Sp. Covilhã de Ricardo Soares segue passos do último campeão

Equipa serrana regista melhor arranque do século, com direito a liderança da II Liga à sexta jornada, mas com margem mínima para desafiar a interioridade e o realismo de um grupo focado na permanência.

Foto
LUSA/OCTAVIO PASSOS

Com os mesmos 15 pontos que o último campeão da II Liga somava à sexta jornada da época 2018-19, números que superam todos os registos “profissionais” do Sp. Covilhã neste século - em 12 anos ininterruptos no escalão secundário só por duas vezes se aproximou desta marca -, os “leões” da serra, mesmo a correrem por fora a maratona da subida, insinuam-se sem vertigens no ataque à mais disputada Liga profissional. Sem quaisquer garantias de sucesso, o impulso inicial, com o cunho de Ricardo Soares - 20.º técnico do consulado do líder José Mendes (com dez partidas disputadas e a melhor percentagem de vitórias de todos os 30 predecessores) -, parece, ainda assim, suficiente para reacender a esperança de, em breve, recuperar a aura do histórico emblema serrano, há 32 anos arredado dos grandes palcos.

“A harmonia é grande neste grupo. A nossa maior arma é a capacidade de trabalho e de superação. Há uma base forte do ano anterior e sete reforços escolhidos para um projecto de permanência, até porque perdemos cinco titulares”, destaca o técnico ao PÚBLICO, consciente de todas as barreiras que o separam da meta.

“O investimento dos principais candidatos, em contraste com o nosso orçamento, um dos mais baixos da prova, não pode ser ignorado. Mas também não diminui nem nos retira ambição”, avisa Ricardo Soares, identificado com a realidade dos clubes do interior. “Aqui sente-se a interioridade desde a primeira hora. O preço a pagar é elevado e percebi-o assim que assinei e passei a participar na construção do plantel. O rigor financeiro defendido pelo presidente impõe restrições. O scouting é muito específico e direccionado para o Campeonato de Portugal, onde é possível descobrir jogadores com potencial dentro do orçamento. E, também neste capítulo, o presidente desempenha um papel fundamental na prospecção de talentos, pois conhece como poucos esta realidade, investindo muito tempo a assistir a jogos. Só assim foi possível limpar a dívida e preparar o próximo capítulo”, louva o treinador, que aproveita para distinguir a interioridade do Sp. Covilhã e a do Desp. Chaves, que conheceu em contexto de I Liga.

“A capacidade e estabilidade financeira, o crescimento sustentado, a academia e clube satélite formam uma base de sucesso. Em Chaves já tudo isso estava consolidado. O Sp. Covilhã ainda tem um caminho a percorrer. Como tal, não vamos iludir-nos. Este pode ser o melhor início de campeonato, podemos até conseguir uma equipa competitiva e ambiciosa, mas é preciso manter a exigência sempre no máximo!”, enfatiza. 

No discurso do técnico, a palavra exigência surge com regularidade e também nesse capítulo há sintonia com a direcção: “Não será por falta de ambição que o nosso campeonato não terá um final feliz. Não podemos é ignorar que há um lote de equipas programadas para a subida... Mas que terão no Sp. Covilhã um adversário sempre disposto a vencer cada jogo”, adverte, focando-se no momento, que é de profundo pragmatismo, apesar do brilho e notoriedade dos serranos. 

A bandeira da gestão assumida pelo presidente ajudou a sanear as dívidas, pelo que o próximo passo - sempre dentro das limitações de um orçamento reduzido - será o de consolidar o projecto desportivo, assente no reforço de infra-estruturas como uma academia. Processo que a promoção ao escalão maior ajudaria a abreviar, o que até esteve na iminência de acontecer em 2014-15, quando União da Madeira, Desp. Chaves e Sp. Covilhã concluíram o campeonato empatados, com 80 pontos, a um do campeão Tondela, tendo as regras de desempate coroado os madeirenses. 

Agora, na pele de líder à sexta ronda - feito inédito na história recente do clube -, o Sp. Covilhã (circunstancialmente ultrapassado pelo Nacional da Madeira, que já disputou sete partidas) revela-se imbatível na condição de forasteiro, facto que Ricardo Soares relativiza. “Jogamos da mesma forma em casa e fora”, garante, apesar de ter cedido no “velho” Santos Pinto, nos descontos e com a equipa reduzida a 10, a primeira derrota da época ante o “candidato” Leixões.

Curiosamente, também há um ano o Paços de Ferreira - com estatuto de principal candidato - sofreu o primeiro desaire em casa à segunda jornada. Lição importante para o resto do percurso e que agora pode ser aproveitada pelos serranos, afectados pela eliminação precoce na Taça de Portugal, em Lourosa, após prolongamento. Ricardo Soares não disfarça a frustração, ainda que possa sempre agarrar-se ao facto de o Sp. Covilhã ser a única equipa a ter derrotado o Famalicão (líder isolado da I Liga), em provas oficiais, eliminando os minhotos na Fase 2 da Taça da Liga (0-2). 

“Fomos os únicos a vencer o Famalicão e os únicos a não consentir qualquer golo.” Aliás, na Fase de Grupos da prova, em que discutirá a passagem às meias-finais com Benfica, V. Guimarães e V. Setúbal, a formação serrana segue empatada com o trio da primeira divisão graças a um empate no Estádio Municipal José dos Santos Pinto. “Além de FC Porto, Sp. Braga e Benfica, fomos a única equipa a marcar um golo ao V. Setúbal”, reforça o treinador, em condições de recuperar o protagonismo da época em que levou o Desp. Chaves às portas do Jamor - acabou eliminado nas meias-finais pelo V. Guimarães, com 3-3 nas duas mãos e um penálti falhado aos 90 minutos.

“Galões” que de pouco valerão se a equipa se deslumbrar, mesmo que Ricardo Soares reforce o carácter do grupo e a resistência à exposição mediática… pelo menos até Dezembro, quando a fama atingir novo pico com a subida do Benfica à serra da Estrela, para a Taça da Liga.

“Para crescermos precisamos de enfrentar adversários fortes. A Taça, para além do prestígio, propicia jogos fundamentais para evoluirmos. A Taça da Liga também nos coloca à prova. Por isso prefiro ter um calendário preenchido. Só assim podemos superar-nos e sonhar mais alto.”

Sugerir correcção
Comentar