Os bisbilhoteiros

A bisbilhotice é o mais violento dos vícios portugueses. Devora quem a pratica, precisando da inimizade mais pura para sobreviver.

Estão a falar dum homem que tem uma vida mais fácil do que a deles. Estão presos no delírio da bisbilhotice. São três homens que se juntaram para bater noutro que desprezam e invejam e adorariam ver cair.

Fazem lembrar uma matilha de cães a despedaçar uma raposa, tal é a gula com que dão as dentadas. A bisbilhotice é o mais violento dos vícios portugueses. Devora quem a pratica, precisando da inimizade mais pura para sobreviver.

Estabelecem que o homem que vive bem sem nada fazer por isso - as situações são sempre muito claras e fáceis de perceber e julgar - está a violar um antigo preceito de justiça e de bem comum. Um diz: "Então? Eu trabalho para pagar a minha renda!" E o outro sentencia, a voz da razão moral: "Tem de ser igual para todos".

Envenenando-se uns aos outros vão pintando um retrato cada vez mais chocante da degeneração do visado. Ninguém diria que se trata de uma pessoa amiga com a qual já os vi almoçar e beber copos vezes sem fim. A bisbilhotice assenta nessa repugnante cobardia: "eu nunca lhe disse nada...e ele também nunca me perguntou".

Apetece-me interrompê-los só para ser estraga-prazeres mas também eu sou cobarde, embora tenha a honra que eles não têm: a de ser cobarde sozinho.

Adio a interrupção para a próxima vez que os encontre no restaurante onde todos vamos almoçando alegremente com a vítima deste linchamento verbal. Só para poder perguntar: "era deste vosso amigo que estiveram a falar durante duas horas no sábado passado?"

Malvados bisbilhoteiros.

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