Número real de casos de covid-19 no Brasil pode ser 15 vezes superior

A falta de testes à população torna o Brasil num dos países com a taxa de sub notificação mais elevada do mundo.

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O Brasil tem mais de 25 mil casos de covid-19 confirmados, mas o número real é bem superior EPA/Fernando Bizerra

O Brasil pode ter entre 12 a 15 vezes mais casos de infecção pelo novo coronavírus do que o actualmente contabilizado, segundo dois estudos publicados nos últimos dias. A falta de testes à população é a principal causa da subnotificação no país.

A informação fiável sobre o número de pessoas infectadas pelo novo coronavírus é considerada vital para determinar que medidas devem ser adoptadas para evitar o contágio em grande escala. Dada a elevada quantidade de pessoas sem sintomas, o Sars-CoV-2 é particularmente difícil de detectar na população. No Brasil, a subnotificação parece ser particularmente ampla. Apenas quem apresente sintomas graves e esteja internado é que é actualmente testado.

Um estudo realizado por um grupo de investigadores de várias universidades e institutos brasileiros indica que apenas 8% dos casos de infecção estão a ser notificados pelo Ministério da Saúde, o que significa que o número real poderá ser superior a 235 mil. A análise realizada pelo Núcleo de Operações e Inteligência em Saúde tem como referência o número de casos oficialmente divulgados na sexta-feira, 19.638. Esta quarta-feira já eram mais de 25 mil.

Os autores compararam as taxas de letalidade do vírus do Brasil com a de outros países e concluíram que se o valor é muito superior entre os brasileiros é porque existe uma elevada subnotificação.

Outro estudo elaborado pela Covid-19 Brasil, um grupo de pesquisa que também junta cientistas e alunos de várias universidades, determinou que até sábado, o Brasil terá tido 313 mil casos de infecção, um valor 15 vezes superior ao divulgado oficialmente.

Os investigadores basearam-se na evolução da curva epidemiológica da Coreia do Sul, o país onde a população foi mais testada e, por isso, oferece os dados mais fiáveis. O número de mortes entre os sul-coreanos foi adaptado através de um modelo matemático à pirâmide etária brasileira para que fosse alcançada a estimativa.

Rodrigo Gaete, especialista em enfermagem em saúde pública e professor na Universidade de São Paulo, disse ao UOL que considera as contas feitas pelo estudo “conservadoras”, visto que também existe uma subnotificação dos óbitos no Brasil.

Às escuras

Uma análise feita a nível mundial por um grupo de investigadores da Universidade de Göttingen, na Alemanha, também aponta para uma baixíssima taxa de notificação no Brasil. Em todo o mundo, apenas 6% das infecções foram oficialmente confirmadas, mas no Brasil essa taxa é inferior a 1%, conclui o estudo.

O Brasil teria a 31 de Março – a data de referência da pesquisa – 602 mil casos e não 5700 como foi divulgado.

Há várias razões que podem ajudar a falta de controlo na confirmação dos casos brasileiros, mas a ausência de cobertura de vastas áreas pelas unidades de saúde é a principal. Os investigadores dão o exemplo de estados como Amazonas ou Pernambuco, que há alguns dias tinham poucos casos confirmados e entretanto passaram a estar muito perto do colapso dos seus sistemas de saúde.

“Perdemos a chegada da epidemia a esses lugares que se decidiu fazer as notificações a partir das pessoas que precisavam dos serviços de saúde. Enquanto isso, os casos leves ou assintomáticos viajavam pelo país”, diz ao UOL o professor da USP, Domingos Alves.

No início do mês, o Ministério da Saúde admitiu que não sabe quantos testes foram realizados no país, mas que foram distribuídos mais de 500 mil kits, na sua maioria testes rápidos com limitações nos resultados. Por comparação, a Coreia do Sul, com menos de um quarto da população do Brasil, realizou meio milhão de testes.

Numa altura em que há um forte debate entre defensores e críticos das políticas de isolamento social no Brasil, a enorme subnotificação prejudica a elaboração de medidas para conter o contágio. “Os resultados mostram que os governantes e legisladores devem ser muito cautelosos quando interpretam os números de casos para fins de planeamento”, disse à Deutsche Welle responsável pelo estudo da Universidade de Göttingen, Sebastian Vollmer

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