Uma reflexão sobre o território

É necessário que este seja um momento privilegiado para uma reflexão e um debate alargado entre arquitectos.

Estamos a comemorar desde o passado mês de Julho os 20 anos da Ordem dos Arquitectos. Instituída a 3 de Julho de 1998, a OA é a herdeira das sucessivas designações que a Associação Profissional dos Arquitectos teve desde 1902. A criação da Ordem, com as novas responsabilidades inerentes, veio, no entanto, marcar uma nova realidade para a profissão.

Uma nova realidade acompanhada também de novas responsabilidades na regulação do exercício da profissão. De facto, enquanto associação profissional de direito público, a Ordem veio beneficiar de todo um novo enquadramento jurídico, no que se refere ao relacionamento entre os arquitectos e a sociedade, fixando regras na organização das relações de trabalho, e na forma de relacionamento com as estruturas políticas.

Em suma, novas responsabilidades que passam, desde logo, pela clarificação das relações com outras profissões envolvidas na elaboração de projectos ou no acompanhamento de obras, mas também por uma maior intervenção nas áreas de formação e no seu reconhecimento, bem como no modo de estruturação das cada vez mais frequentes e complexas relações internacionais e de articulação das legislações dos diversos Estados.

A importância de muitas destas responsabilidades foi há vários anos reconhecida pela própria Comunidade Europeia, quando criou legislação específica para a área da arquitectura, a única, para além da área da saúde, a ser objecto de directivas próprias. Significativo, também, o facto de a mesma Comunidade ter escolhido obras de arquitectura para constarem nas notas da moeda europeia, representando uma síntese da arte e da técnica, como base da nossa cultura europeia. São obras que estão representadas desde as da antiguidade clássica (na nota de cinco euros) até aos exemplos mais modernos da arquitectura contemporânea (nas notas de 500 euros), estas manifestamente menos conhecidas.

É toda esta memória da evolução da nossa cultura que diariamente nos passa pelas mãos, mas à qual damos, geralmente, pouca atenção.

Pouca atenção que quase sempre demonstramos perante muitas das obras com que nos cruzamos no nosso dia-a-dia. De facto, apesar de passarmos grande parte das nossas vidas rodeados de arquitectura, estamos pouco atentos à sua presença, o que reflecte, também, o modo como lidamos com o património arquitectónico.

Neste ano, declarado como Ano Europeu do Património Cultural, foi este o tema escolhido para o nosso Congresso, "O património arquitectónico e paisagístico". Um património que, também entre nós, está em rápido processo de transformação e sujeito a múltiplas pressões, esperando, com mais este debate, contribuir com algumas das respostas urgentes e adequadas de que este património tanto carece.

Para reflectir sobre alguns destes e outros assuntos vamos, de 25 a 27 deste mês, realizar o 15.º Congresso dos Arquitectos, que terá lugar no Algarve, em Lagoa, no Centro de Congressos do Arade. Vamos realizá-lo no ano em que se completam também os 70 anos sobre a primeira vez em que o Estado, à época apelidado de Novo, permitiu que os arquitectos se reunissem para conversar sobre os seus problemas. Foi em 1948, quando foi realizado o primeiro, hoje quase mítico, Congresso dos Arquitectos.

Já então, tal como agora, a preocupação central era o sempre difícil equilíbrio entre os vários poderes, do político ao económico, das múltiplas necessidades sociais aos desejos profissionais. Os problemas com que actualmente nos confrontamos são naturalmente muito diferentes dos dessa época mas, então como agora, é necessário que este seja um momento privilegiado para uma reflexão e um debate alargado entre arquitectos.

Um debate agora mais complexo, porque extensível a muitos outros aspectos, que começam pela necessidade de reflexão sobre o respectivo enquadramento socioprofissional pois, apesar de todos os reconhecimentos feitos à profissão de arquitecto, esta continua cercada de múltiplos e sempre renovados constrangimentos de vária ordem. Constrangimentos de uma produção legislativa ainda cheia de contradições, frequentemente sujeita a ambiguidades de interpretação, ou a pressões especulativas que impedem o desejável contributo à qualificação do ambiente onde vivemos. 

Sendo o enquadramento social e a melhoria qualitativa do ambiente arquitectónico e paisagístico a razão principal da nossa actividade, urge uma reflexão como a que iremos fazer no decurso deste Congresso.

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