O reencontro

Quando os olhares se encontraram, não pude conter o meu próprio sorriso. O senhor abriu os braços, deixou o jornal cair no chão e esperou que ela viesse para o seu velho regaço.

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Sentado no comboio a esperar a estação de destino, deparo-me com uma das cenas mais inspiradoras que alguém poderia ter numa manhã de quarta-feira: um reencontro de amor. Não posso com certeza afirmar quanto tempo durou a distância entre os dois reencontrados: um ano, dois meses, ou apenas alguns dias. O que posso dizer é que aquele reencontro rendeu-me uma alegria duradoura, ainda que como mero observador.

Foi um gesto singelo, mas totalmente sem gelo. Logo que o comboio parou, avistei um senhor na plataforma com o olhar de quem espera o trem ou alguém que nele vem. Com a mão no bolso, roupa arrumada e um belo sorriso no rosto, lá estava ele numa manhã chuvosa de semana a esperar. Quando as portas do vagão se abriram, na mesma proporção o sorriso do senhor se alargou. Descia dali, do meu vagão, o seu amor esperado. Com uma pequena mala nas mãos e certamente com uma história grandiosa, pôs os pés na plataforma, uma senhora de cabelos brancos, perfeitamente arrumados e um olhar que brilhava mais do que o sol de todos os dias da minha vida.

Quando os olhares se encontraram, não pude conter o meu próprio sorriso. O senhor abriu os braços, deixou o jornal cair no chão e esperou que ela viesse para o seu velho regaço. A mala ficou para trás e o importante naquele momento, já não era o comboio, a estação, as pessoas, o mundo ou o tempo. O amor pulsava como se estivesse personificado ali à minha frente. Quando o já ansiado e ansioso abraço se deu, os olhos fecharam-se, um silêncio ensurdecedor tomou conta da estação e foi possível ver uma luz inebriante que emergia dos amados abraçados, do reencontro esperançado. Os olhos fecharam-se, nada existia senão os dois. Estava ali, diante de mim, e de quem mais quisesse ver, o abraço mais amoroso do mundo.

O senhor abriu devagar os olhos e deles, agora, escorria uma lágrima tímida, mostrando o alívio da dor da espera, como se tivesse sido a primeira distância e a última saudade. A senhora, de costas para mim, impediu-me de ver a reacção do seu rosto, mas já não era necessário mais nada para construir aquele momento. A partir dali, a mala seria carregada pela mão direita do senhor, pois a esquerda estaria em busca do seu par, da sua aliança. De mãos dadas e braços entrelaçados, o casal desceu as escadas com uma felicidade contagiante e contaram-me uma história de amor, sem palavras ou sons.

O reencontro de duas almas que se amam, independentemente do tempo e da distância enfrentados, sempre revigora o ser humano. É possível, sim, um “viveram felizes”, mesmo que sem um “para sempre”. Provavelmente nunca mais verei aquele casal, embora já os tenha comigo, quer na minha memória, quer agora nesta história. História essa que lhes dedico, bem como a todo amor que sente saudade, não importando a idade. A todo o amor de reencontro, aquele que só é possível após um longo e profundo encontro. A todo o amor de verdade, que supera idade, distância, tempo, dor e saudade. Viva todo o amor genuíno, o mesmo que fez daquela senhora uma terna menina e daquele senhor um eterno menino!

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