A Marinha de Duplo-Uso: uma visão de sustentabilidade

Em que medida a Marinha Portuguesa pode apresentar ao mundo uma capacidade de resposta resiliente e sustentável?

“A terra é azul”

Yuri Gagarin

Vista do espaço, a terra continua azul e prossegue, imperturbavelmente, o seu duplo movimento simultâneo de rotação e de translação, garantindo a manutenção da vida na terra. Porém, se aproximarmos o nosso olhar dos dois terços da terra cobertos por oceanos e mares, constatamos que o espaço marítimo apresenta um movimento aleatório e complexo de ameaças à defesa e à segurança das populações que fazem uso do mar. 

Recentemente, de modo a responder aos desafios colocados por uma mudança global, fruto da complexidade de fatores naturais e antrópicos, algumas organizações internacionais e alguns Estados têm vindo a assumir uma nova estratégia centrada no conceito de resiliência, enquanto capacidade para gerir e absorver choques num mundo em mudança. 

Tendo em conta o cenário apresentado, a questão que se coloca é a seguinte: em que medida a Marinha Portuguesa pode apresentar ao mundo uma capacidade de resposta resiliente e sustentável?

Pois bem, a Marinha oferece um campo de investigação privilegiado para compreender como é que uma instituição centenária, com mais de 700 anos, vinculada a um modelo organizacional de duplo-uso militar e não militar, promove a resiliência e a sustentabilidade.

Nesta lógica, enquanto organização de alta fiabilidade, a Marinha é uma organização resiliente vinculada a um conjunto de fatores, entre os quais, a auto-organização, a adaptação, a sinergia das capacidades e o feedback das lições aprendidas. Tais fatores permitem responder às consequências nefastas que podem decorrer num quadro de ameaças sociais, económicas ou ambientais, no espaço marítimo.

Todavia, de uma forma vanguardista, a Marinha integrou um tipo de resiliência, fruto de um processo de investigação, que representa uma visão paradigmática de transformação. Consubstanciados nos paradigmas genético (meios), estrutural (organização) e operacional (atividades), estes paradigmas permitem responder a uma necessidade de manter os processos contínuos de adaptação para evitar a degradação dos meios, da estrutura e das atividades.

Simultaneamente, motores e referências da transformação da Marinha, estes paradigmas desenvolvem três propriedades de resiliência, designadamente, o equilíbrio, a otimização e a flexibilidade, criando uma estrutura capaz de se transformar, adaptando-se às circunstâncias dos ambientes internos e externos da Marinha.

Embora, numa primeira abordagem, o modelo de duplo-uso da Marinha Portuguesa possa suscitar alguns contornos paradoxais resultantes da falta de compreensão do mesmo, numa análise mais detalhada este modelo, que estabelece a harmonização entre a componente militar e a componente não militar, apresenta uma coerência sistémica que veicula uma visão de sustentabilidade.

Com efeito, numa época em que a ciência e a política estão a integrar a resiliência e a sustentabilidade para garantir a perenidade dos sistemas organizacionais, a Marinha Portuguesa representa um modelo intergeracional de alta fiabilidade, que soube integrar a visão de sustentabilidade de modo a garantir a satisfação de defesa e segurança das gerações passadas, atuais e futuras, nas vertentes social, económica e ambiental.  

Tal como Galileu, obrigado a renegar, perante o Tribunal Romano do Santo Ofício, a sua teoria heliocêntrica de que a Terra se movia em torno do sol, teria dito baixinho "e pur si muove!" ("e, contudo, ela move-se"), apesar do choque orçamental de 2011 e da decisão política ter fraturado a Autoridade Marítima Nacional da estrutura orgânica da Marinha, também hoje muitos podem continuar a dizer baixinho “e, contudo, o duplo-uso é sustentável!”.  

Em nota final, gostaríamos de terminar com uma reflexão que reflete uma visão de ambiente e de sustentabilidade. 

O planeta terra, sendo o sistema mais eficiente de suporte de vida, tem a virtude de garantir a sua sustentabilidade, através do duplo movimento de rotação e de translação. Como todos sabemos, este duplo movimento tem duas funções, regular o dia e a noite, assim como as estações do ano. Nesta amplitude existe vida na terra.

Assim, também o duplo-uso, um dos sistemas mais eficiente para garantir o uso do mar, tem a virtude de garantir a sua sustentabilidade através do duplo movimento de defesa e de segurança. Como muitos sabem este duplo movimento tem duas funções, regular as atividades militares e não militares. Nesta amplitude existe otimização dos recursos.

A autora escreve segundo o novo Acordo Ortográfico

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