Espinho já tem projecto para estádio que ainda não existe e já está cheio de valor emocional

O município de Espinho apresenta quinta-feira à tarde o projecto de arquitectura para o seu novo estádio, que será propriedade da autarquia, mas terá como principal inquilino o clube da terra. Se tudo correr bem, no final de 2020 estará concluído e apto a acolher competições profissionais.

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“Há uns 40 anos que estamos à espera disto”, diz o presidente do Sporting Clube de Espinho. É assim que Bernardo Gomes Almeida se refere àquele que acredita ser “o último e definitivo” projecto de arquitectura para o estádio que Espinho reclama há muito e que a Câmara Municipal quer construir para usufruto próprio e do clube da terra. O desenho do novo equipamento vai ser esta quinta-feira apresentado ao público e, se é verdade que já outros projectos o precederam, inclusive com “maquetas a circularem pelos cafés da cidade”, o presidente dos chamados “Tigres da Costa Verde” acredita que a presente proposta do gabinete RDLM Arquitectos será a final. “É que já ninguém aguenta mais”, defende. “É bom que se acabem com os interesses políticos que sempre bloquearam os projectos anteriores e desta vez todos percebam que Espinho – a cidade e o clube – precisam, de uma vez por todas, de um estádio decente”.

Um dos factores que contribui para a confiança no projecto actual é que, após um Processo Especial de Revitalização que resultou na transferência do património do clube para uma sociedade autónoma criada especificamente para converter o seu edificado em pelo menos 13 milhões de euros para saldar dívidas a credores, o Sporting Clube de Espinho ficou em Maio deste ano sem o seu Estádio Manuel Violas. “Estava muito degradado, mas ainda era nosso”, recorda Bernardo Gomes Almeida. “Fico muito triste pelos nossos antepassados ao ver que as direcções anteriores do clube nos fizeram perder aquele edifício icónico, que construíram com tanto esforço e que estava cheio de história, num local que vai deixar saudades também pela vista para o mar, pelo cheiro a sardinhas assadas e pelos pregões das varinas”. A desactivação do Manuel Violas obrigou assim a secção de futebol dos Tigres a mudar-se para Santa Maria da Feira, onde treina e joga no Estádio do Bolhão, mas, como a ocupação desse espaço tem que ser compatibilizada com os horários do Fiães Sport Clube, a solução não é a melhor. “Daqui a algumas semanas vamos mudar-nos outra vez, para o Regimento de Infantaria de Espinho”, anuncia Bernardo Gomes Almeida. “Com isso vamos rentabilizar melhor o nosso tempo, mas ainda assim é importante que não haja derrapagens na construção do novo estádio, porque ninguém gosta de andar em casa emprestada. O clube sobreviveu ao risco de insolvência, provou ser viável dentro das suas limitações e agora os nossos 1.000 atletas e cerca de 3.000 sócios merecem um estádio novo, ao nível das suas ambições de subida à II Divisão”.

No entanto, por muito que o Sporting Clube de Espinho nos últimos três anos venha chegando ao final da época “com um orçamento equilibrado”, a atual direcção não vê em nenhum horizonte razoável qualquer capacidade financeira para assumir a construção de um estádio a expensas próprias. A Câmara Municipal já lhe cedera o direito de superfície afecto ao terreno destinado ao novo imóvel, mas a direcção dos Tigres fez as contas, assumiu-se indisponível para a obra e prescindiu desse benefício legal. “Por muito boas que sejam as nossas condições para novos sócios, com quotas mensais de 5 euros e uma série de descontos em dentistas, oculistas, prontos-a-vestir, perfumarias e até lojas de animais, não chegávamos lá tão cedo”, admite Bernardo Gomes Almeida. “Tínhamos que ser conscientes e até é bom que o estádio seja municipal, porque assim não há risco de o clube ficar sem ele mesmo que algum dia apareçam novos artistas na direcção”.

5.200 lugares para futebol e não só

Para a Câmara de Espinho, assumir a construção do novo equipamento veio dar mais trabalho, mas o presidente da autarquia concorda que a mudança não está mal pensada. “Assim o estádio será sempre do Município, com o clube a ser o seu principal utilizador, mas não o único”, explica Pinto Moreira. “Não se podia é adiar mais o assunto! Faço 50 anos daqui a 15 dias e desde criança que ouço falar de um estádio novo que nunca mais chega. Com a apresentação do projecto arquitectónico e o lançamento do concurso público para a obra, vamos concretizar, portanto, não só o sonho do Sporting Clube de Espinho, dos seus atletas e adeptos, mas também uma ambição antiga da cidade e do concelho”.

Quando a Câmara abriu o concurso para concepção do projecto de arquitectura, a escolha recaiu sobre a proposta do gabinete local de Rui Lacerda (1954-2018) e do seu filho Diogo Lacerda. Daí já saíram edifícios para vários países, mas, só no que se refe a Espinho, a lista inclui obras como o Casino, o Auditório, a Biblioteca Municipal José Marmelo e Silva, a Escola Secundária Manuel Laranjeira e a requalificação em curso na Alameda 8, na sequência do enterramento da linha férrea em 2008. Pinto Moreira recorda que os requisitos apresentados aos arquitectos foram simples: “Queríamos um estádio que fosse moderno, confortável, adequado à dimensão e realidade do município, e com toda as condições técnicas exigidas pela Federação Portuguesa de Futebol e pela Liga Portuguesa de Futebol Profissional para acolher competições de topo”. Esteticamente, também só havia um critério a cumprir: “Que o edifício se ajustasse à envolvente, considerando que vai ficar integrado na zona verde do Parque da Cidade, ao lado na Nave Desportiva, do Complexo de Ténis e da Pousada da Juventude”.

Para o presidente da autarquia, o projecto dos Lacerda soube materializar esses objectivos e restam agora duas tarefas a cumprir: lançar até meados de Novembro o concurso público para adjudicação da respectiva empreitada e, considerando que o orçamento estimado para construção do estádio é de 2,5 milhões de euros, “montar a operação que permitirá financiar o projecto, com o apoio da Assembleia Municipal e recurso à banca”. Uma vez escolhida a empresa que executará a obra e obtido o devido visto do Tribunal de Contas, a construção do novo estádio deverá então chegar ao terreno em meados de 2019, após o que terá um prazo de execução de 18 meses. “No fim de 2020 devemos ter o estádio pronto”, avalia Pinto Moreira.

Por essa altura, a expectativa geral é de que a equipa de futebol do Sporting Clube de Espinho possa passar a ter sede no novo Estádio Municipal. Ainda não estão definidos os termos do contrato de cedência, mas, mesmo tendo em conta que a autarquia quer reservar-se o direito de dispor do edifício para outras iniciativas desportivas e culturais, há já alguns aspectos dados como certos: o novo equipamento ocupará uma área de 18.000 metros quadrados, disponibilizará entradas distintas para cada equipa, vai dispor de quatro bancadas cobertas e terá capacidade para 5.200 lugares, no que se incluem 105 na tribuna presidencial, 42 distribuídos por seis camarotes, 36 para jornalistas e 32 para cidadãos com restrições de mobilidade. No exterior, o imóvel apresentar-se-á encimado por uma grande pala, contornado por uma sucessão de pilares e complementado com um percurso pedonal deambulatório, que, com cerca de 8 metros de largura coberta, foi pensado para incentivar o usufruto da paisagem e das sensações por ela motivadas. A cor dominante será clara, pelo acizentado pálido do betão e pela cobertura metalizada esmaltada de branco.

Experiência e irreverência na co-autoria

Diogo Lacerda, que vem coordenando o projecto sozinho desde a morte do pai no início de setembro, confessa que o estádio se reveste agora de mais simbolismo. “A parte conceptual foi desenvolvida pelos dois e vou-me sempre lembrar disso”, diz o arquitecto. “O meu pai aplicava-lhe a experiência, até porque esta já era a segunda vez que ele desenhava um estádio para o Espinho e queria fazer uma coisa diferente, adequada a outros tempos e outras realidades; eu aplicava-lhe um toque mais irreverente e isso gerava discussões muito interessantes, de que eu vou sentir muito a falta”.

Essa ligação familiar não é, contudo, a única que marca o projecto. “Este estádio já está cheio de valor emocional”, argumenta Diogo Lacerda. “Tenho 37 anos e desde sempre ouvi falarem dele, fossem atletas e adeptos do Espinho, fossem pessoas sem vínculo especial ao clube”. Os autores do projecto sabiam o significado dessa espera e procuraram, por isso, conceber um edifício viável, “que desta vez pudesse ser mesmo executado”. O futuro Estádio Municipal de Espinho será "contido e sem exageros, feito à medida da cidade, funcional e agradável”. Vai “integrar-se bem na paisagem, camuflar-se facilmente no parque da cidade e poderá até passar despercebido” até ao momento em que a proximidade ao edifício o impuser “em toda a sua altura e lhe realçar a pala que vai exibir como elemento escultórico”. Ainda faltam quase dois anos para ele ganhar forma, mas Diogo Lacerda acredita que, “se ninguém se lembrar de arranjar problemas mais uma vez, é desta que Espinho ganha finalmente o seu estádio”. O arquitecto gostava de dar essa alegria à cidade, ao clube e, claro, também ao seu pai.

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