamos ter de enfrentar.

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