Portugal nos bastidores de Locarno

Numa edição com menos títulos a concurso, é nos bastidores do festival de cinema de Locarno que Portugal dá que falar: seis longas em pós-produção vão ser mostradas à indústria no programa paralelo First Look.

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A embaixada portuguesa ao Festival de Cinema de Locarno, que começa esta quarta-feira naquela cidade suíça e termina a 11 de Agosto, parece mais pequena do que é habitual – se, em 2016 (ano em que João Pedro Rodrigues ganhou o prémio de realização por O Ornitólogo), havia 14 títulos entre produções e co-produções, e no ano passado seis (com António e Catarina, de Cristina Hanes, a vencer o concurso de curtas), este ano temos apenas quatro. Na competição de curtas Pardi di Domani, concorrem 3 Anos Depois, de Marco Amaral, e Grbavica, co-produção com Espanha e Bósnia, dirigida pelo catalão Manel Raga Raga. Na paralela de vanguarda Signs of Life temos Sobre Tudo sobre Nada, primeira longa de Dídio Pestana (cúmplice de Gonçalo Tocha) e Como Fernando Pessoa Salvou Portugal, “minifilme” de 30 minutos em co-produção com França e Bélgica, que marca o regresso de Eugène  Green ao seu melhor.

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A embaixada portuguesa ao Festival de Cinema de Locarno, que começa esta quarta-feira naquela cidade suíça e termina a 11 de Agosto, parece mais pequena do que é habitual – se, em 2016 (ano em que João Pedro Rodrigues ganhou o prémio de realização por O Ornitólogo), havia 14 títulos entre produções e co-produções, e no ano passado seis (com António e Catarina, de Cristina Hanes, a vencer o concurso de curtas), este ano temos apenas quatro. Na competição de curtas Pardi di Domani, concorrem 3 Anos Depois, de Marco Amaral, e Grbavica, co-produção com Espanha e Bósnia, dirigida pelo catalão Manel Raga Raga. Na paralela de vanguarda Signs of Life temos Sobre Tudo sobre Nada, primeira longa de Dídio Pestana (cúmplice de Gonçalo Tocha) e Como Fernando Pessoa Salvou Portugal, “minifilme” de 30 minutos em co-produção com França e Bélgica, que marca o regresso de Eugène  Green ao seu melhor.

E, no entanto, fora do olhar público essa embaixada quase triplica para dez filmes, com seis longas-metragens a terem “pré-estreia” em Locarno. São quatro documentários e duas ficções que serão apresentadas numa iniciativa paralela restrita aos profissionais, First Look, que existe desde 2011 com o intuito de abrir uma janela sobre uma cinematografia minoritária (em 2017 foram os estados bálticos, em 2016 a Polónia). Anualmente, Locarno expõe um punhado de works in progress do território escolhido ao milhar e meio de profissionais acreditados no certame. Um júri de três elementos (este ano Eva Sangiorgi, da Viennale, Janet Pierson, do South by Southwest, e José Luis Rebordinos, do festival de San Sebastián) escolherá o(s) vencedor(es), que receberão um total de 75 mil euros em serviços de pós-produção e divulgação.

 O responsável da secção, Markus Duffner, curiosamente, reside em Lisboa há dois anos. Mas, em breve conversa telefónica com o PÚBLICO, explica que isso não influiu nem na opção por Portugal nem nos títulos que foram seleccionados: “Locarno tem há muito tempo uma relação com Portugal e com a sua cinematografia.” À imagem do que aconteceu nos anos anteriores, a pré-selecção de projectos foi realizada por um parceiro local — no caso, o Instituto do Cinema e Audiovisual, que se encarregou de toda a logística das candidaturas.

Ao todo, segundo Duffner, foram recebidas 21 propostas que passaram pela programadora Ana Isabel Strindberg, pelo montador Tomás Baltazar e por Vítor Pinheiro, das relações internacionais do ICA. Este comité reduziu as candidaturas aprovadas a 16, e a lista final de seis títulos foi escolhida por uma equipa de Locarno: Duffner, Nadia Dresti, responsável pelas relações com a indústria, Mark Peranson, programador, e Carlo Chatrian, director artístico. O que se pede a um projecto seleccionado para o First Look não é o mesmo que se pede para as selecções competitivas: “Gostamos de pensar que esta secção é uma rampa de lançamento internacional,” explica Duffner, citando Que Horas Ela Volta?, de Anna Muylaert, que passou pelo First Look. “Locarno tem uma marca muito específica — dar voz a filmes comercialmente mais difíceis de explorar. Acreditamos que temos de trabalhar ambos os lados da equação, o comércio e a indústria e o lado artístico. Temos de marcar um equilíbrio.” Daí que as escolhas 2018 abranjam projectos mainstream como Gabriel, de Nuno Bernardo (beActive), e Golpe de Sol, de Vicente Alves do Ó (Ukbar Filmes), ao lado de documentários imersivos como Terra, de Rossana Torres e Hiroatsu Suzuki (Entre Imagem/OPTEC), ou Campo, de Tiago Hespanha (Terratreme).

Praticamente todos os projectos seleccionados pelo First Look têm a montagem de imagem concluída, todos os produtores com quem o PÚBLICO falou apostam no First Look como ponto de partida para a circulação internacional. Nuno Bernardo, que se estreia na longa-metragem com Gabriel (história de boxe ambientada nos Olivais), e Rodrigo Areias, da Bando à Parte, que apresenta Hálito Azul (documentário rodado nos Açores inspirado por Raul Brandão), vão à procura de um agente de vendas que se ocupe da distribuição internacional. Para Bernardo, Locarno será ainda um trampolim para colocar Gabriel noutros festivais, até porque “a temática e a execução tornam o filme mais próximo do tipo de obras normalmente escolhidas pelos programadores”; aproveitará igualmente para procurar parcerias para futuros projectos da produtora beActive, que esteve na origem do sucesso internacional do Diário de Sofia.

Hálito Azul, co-produção da Bando à Parte com França e Finlândia, tem estreia garantida nesses países, mas Areias pretende também encontrar um agente internacional, ressalvando ao PÚBLICO que a montagem final só irá ficar concluída depois de Locarno, aproveitando a possibilidade de feedback de uma secção como esta. Pandora da Cunha Telles, da Ukbar Filmes, por trás de Golpe de Sol, diz procurar igualmente reacções à montagem — que, adianta, está praticamente terminada —, a par de “apoio financeiro à conclusão, que se pode materializar através de um agente de vendas internacional ou uma co-produção com um país que possa obter apoio à finalização”. Tanto Golpe de Sol como Gabriel têm já distribuição nacional garantida pela Nos, com estreia em 2019.

É também apoio à finalização que é procurado pela luso-romena Rossana Torres (que estudou sob António Reis) e pelo japonês Hiroatsu Suzuki. A dupla, que esteve em Locarno em 2009 com a curta Cordão Verde, filmou Terra no vale do Guadiana e vai ao First Look em busca de ajuda financeira para “terminar a montagem de som, fazer a mistura de som e tratamento da cor,” dizem por email, “assim como para a sua promoção”. Torres e Suzuki sublinham que “não é fácil mostrar este tipo de filmes” e por isso Locarno será uma valiosa montra para um projecto autoproduzido, com a OPTEC de Abel Ribeiro Chaves a entrar no apoio logístico à montagem.

Num patamar diferente estão Campo, de Tiago Hespanha, e Viveiro, de Pedro Filipe Marques (O Som e a Fúria). Ambas as suas produtoras tiveram filmes premiados no festival de 2017 e têm já assinalável reputação internacional. Para João Matos, da Terratreme, Campo, rodado no (e à volta do) Campo de Tiro de Alcochete, é um filme que, segundo crê, “terá um percurso internacional bastante interessante em 2019”. “[Com a presença no First Look] queremos fundamentalmente começar a fazer circular o filme, de forma a encontrar parceiros de distribuição e um interesse de festivais que possam catapultar a sua circulação.”

É isso que o produtor Luís Urbano, do Som e a Fúria, procura igualmente para Viveiro, onde Pedro Marques (A Nossa Forma de Vida) olha para os bastidores de um pequeno clube de futebol no Arcozelo: “Parcerias para co-produção, distribuição internacional e sinalização do filme com especial enfoque nos festivais.” Sendo um projecto “atípico” no currículo do Som e a Fúria, “mais vocacionada para a ficção”, Urbano defende que o First Look é uma oportunidade para “testar e procurar parcerias que dificilmente poderiam ser estabelecidas em fase de desenvolvimento”.