Um craque “dado” pelo Sporting a ganhar espaço na Juventus

O PÚBLICO falou com antigos colegas de Demiral, jovem central que os “leões” libertaram por 3,5 milhões de euros, mas que, em 12 meses, já movimentou 27 milhões. E o turco tem sido titular ultimamente no campeão italiano.

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Demiral frente ao Bayer Leverkusen, num jogo da Liga dos Campeões, a 11 de Dezembro REUTERS/Thilo Schmuelgen

Merih Demiral é um dos centrais com os quais a Juventus tem atacado a Liga italiana e a Liga dos Campeões. Este estatuto foi conquistado a pulso, pelo próprio, depois de ter sido “dado” pelo Sporting. “Dado”, é claro, em sentido hiperbolizado, já que os “leões” embolsaram um pouco mais de 3,5 milhões de euros, um valor ainda assim curto para o que o central turco tem mostrado no relvado. Já fora do campo é um jovem calmo, tímido, religioso e grande fã de apostas e de moda. Já lá vamos.

Muitos dirão que é fácil “jogar no Totobola à segunda-feira” e que, agora, é simples dizer que os 3,5 milhões estabelecidos por Sousa Cintra na opção de compra do contrato com o Alanyaspor foram curtos. Mais: dirão que a necessidade imediata de tesouraria justificou a opção. Outros, porém, argumentarão que a qualidade de Demiral era demasiado evidente. Na verdade, o próprio Sporting transmitiu esta segunda versão — mas sem recorrer a palavras.

“Era um jogador com grande potencial e que a estrutura via como aposta. E sim, talvez a nível interno houvesse um pouco mais de atenção ao Merih do que aos restantes jovens”. As palavras são de Miguel Lopes, ex-colega de Demiral nos juniores do Sporting, que, ao PÚBLICO, recorda “que já se via qualquer coisa de diferente no Merih”. “Era um animal, no bom sentido da palavra”.

Outro facto que atesta a forte aposta inicial no jogador é apresentado por Bruno Santos, que jogou com Demiral no Alcanenense, clube com o qual o Sporting terá feito um acordo para colocar a rodar o central, recém-chegado da Turquia, em 2016.

Apesar de ter idade de júnior, Demiral competiu numa equipa sénior do Campeonato de Portugal e os responsáveis pela contratação não fizeram a coisa por menos. “Com o Demiral veio um preparador físico, que lhe dava treinos de manhã, quando a equipa treinava sempre à noite. Logo aí se notava que os olhos estavam, e bem, em voos maiores”.

"Destacava-se muito"

Demiral chegou ao Sporting em 2016, proveniente do Fenerbahçe. Quando se juntou aos “leões” já tinha realizado alguns encontros pela selecção turca sub-19 — jogou contra Portugal — e, ainda ligado ao clube “leonino”, chegou aos sub-21, primeiro, e à selecção principal da Turquia.

Apesar de ser apontado como um dos grandes talentos do futebol turco, o Sporting libertou-o em 2017, por empréstimo, para o Alanyaspor, num negócio que contemplava uma opção de compra de 3,5 milhões de euros. O resto da história já se sabe. O clube turco optou por ficar com o talentoso central e, cinco meses depois, vendeu-o por nove milhões ao Sassuolo. O clube italiano contou com Demiral nas fileiras durante outros cinco meses, antes de acordar uma transferência para a Juventus, por 18 milhões. Em cerca de um ano, Demiral passou de “emprestável” pelo Sporting a real opção para a Juventus.

Se mostrava este potencial, por que motivo o Sporting não apostou em Demiral? A pergunta não é de resposta fácil — o retorno financeiro imediato será a explicação mais lógica —, mas quem jogou com o central garante que o turco tinha qualidades tremendas. Luís Oliveira, outro ex-colega de Demiral no Alcanenense, atesta a qualidade diferenciada, mesmo sendo bem mais novo do que colegas e adversários.

“No balneário, sempre dissemos que ele era um jogador acima da média. Tinha muita qualidade para um júnior. Era muito agressivo, tinha muito boa técnica e era bastante inteligente. Um central completo”, destaca, numa visão corroborada por Bruno Santos. “O Merih destacava-se muito. Entrou logo no ‘onze’, apesar de ser ainda júnior. Já dava para ver que estava ali muita qualidade. Tinha tudo o que era preciso num central: era muito rápido, forte, com um timing de corte impressionante e no jogo aéreo raramente perdia um lance. Era um daqueles centrais que dava confiança ao resto da equipa, mesmo com a bola no pé. Como pessoa, era o inverso: não dava nas vistas, uma pessoa super-humilde e com uma capacidade de trabalho e um empenho incríveis. Fazia o trabalho e não se achava melhor do que ninguém”.

“Era muito ambicioso”

Forte, talentoso, humilde e… imune à dor. “Num treino, levou uma ‘porrada’ na perna e ficou a sangrar muito. A malta ficou preocupada e ele foi aconselhado a sair do treino, mas recusou-se. Ele dizia: ‘Eu não dor, eu não dor’, para ilustrar que a dor, para ele, não era nada e que já tinha passado por coisas muito piores”, recorda o ex-colega de equipa.

O Sporting acabou por levar o jogador para Alcochete, com a ideia de o integrar, aos poucos, na equipa B. Jorge Jesus chegou mesmo a estrear Demiral na Taça de Portugal, frente ao Oleiros, mas José Peseiro não queria o turco para mais do que quarto central da equipa principal. E Demiral quis partir, para poder jogar.

“Ele sempre foi um jogador muito ambicioso e via-se que queria evoluir e chegar lá acima o mais rapidamente possível”, recorda Luís Oliveira, acrescentando: “Era um miúdo muito calado, porque não sabia falar português, mas andava sempre com um sorriso no rosto e a querer aprender mais”. Aprender mais e… comprar mais: “Ele era doido por roupa. Andava sempre a vestir-se bem e a querer comprar mais e mais”.

Luís Oliveira recorda que, nos tempos de Alcanenense, Demiral também “era doido por apostas”. “Andava sempre a perguntar por equipas portuguesas que poderiam ganhar”. Agora, aos 21 anos, está a conquistar espaço — fez todos os 90 minutos nos últimos quatro jogos — num colosso europeu para o qual o verbo ganhar é de uso corrente.

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