A vida íntima de Mrs. Fletcher

Na nova comédia dramática criada por Tom Perrotta para a HBO, Kathryn Hahn é uma mãe solteira cujo filho vai para a faculdade. Sem saber o que fazer, descobre o mundo da pornografia online.

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Em Mrs. Fletcher, Kathryn Hahn vê-se sozinha pela primeira vez em muito tempo e não sabe o que fazer HBO

Mais de dois anos após o final de The Leftovers, os dois criadores da série voltaram à HBO mais ou menos ao mesmo tempo, cada um com o seu novo projecto. Damon Lindelof acaba de estrear Watchmen, a adaptação da banda desenhada de Alan Moore e Dave Gibbons que chegou ao streaming na semana passada, enquanto Tom Perrotta estreou, esta segunda-feira, Mrs. Fletcher, baseado no seu próprio romance.

A nova minissérie lançada pela HBO é um olhar meio cómico, meio dramático sobre uma mãe solteira. Aos 46 anos, Eve Fletcher (Kathryn Hahn), divorciada e a trabalhar num lar, vê-se sozinha em casa pela primeira vez em muito tempo quando o filho se muda para ir para a faculdade. Desorientada, não está habituada a não ter alguém de quem cuidar, e parte numa viagem guiada pelo seu desejo, espoletada pela descoberta de pornografia online.

Simultaneamente, Eve percebe que o filho, um rapaz muito popular no liceu prestes a encontrar uma nova realidade em que já não é automaticamente o centro das atenções, não é bem a pessoa que ela pensava conhecer, tendo interiorizado muita masculinidade tóxica mainstream que não veio certamente da educação dela e terá mais que ver com o pouco fiável ex-marido, que a deixou por uma mulher mais nova para começar uma nova família. É esta a história que vai sendo contada ao longo dos sete episódios de menos de meia hora.

Em 2017, quando lançou o romance que deu origem à série, Perrotta (conhecido por livros que deram origem a filmes como Eleições ou Pecados Íntimos, que o próprio adaptou e que lhe deu uma nomeação para um Óscar) queria voltar a contar uma história que fosse sua, depois dos anos passados a trabalhar para Lindelof em The Leftovers, sem estatuto para tomar as decisões finais. Agora tem essa legitimidade: o escritor é o único criador de Mrs. Fletcher.

Não quer dizer que tenha posto de parte a colaboração. Sobretudo com Hahn, a soberba actriz que conta no currículo com algumas histórias deste género, um tipo de narrativas que Hollywood até há bem pouco tempo preferia não contar, sobre mulheres algo reprimidas a explorarem a sua sexualidade depois dos 40: apareceu em séries como Transparent e I Love Dick, ambas de Jill Soloway, que também a realizou em Afternoon Delight, de 2013, e em Private Life, de Tamara Jenkins. Mas também com a realizadora Nicole Holofcener, nome grande do cinema independente nova-iorquino dos anos 1990 que tem feito cada vez mais televisão. Surpreendentemente, Holofcener, que está atrás das câmaras no primeiro episódio da série, escrito por Perrotta, nunca tinha trabalhado com a actriz.

Todos os episódios da série foram aliás realizadod por mulheres: Liesl Tommy, que tem trabalhado mais em teatro; Carrie Brownstein, mais conhecida como guitarrista-vocalista das Sleater-Kinney (e não é a única ligação ao rock dos anos 1990: o primeiro episódio fecha ao som de Liz Phair); e Gillian Robespierre, a responsável pelo filme Obvious Child, de 2014. Também na equipa de argumentistas, e a pedido do escritor, há mais mulheres do que homens, para esta não ser apenas mais uma história contada por homens que acham que sabem o que é que as mulheres pensam.

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