Mobile Film Festival: Curta sobre imigração vence Prémio do Público

Natália Nodari venceu o Prémio do Público do Mobile Film Festival com a curta “Passaporte”. O júri, presidido por Rita Blanco, anuncia os restantes vencedores no fim de Maio.

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Natália Nodari venceu o prémio do Público do Mobile Film Festival D.R.

O pano de fundo é Coimbra e os contornos iniciais desta história aproximam-se do género de thriller. O telemóvel de Natália Nodari caiu na sanita e perdeu a maioria das funcionalidades, pelo que a sua participação no primeiro Mobile Film Festival em Portugal esteve em risco.

A missão parecia impossível, mas, como se sabe, nestas histórias há sempre um golpe de sorte ou engenho que salva a protagonista. Pediu dinheiro emprestado aos amigos, comprou um telemóvel e filmou “Passaporte”, a curta-metragem de 60 segundos que lhe valeu, há dias, o Prémio do Público. “Se os meus amigos estiverem a ler, informo que pretendo pagar a dívida em breve”, garante, entre risos, a brasileira de 26 anos.

Durante cerca de um minuto, ela e um amigo são acompanhados de projecções e narração, num testemunho humano e expressivo sobre o “Passaporte”, essa chave para o mundo de amanhã. A narrativa conquistou a audiência virtual e, entre os 20 finalistas, a sua curta-metragem foi a mais vista no YouTube, estando ainda na corrida para os outros prémios, a serem divulgados brevemente. 

O lado de “dentro” dos que vêm de “fora”

Há três anos em Portugal, Natália costuma acompanhar grupos virtuais de imigrantes, onde as pessoas expõem dúvidas e manifestam a vontade de sair do Brasil. “Muitas não possuem os documentos necessários, várias estão dispostas a morar ilegalmente em países europeus”, conta a primeira premiada do Mobile Film Festival. “Acredito que nem sempre as pessoas são compreendidas”, reconhece Natália, que procurou contar um pouco das histórias que a têm marcado.

O limite de 60 segundos ajudou a edição, mas também obrigou Natália a encurtar aquilo que queria dizer. Colocou um projector virado para a parede do quarto e foi “gravando”, na sua pele e na do amigo, as imagens que queria destacar. “A maior dificuldade foi manter o telemóvel parado”, confessa. Ainda assim, contornou este problema de maneira bastante original: “Colei o telemóvel ao estendal e fiz longas tiras de fita-cola para ficar imóvel. Também usei fita-cola para fixar o projector a cinco pacotes de leite, que ficassem na altura adequada”, recorda.

O poder do telemóvel

O facto de o Mobile Film Festival desafiar os participantes a gravarem os filmes com o telemóvel ou o tablet é, para Natália, uma forma de tornar o cinema mais acessível. “Muitas pessoas têm um telemóvel que é capaz de executar essas funções”, sublinha, argumentando que “estas iniciativas dão visibilidade a pessoas que não têm aparelhos profissionais, mas isso não quer dizer que as suas ideias sejam piores”. A criatividade é o principal trunfo de quem concorre, sem a desvantagem de equipamentos ou grandes produções: “Pessoas criativas nascem em todo o tipo de situação financeira, acredito que a iniciativa é sensível a essa realidade”, indica Natália.

O telemóvel é, aliás, um elemento indispensável na vida da brasileira, sobretudo na hora de comunicar com a família. Já filmou os “parabéns” portugueses para a mãe, mostrou as andorinhas a sobrevoar o Rio Mondego à avó e partilhou com um amigo o que se come nas pastelarias em Portugal, nomeadamente os pastéis de nata. Descreveu como são por fora, por dentro e qual o sabor. “Filmo o que me desperta estranheza e, quando se é estrangeiro, coisas banais parecem um pouco estranhas”, admite.

Uma estreia com o pé direito

“Passaporte” é o primeiro filme de Natália que, embora amante confessa de cinema, só agora reuniu a coragem para realizar uma curta-metragem. “Fiz a curta com tudo o que tinha disponível naquele momento, física e mentalmente”, lembra, reconhecendo que “há coisas que precisam de ser aprimoradas na minha técnica, mas fiz o que fiz de maneira séria”. A vitória na categoria do Público não foi uma surpresa completa, uma vez que conta com mais de 60 mil seguidores no blogue osegundocu, mas não só. “É sinal de que as minhas ideias são as mesmas de muitas pessoas; é a certeza de que não estou sozinha com os meus pensamentos”, afirma a vencedora.

Em relação aos prémios por entregar, e aos quais concorre com mais 19 participantes, não sabe o que esperar. No entanto, destaca a qualidade da concorrência: “Fico muito feliz por concorrer com pessoas talentosas”, garante. Quanto ao próximo ano, se o festival se repetir deixa uma promessa: vai voltar a participar.

Outros prémios em jogo

O júri – composto por Rita Blanco, João Canijo, Bruno Manique, Luciana Peres e Sílvia Balea – vai entregar o Grande Prémio, no valor de cinco mil euros, que se destina a produzir uma curta-metragem. O júri seleccionou, ainda, os vencedores dos prémios: Melhor Realizador, Melhor Actor/Actriz e Melhor Argumento. Conheça os escolhidos aqui.