Justiça arquiva queixas da CNE por publicidade indevida

Autarca de Vila Franca de Xira alerta para o facto de a Comissão não ter meios de fiscalização e reagir apenas nos casos em que há participações.

Foto
Balanço diz respeito a eleições de 2017 Nuno Ferreira Santos

Dos 47 processos que a Comissão Nacional de Eleições (CNE) remeteu ao Ministério Público (MP) na sequência das autárquicas de 2017 seis já tiveram despacho final e todos no sentido do arquivamento das participações da entidade que regula e fiscaliza os actos eleitorais em Portugal. Em causa estão, segundo a CNE, principalmente situações de eventual violação das normas legais que proíbem publicidade institucional na fase pré-eleitoral, mas também casos de alegado incumprimento dos deveres de neutralidade e de imparcialidade das entidades públicas.

De acordo com a CNE, no âmbito das eleições autárquicas de Outubro do ano passado foram recebidas 1403 queixas nos serviços da Comissão, que resultaram na abertura de outros tantos processos. Em resposta ao PÚBLICO, a CNE explica que deste universo total, 591 diziam respeito a matérias relacionadas com a eventual violação das regras que limitam a publicidade institucional e dos deveres de neutralidade das entidades públicas. “Destes, 47 foram remetidos ao Ministério Público e, até ao momento, foram recepcionados seis despachos, todos determinando o arquivamento dos autos”, acrescenta a resposta da CNE enviada ao PÚBLICO.

Um dos aspectos mais controversos do acto eleitoral de Outubro de 2017 foi a aplicação, pela primeira vez em eleições autárquicas, Lei Nº. 72-A/2015, que regula a propaganda eleitoral através de meios de publicidade comercial depois da marcação da data da votação. Esta nova legislação refere que, “a partir da publicação do decreto que marque a data das eleições gerais, é proibida a publicidade institucional por parte dos órgãos do Estado e da Administração Pública de actos, programas, obras ou serviços, salvo em caso de grave e urgente necessidade pública”.

Na sequência de queixas apresentadas um pouco por todo o País, a CNE instaurou vários processos, sobretudo a presidentes de câmara, impondo a retirada de painéis e cartazes que considerou que não estavam abrangidos pelas excepções admitidas na Lei (situações urgentes ou divulgação de eventos específicos que decorrem ou se realizem com regularidade). Aos autarcas que não cumpriram atempadamente esta determinação foram levantados autos de contra-ordenação e remetidas participações ao Ministério Público, pela eventual prática de crimes de desobediência.

Um desses casos aconteceu no concelho de Vila Franca de Xira, onde a CNE garantiu ter notificado a Câmara para retirar mais de uma dezena de outdoors a 28 de Julho, mas a edilidade alega que só recebeu a notificação a 17 de Agosto de 2017. O certo é que o Ministério Público concluiu, já em Novembro, que “do conteúdo das imagens constantes nos painéis não se retira qualquer intenção eleitoralista, não tendo sido demonstrado qualquer perigo efectivo para a posição de igualdade das diferentes candidaturas políticas às eleições”.

O despacho de arquivamento, divulgado pela edilidade vila-franquense, considera, igualmente, que não ficou provado que a autarquia tenha sido devidamente notificada a 28 de Julho, data em que a CNE alega ter enviado uma primeira mensagem de correio electrónico com essa mesma notificação.

Alberto Mesquita, presidente da Câmara de Vila Franca de Xira, defende que a legislação de 2015 que consagrou este tipo de proibição de publicidade institucional deve ser alterada, porque a CNE não tem meios de fiscalização e reage apenas nos casos em que há participações. No entender do autarca socialista, esta situação prejudica uns (onde há queixas) e beneficia outros (onde não há) e deve ser revista, eventualmente dotando a CNE com meios de fiscalização próprios.

“A lei está errada e deve ser alterada, na medida em que a CNE, se quer fazer um trabalho adequado e respeitador do equilíbrio, deve ter outra estrutura e não estar baseada nas queixas. Nesta matéria ninguém foi, ou é, santo, uma vez que várias foram as forças políticas que recorreram àquilo que a lei permite. A lei é que está errada e tem que ser modificada”, sustenta o edil de Vila Franca de Xira, considerando que só com um controlo “sério” destas situações é que se aprofunda a democracia.

“Este modelo não contribui para o aprofundamento da democracia”, acrescenta Alberto Mesquita, afirmando que o que se passou em 2017 foi que a CNE reagiu e ordenou a remoção de materiais nos concelhos onde houve queixas, mas não actuou noutros concelhos onde cartazes e outdoors em tudo semelhantes não foram objecto de queixas.

Sugerir correcção
Comentar