O natural e o artificial na instalação multimédia de Diana Policarpo

Um “olhar etnográfico sobre fungos e capitalismo” abre portas para uma exploração artística em que som e imagem se unem para contar uma história complexa cujo impacto não é apenas local, mas global. O novo trabalho de Diana Policarpo está presente no MAAT, no âmbito da exposição do Prémio Novos Artistas Fundação EDP.

Death Grip, uma expressão inglesa polissémica que se pode traduzir literalmente para “abraço da morte” em português, é o nome da instalação multimédia site-specific que Diana Policarpo criou. A compositora e artista visual tem utilizado a sua produção artística para questionar problemas relacionados com estruturas de poder ou problemas de género através do uso de variadas linguagens e materiais. Sempre presentes estão “composições sonoras, esculturas e narrativas ficcionais” e investigações que “analisam eventos históricos, processos de mudança e crise”.

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Death Grip, uma expressão inglesa polissémica que se pode traduzir literalmente para “abraço da morte” em português, é o nome da instalação multimédia site-specific que Diana Policarpo criou. A compositora e artista visual tem utilizado a sua produção artística para questionar problemas relacionados com estruturas de poder ou problemas de género através do uso de variadas linguagens e materiais. Sempre presentes estão “composições sonoras, esculturas e narrativas ficcionais” e investigações que “analisam eventos históricos, processos de mudança e crise”.

Este é um projecto que partiu de uma residência artística de Diana Policarpo na Índia, no Alice Boner Institute, em Varanasi. Esta experiência possibilitou uma viagem ao Nepal e o retomar de uma pesquisa que a artista iniciou, anos antes, sobre o fungo entomopatogénico Cordyceps sinensis. A sua pesquisa e o seu trabalho incidiram no fenómeno da colheita deste fungo, um parasita raro que cresce na larva da mariposa Thitarodes a 4000 metros de altura, nas regiões montanhosas do Nepal, Índia e no planalto do Tibete. O Cordyceps é utilizado nas medicinas tradicionais asiáticas com reconhecidas propriedades como reforço da imunidade, aumento da longevidade, vitalidade e virilidade — ao fungo está também ligada uma componente anticancerígena. Na China, principal importador, o seu valor atinge quantias exorbitantes e o comércio e a colecta do fungo tornou-se numa feroz corrida ao ouro (com todos os efeitos colaterais de alterações profundas na paisagem, desequilíbrio do ecossistema, violência, crime e inflação económica.

Juntando-se à atribuição de características mágicas a este “recurso natural e ancestral”, a Diana Policarpo interessa perceber a relação entre natural e artificial, entre o parasita e o seu hospedeiro, trabalhando o conceito do alienígena de modo a “desenvolver uma espécie de ficção científica mais subtil”, mas que facilmente cria uma ponte com uma outra temática que a artista quer explorar, a história do capitalismo e o conceito de parasitismo económico.

Além da sua crítica à sobre-exploração de um recurso considerado precioso, Diana Policarpo trabalhou com “um grupo de mulheres nómadas” que apesar de trabalharem na colheita deste fungo e serem parte vital do comércio e economia que se gerou em seu redor, “acabam por ter sempre um lado invisível, obscuro”, destaca a artista.

A artista tem trabalhado sobre questões relacionadas com a invisibilidade da mulher, nomeadamente durante uma residência artística em Nova Iorque em 2015, quando explorou nos arquivos da Performing Arts Library a “ópera futurista inacabada de Johanna Beyer, uma compositora alemã exilada em Nova Iorque, cujo trabalho esteve esquecido por mais de 80 anos” e a sua identidade remetida à invisibilidade.

Foto
Diana Policarpo dr

Em loop

Para Diana Policarpo, trabalhar com o MAAT possibilita acesso “a uma equipa e a um tipo de produção” essencial, devido à sua exploração artística audiovisual e ao seu trabalho com tecnologia. A artista salienta ainda o trabalho com a curadora Inês Grosso na concepção da instalação. Desde a partilha de material previamente recolhido – “materiais diversos, desde desenhos a gravações de campo, a partes de texto que eu queria incluir no guião de voz off” – à “própria estrutura conceptual da instalação” e da sua apresentação final.

A instalação multimédia de Diana Policarpo – constituída por 15 canais sincronizados com duas animações digitais 3D, em loop – integra uma “banda sonora ou a paisagem sonora da instalação” com imagens em movimento, criando um ambiente imersivo que remete o espectador para o lugar inóspito e hostil em que prospera o fungo Cordyceps. A recriação do ambiente das montanhas rochosas dos Himalaia, “transportado de forma artificial para o contexto do museu”, é feito através da manipulação da temperatura da sala e do desenho da iluminação, bem como através das esculturas de chão, equipadas com subwoofers. Dois ecrãs suspensos em estruturas de ferro mostram, a preto e branco, o ciclo de vida do fungo. A acompanhar está uma composição sonora e uma narração em voz off da própria artista, que conduz o espectador. Há ainda vários momentos de interrupção da “presença visual dos vídeos”, que apelam à “atenção da escuta” que a artista quer realçar.

Diana Policarpo constata que ter “desenvolvido esculturas e uma composição sonora através, não só de uma banda sonora electrónica mas também com gravações de campo, tem a ver já com algo que tinha vindo a desenvolver nos últimos anos, nomeadamente o processo mais exploratório da música”, mas também a gravação de áudio durante as viagens.

O seu trabalho de escultura, envolvendo a exploração de materiais áudio e de música teve início durante a sua licenciatura em Artes Plásticas na ESAD, nas Caldas da Rainha. Posteriormente, Diana Policarpo fez um mestrado em Artes Visuais no Goldsmiths College, em Londres, lugar que lhe providenciou “condições e apoio à produção, tanto a nível do espaço do estúdio, como também das oficinas e do próprio trabalho de pós-produção audiovisual”, diz.

O trabalho sonoro e instalações de Policarpo já foi mostrado em exposições individuais em galerias de Leipzig, Londres, Baden-Baden e em mostras colectivas em Lisboa, Porto, Melbourne, New Castle, Nova Iorque, Amesterdão, Oslo, entre outras cidades. Depois, de ter vivido a última década em Londres, a artista mudou-se recentemente para Lisboa.

A exposição do Prémio Novos Artistas Fundação EDP foi inaugurada durante a feira internacional de arte contemporânea ARCOlisboa, e fica patente até Outubro deste ano, na galeria da Central 1, do MAAT.

Os seis artistas finalistas — Diana Policarpo, Henrique Pavão, AnaMary Bilbao, Mónica de Miranda, Isabel Madureira Andrade e Dealmeida Esilva — foram seleccionados entre mais de 530 candidatos, pelos curadores Inês Grosso, Sara Antónia Matos e João Silvério. O vencedor será anunciado dia 2 de Julho.

Anteriormente, o Prémio Novos Artistas Fundação EDP distinguiu criadores como Joana Vasconcelos, Vasco Araújo, Leonor Antunes, Mariana Silva ou João Maria Gusmão e Pedro Paiva.


A série de apresentação dos finalistas do Prémio Novos Artistas tem o apoio