TdC diz que câmara de Castelo de Vide fez contratação ilegal

Autarca manteve ilegalidade apesar do alerta lançado pelo Provedor da Justiça. Tribunal de Contas confirma infracção e remeteu o caso para o Ministério Público, que vai analisar o relatório.

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ML - Mafalda Melo

No decorrer de uma fiscalização efectuada à conta de gerência do município de Castelo de Vide, relativa ao ano de 2011, o Tribunal de Contas (TdC) confirmou o teor de uma queixa apresentada pela Provedoria da Justiça: A câmara abriu concurso para recrutar João Luís Inácio Dona como técnico superior para o gabinete de Protecção Civil da autarquia em vez de privilegiar o recurso a pessoal na mobilidade, como estabelece a Lei n.º 12-A/2010, que diz respeito ao controlo da dívida pública. Esta ilegalidade foi confirmada pelo Ministério Público, que vai avaliar a situação. Inácio Dona integrou a lista eleitoral do actual presidente do PSD.

Da análise ao relatório da fiscalização elaborado pelo TdC, e a que o PÚBLICO teve acesso, conclui-se que a contratação de Inácio Dona foi consumada “sem que tenha sido verificada a impossibilidade de ocupação do posto de trabalho em questão por recurso aos instrumentos de mobilidade geral”. A ilegalidade “culminou com a sua contratação em regime de relação jurídica de emprego por tempo indeterminado”, entre Setembro de 2011 e final de Janeiro de 2016. Neste período de tempo, o trabalhador contratado, auferiu remunerações “no montante de 73.426 euros” confirmou o TdC.

A Provedoria, que tomou conhecimento desta situação através de uma denúncia, enviou ao executivo autárquico, em data anterior à contratação de Inácio Dona, “várias comunicações” chamando a atenção para a “ilegalidade” da situação e para as respectivas consequências. Mas apesar destas comunicações, António Manuel Grincho Ribeiro, presidente da Câmara de Castelo de Vide em funções até 2013, “deixou prosseguir o procedimento concursal, autorizou a contratação (de Inácio Dona) e autorizou também o pagamento dos respectivos vencimentos”. A ilegalidade foi mantida com a entrada em funções do novo presidente da autarquia, António Pica, em 13 de Outubro de 2013. Este autarca integrou, como vereador, o executivo anterior, com a função de vice-presidente, entre 2001 e 2013.

O TdC afirma que António Pica “tomou conhecimento das comunicações da Provedoria sobre a matéria, manteve a situação e autorizou os pagamentos dos vencimentos ao técnico superior até 31 de Janeiro de 2016”.

Sem “danos para o erário”

António Manuel Grincho Ribeiro, Daniel Jorge Carreiras da Silva e António Manuel das Neves Nobre Pita, acusados de ilegalidade no relatório do TdC, alegaram que foi “preocupação do município de Castelo de Vide a de seguir escrupulosamente as recomendações da Provedoria de Justiça”. Contudo, alegam que “os dispositivos legais à data eram omissos relativamente aos procedimentos de consulta aos mecanismos da mobilidade geral”. Por outro lado, a interpretação dada pelos serviços à norma constante na Lei n.º 12-A

2010, “ao que parece erradamente, e seguida por tantos outros municípios” acrescida da “inexistência” de um técnico superior de Direito no mapa de pessoal, terão dificultado uma análise correcta da situação, argumentam os visados.

Reportando-se aos pagamentos feitos a Inácio Dona, os autarcas “pressupõem” que as quantias pagas ao trabalhador “não causaram dano ao erário público e foram adequados e proporcionais à prossecução das atribuições.” O TdC não partilha desta interpretação pois considera que todos os pagamentos efectuados são “pagamentos indevidos” e que deveriam ter posto termo “imediatamente a uma situação grave com origem num contrato nulo”.

A ilegalidade é susceptível de fazer incorrer os seus autores em “responsabilidade civil, financeira e disciplinar”, acentua o relatório do TdC que, perante os factos sintetizados no seu relatório, se “recusa a homologar” a conta de gerência do município de 2011.

Comprovada que está a “ilegalidade da contratação” de Inácio Dona, o TdC enviou o relatório para apreciação do Ministério Público (MP). Este organismo diz ter identificado no documento elementos que indicam a “abertura indevida de um procedimento concursal”, considerando que a descrição dos factos “está bem documentada e devidamente caracterizada”. Competirá, agora, ao MP “analisar em detalhe a responsabilidade e culpa de cada um dos responsáveis identificados”, não adiantando “para já” as “possíveis infracções financeiras evidenciadas” no relatório do TC.”

Entretanto Inácio Dona, que integrou em 4º lugar a lista do PSD à Câmara de Castelo de Vide nas eleições autárquicas de 2013, liderada por António Pita, foi nomeado pelo presidente da autarquia, em Fevereiro de 2016, para o cargo de Comandante Operacional Municipal, em comissão de serviço por três anos, com a remuneração de 1819 euros.

O PÚBLICO tentou contactar o presidente da câmara mas foi informado que o autarca “se encontra em serviço no Brasil”. Também não foi possível falar com o seu substituto.

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