A bem do futebol português

O recente trabalho apresentado sobre a realidade do futebol em Portugal efectuado pela McKinsey para a Federação Portuguesa de Futebol (FPF) e Liga Portugal revela, além duma visão centrada na questão dos direitos televisivos, alguns aspectos que importa cruzar com o relatório do CIES Football Observatory, para percebermos bem onde nos devemos situar.

Ambos têm o mérito de levantar questões pertinentes.

No trabalho da Mckinsey, identificada a necessidade de aposta na formação, sugere-se o aumento do limite total de empréstimos de jogadores dentro da mesma competição para dez, sendo que se defende também a “obrigatoriedade de ter, em cada plantel, oito jogadores formados localmente”, sendo que destes, quatro teriam de vir das camadas jovens de cada clube.

Defende-se “o desenvolvimento de 8-9 equipas capazes de competir na Europa o que implica um aumento de receita de cerca de 360 milhões de euros”, algo que seria possível através de um repensar do futebol nacional.

E é aqui chegados que convém ter a clareza de apontar caminhos que, até agora, quer FPF quer a Liga Portugal, não têm tido a frontalidade na forma de abordar o tema para encontrar novas soluções com os clubes. Ambas as entidades têm evitado alargar a discussão e o leque de opções para os clubes se financiarem, principalmente nas suas infra-estruturas para a formação, e remetem quase sempre como única solução a questão da centralização dos direitos televisivos.

No entanto, até à data, não foi apresentada uma única proposta concreta de verbas a negociar, somente cenários e comparações com a realidade de outras Ligas e de outros países, que deve ser devidamente contextualizada no trabalho desenvolvido pela CIES Football Observatory.

À boa maneira portuguesa, assobiamos para o lado quando a questão não nos convém.

E é no trabalho da CIES que devemos ver toda a fragilidade da nossa Liga e de grande parte dos nossos clubes, que se debatem com modelos de gestão, alguns deles anacrónicos e ultrapassados, vivendo muito das negociações de direitos de jogadores, alimentando um conjunto de intervenientes que teima em resistir às mudanças do novo paradigma de grande parte das Ligas europeias e dos seus principais clubes.

E surge a velha opção, retrógrada e intervencionista, de querer o poder político a legislar para resolver uma questão que diz unicamente respeito aos clubes, à Liga, e que deverá ter a FPF como fiel da balança para procurar encontrar pontes e equilíbrios.

Aliás, os apelos às intervenções do Estado no futebol, quase sempre têm sido desastrosas, como recentemente se viu em matéria da regulação sobre as claques e a sua relação com a violência no desporto, aprovada recentemente, ou o mítico perdão fiscal de Eduardo Catroga, que colocaram na maioria dos clubes o sentimento de impunidade fiscal e os conduziram depois para derivas despesistas que representam hoje passivos brutais que trazem limitações crónicas na sua capacidade de se financiarem para melhorarem as infra-estruturas desportivas e melhorarem as suas condições para apostar na formação.

Existe contudo um caminho que pode facilmente colocar as equipas portuguesas na senda do sucesso, estruturado e consistente, resistindo aos impulsos imediatistas, mas enquadrando as novas realidades com que hoje a indústria do futebol se confronta

A indústria do futebol vive hoje uma realidade completamente distinta, assente numa relação entre a emoção que o fenómeno desportivo comporta, as ferramentas tecnológicas que vieram dotar a indústria do audiovisual de novas abordagens digitais, e as apostas desportivas, numa mistura que alimentando a paixão clubista, se manifesta de forma exponencial como em mais nenhum outro  desporto, à escala global.

O crescimento das apostas desportivas online veio obrigar os reguladores e  as entidades de supervisão a terem uma intervenção e um papel muito mais ativo.

Em Portugal assistimos a um fenómeno muito particular, mas que, esse sim, deve merecer uma reflexão profunda.

Quer a Liga Portugal, quer a FPF têm evitado abordar essa nova componente de receitas para os clubes.

E ignorar esta realidade e focar a discussão unicamente na centralização dos direitos televisivos, será talvez a melhor forma da Liga Portugal e os clubes portugueses verem aumentar o fosso que os separa dos outros clubes das outras ligas europeias.

Assente nessa realidade, estão a ser dados passos importantíssimos para acompanhar essa evolução em toda a Europa, mas praticamente muito poucos clubes em Portugal têm capacidade para se adaptarem, e infelizmente a Liga Portugal parece viver numa “bolha” onde a realidade passa ao lado dos seus principais dirigentes.

É tempo de arrepiar caminho, deixar de alimentar um discurso institucional como se nada se passasse e encarar de frente esta oportunidade única de criar condições objectivas.

A elaboração do programa “5 G - Football Revolution”, que será apresentado oportunamente, irá dar soluções para que os clubes se posicionem, tendo em conta inúmeras alterações da relação da indústria do futebol, quer com os media quer com a economia digital como possível solução para a construção de novas academias. A redistribuição de parte das verbas das apostas desportivas online, suportará este programa, que poderá inverter de forma gradual o fosso que separa os clubes portugueses dos clubes das principais Ligas europeias, permitindo aos emblemas de menor dimensão a construção de novas academias de formação, com padrões de funcionalidade e eficiência, equiparados aos clubes das Ligas europeias, que têm vindo a fazer investimentos muito significativos nessas infra-estruturas.

Gestor e autor do programa “5 G - Football Revolution"

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