Marcelo dá a mão a Trovoada e faz dissipar nuvens sobre a cooperação

No primeiro dia de visita de Estado do Presidente da República ao arquipélago, ficou a saber-se que António Costa o seguirá nos próximos meses, para afinar o que falta nas relações entre os dois países. Um programa económico e uma nova linha de crédito estão já em preparação.

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LUSA/MIGUEL A. LOPES
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Yon Gato era cego, cabo-verdiano e liderava comícios e revoltas em São Tomé e Príncipe contra o colonialismo português. Agora é nome de herói e de praça, um quadrado imenso em frente à Primatura, a sede do Governo do país. Foi ali que o Presidente da República português e o primeiro- ministro são-tomense se encontraram para começar a dissipar as sombras deixadas pelo segundo, Patrice Trovoada, dias antes desta visita de Estado. “Estou convencido que esta visita marcará um novo patamar nas relações com Portugal”, diz agora o chefe do executivo aos jornalistas, usando as mesmas palavras que Marcelo Rebelo de Sousa à chegada.

Era o encontro mais esperado do primeiro dia do programa oficial e não podia ter começado de melhor forma: “Já tinha saudades tuas”, disse Marcelo a Trovoada mal saiu do carro, abraçando-o vigorosamente. Depois foram os dois de mãos dadas em direcção à multidão que os esperava, para euforia dos mais novos que estavam na primeira linha de espera. E da segunda também. Depois da reunião na Primatura, haviam de voltar para um autêntico mergulho nas gentes, com danças e beijos e muitas fotografias, em jeito de campanha eleitoral como aquela que vai haver neste país do Equador ainda este ano.

Se antes do encontro o céu de chumbo ameaçava chuva grossa, depois as nuvens dissiparam-se e ficou apenas o calor. E as boas notícias. “Há uma convergência na análise da cooperação até então, da consolidação dessa cooperação e da necessidade de irmos para outros patamares”, disse Trovoada aos jornalistas no meio da praça, depositando toda a esperança na vinda do seu homólogo luso nos próximos meses. Nessa altura, “a nível dos dois governos veremos como tornar isso uma realidade”.

A vinda próxima de António Costa foi anunciada logo de manhã, na reunião com o chefe de Estado são-tomense que marcou o arranque oficial da visita. Nesse encontro, os dois presidentes fizeram questão de se referir às excelentes relações entre os dois países e apontar para o futuro.

Aos jornalistas, Evaristo Carvalho recordou  a sua visita a Portugal em Maio passado e lembrou que os dois países “partilham um oceano rico e central nas relações comerciais intercontinentais”. Colocou a tónica, não tanto na cooperação social, hoje predominante, mas na economia, esperando que juntos possam caminhar “para além daquilo que é comum e tradicional e explorar novos horizontes”.

Marcelo Rebelo de Sousa concordou – “18 anos depois da última visita de um chefe de Estado português, o mundo mudou” -, mas frisou que tem de ser aproveitado “o que de melhor se tem feito até agora, na educação, na saúde, na solidariedade social, na justiça, na administração interna, na defesa e na vida empresarial e na economia como um todo”.

“Temos um pilar da sociedade civil no domínio social, a que se soma o pilar Estado no domínio de funções de soberania e as relações económicas e empresariais”, acrescentou mais tarde, falando aos jornalistas antes do encontro com as Organizações Não Governamentais (ONG) portuguesas, reconhecendo que “não se foi tão longe como se esperava” nos dois últimos aspectos, sobretudo “por causa da crise” vivida em Portugal. 

Mas foi na abertura do Fórum Económico luso-santomense que levantou a ponta do véu sobre o futuro, ao afirmar que, com o primeiro-ministro, virá uma missão empresarial alargada e nessa altura será celebrado um acordo de parceria económica global, com novas áreas, como a energia. “Valeu a pena, senhor primeiro-ministro, cada um de nós ter tido, à sua maneira, um momento de angústia existencial, ou pelo menos de acicate antecipatório”, brincou.

Patrice Trovoada lamentara-se, na entrevista à Lusa antes desta visita, pela falta de crédito para as empresas e foi o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, que lhe respondeu, ao anunciar que está em preparação uma nova linha de crédito para o país. Santos Silva explicou que já houve uma, no valor de 50 milhões de euros, que teve dificuldade em ser cumprida sobretudo pelo lado dos são-tomenses. E deu um passo em frente: “O empréstimo directo está afastado, pelo que São Tomé tem de apresentar também garantias estatais, mas estamos a trabalhar para criar essa nova linha de crédito com taxas de juro muito favoráveis e as garantias necessárias”, afirmou.

Santos Silva acabaria também por concordar com outra das declarações do chefe de Governo local, quando reconheceu que “a CPLP não pode descansar em cima de uma língua comum”, antes deve promover um relacionamento económico mais forte e aumentar a mobilidade. Lembrou por isso a proposta conjunta portuguesa e cabo-verdiano para a partilha de autorizações de residência  para todos os naturais de países da CPLP, que deverá ser discutida na próxima reunião, antes do final do ano.

Dissipadas as nuvens,  sobrou a festa. A que começou logo de manhã, em frente ao palácio presidencial, com Marcelo ao lado do seu homólogo Evaristo Carvalho, com quem teve os primeiros contactos com a população. Por detrás das colunas militares que renderam honras aos chefes de Estado, a Tragédia [designação local de trupe, grupo de teatro] Mini Riboquino apresentava um espectáculo de Tchiloli, teatro tradicional são-tomense que adapta a medieval Tragédia de Marquês de Mântua e do Imperador Carloto Magno — luta de classes com um crime passional à mistura. No final, Marcelo distribuiu beijinhos às actrizes e apertos de mão aos actores. Sem saber que, no Tchiloli, são todos homens.

O PÚBLICO viajou num avião da Força Aérea Portuguesa.

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