Voltar a ver

Essas são as pessoas que sabem viver. Em vez de comparar experiências, acumulam-nas.

O maior empecilho do nosso prazer é a memória. A memória não merece a fama que tem. É só porque nos lembramos do sítio X quando era mais bonito e mais selvagem e tinha menos gente que nos recusamos a voltar a X.

Deveríamos fazer precisamente o contrário. Imagine-se X daqui a 50 anos muito menos bonito e selvagem e com ainda mais gente do que hoje. Agora é a melhor altura para lá ir.

Parte-se do princípio, geralmente verdadeiro, que tudo piora com o tempo. Como não se pode voltar ao passado (que a memória, presa à juventude, embeleza mentirosamente) a única coisa a fazer é aproveitar o presente como o momento mais próximo do passado que pode haver - e mais distante do indesejado futuro.

Nunca mais ir a X é como chegar aos 40 anos e desistir de viver porque nos lembramos do quanto nos divertimos com 20 anos. Fale-se com pessoas que todos os anos passam o Verão em X há mais de 50 anos. Perguntamos se X não era mais bonito e sossegado no passado. Dizem que sim. Deve-lhes custar ver X como é agora. Não, não custa. Continuam a vir porque gostam de X e preferem ver X a mudar de ano para ano a passar o Verão noutro lugar, mesmo que esse lugar possa ser mais bonito e sossegado.

Essas são as pessoas que sabem viver. Em vez de comparar experiências, acumulam-nas. O Algarve será sempre o Algarve. O meu pai que adorava o Algarve deixou de lá ir em 1966, dizendo que estava estragado.

Mas os lugares não podem ficar os mesmos porque nada nem ninguém consegue ficar na mesma: só a nossa teimosia.

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