Os “beatlezinhos” que o Zambujo liberta

Mal alguém adicionou na plataforma VIDEOCLIPE.PT (de onde são selecionados os vídeos para a curadoria desta galeria) e logo uma frase com quase cinco anos nos veio à memória, relativa ao primeiro videoclipe do mesmo músico que aqui se expõe: “É certo que a música de António Zambujo, se tirou bilhete no fado, muitas picadelas por outras sonoridades dá”.

Se também é certo que nessa frase o “bilhete” e as “picadelas” eram subtilezas decorrentes da letra e do vídeo de Pica do 7, a intenção era acertar na amplitude da sua viagem musical, a qual partiu da tradição alentejana e do fado, mas não se ficou por essas paragens, ainda que lhe garantissem a inspiração. No entanto, muito poucos imaginariam que iria também picar bilhete nos Beatles. Porém, é difícil não ver e ouvir isso neste postal ilustrado em vídeo, de nome Sem Palavras, que ele envia para anunciar a edição do seu próximo álbum — que, talvez não por acaso, se chamará Do Avesso. A produção é de Nuno Rafael, João Moreira e Filipe Melo, sendo este ainda responsável pelas orquestrações. Ou seja, é de esperar que se fique ainda mais Sem Palavras, aguardando-lhe postais de paragens acústicas e paisagens alentejanas.

Sendo o videoclipe atualmente o instrumento primordial para se anunciar um álbum, na verdade também outros dois temas estavam já em pré-escuta no iTunes. Mas single que é single é, na realidade, um videoclipe (algum dia se deixará de mencionar essa rodela do passado), porque é este que reina na era da comunicação nómada e digitalizada, e por ele se libertam outros sentidos para a música. E se esta tem letra floreada sobre singelos sonhos de amor, o vídeo mostra as projeções mentais de um Zambujo adulto e quarentão. Ou, por outras palavras, ele próprio refletindo e revendo os projetos futuros da idade em que tudo se permitia. Ainda que o conceito e estrutura não tenham a graciosidade do outro acima mencionado — performance musical inserida numa narrativa — , este, que é verdadeiramente o seu segundo videoclipe, consegue ainda assim libertar-se agradavelmente da formalidade interpretativa à qual muitos dos seus pares se prendem.

Texto escrito segundo o novo Acordo Ortográfico, a pedido do autor.