Indemnização? Só se as gambas estiverem estragadas

A corrupção é algo amplamente divulgado e partilhado. Funciona quase como uma doença que, geralmente, quem a tem não pretende conhecer a cura. Estão bem assim e quantos mais sintomas, melhor.

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Rui Gaudêncio

Passaram uns dias desde que rebentou — esta é a expressão — o escândalo chamado Raríssimas. Em verdadeiro português, este problema poderia ser denominado "Frequentíssimas", "Corriqueiríssimas" ou até mesmo "Banalíssimas", através de uma expressão fenomenal, acompanhada de um leve encolher de ombros onde é possível questionar: “Outra vez arroz?” Talvez esta seja uma expressão algo estranha aos olhos de alguns, visto ser maioritariamente utilizada na zona Norte de Portugal. Porém, existem temáticas que todos conhecemos, quer vivamos no Norte, Centro, Sul ou ilhas. A corrupção é algo amplamente divulgado e partilhado. Funciona quase como uma doença que, geralmente, quem a tem não pretende conhecer a cura. Estão bem assim e quantos mais sintomas, melhor.

A mais recente portadora deste grave estado de (alma) saúde chama-se Paula Brito e Costa. Presidente da Associação Nacional de Deficiências Mentais e Raras, é acusada de má gestão do dinheiro distribuído para o bom funcionamento desta instituição. Todas as acusações são corroboradas por ex-funcionários que alegadamente comprovam, mediante documentos em sua posse, que Paula Brito e Costa geria a seu belo prazer os cerca de 1,5 milhões de euros que constavam no orçamento desta instituição.

Visto estarmos próximos do Natal, poderíamos utilizar um presente como metáfora para comentar este problema. Se começarmos a puxar a fita que prende o embrulho, descobrimos um salário base de 3500 euros; conseguimos desenrolar o laço e reparamos no grande BMW à porta de Paula Brito e Costa; ao colocar as mãos no papel de embrulho, deparamo-nos com a restante família Costa a verificar os milhares de euros que caem mensalmente nas suas contas, tendo sempre como emissora a Associação Nacional de Deficiências Mentais e Raras; tudo termina quando, qual criança entusiasmada, retiramos o embrulho por completo e damos de caras com uma associação sem fins lucrativos.

Poderíamos questionar o que está mal no meio de tudo isto. Dada a problemática de toda a equação, será mais pertinente perguntar o que afinal está bem. Paula Brito e Costa, ou "a Rainha da Parada", como preferirem, criou a Raríssimas após o nascimento de seu filho, diagnosticado com várias deficiências. A premissa desta associação é, evidentemente, nobre. Mais ainda, além da sua real nubilidade, poderemos até adjectivá-la como pertinente e oportuna. É neste ponto que, com o crescimento de todo o projecto, a alegada doença da sua fundadora (e presidente) foi evoluindo drasticamente.

Novas notícias dão conta não do despedimento de Paula Brito Costa, mas sim da sua regressão de rainha para (talvez) princesa, ou como quem diz de presidente a directora-geral da instituição visada. Aparentemente, tendo em conta os mais recentes depoimentos desta senhora, só sairá após receber uma indemnização acompanhada de subsídio de desemprego.

Chega a ser cómica a banalidade com que a corrupção anda de mãos dadas com o crescimento na cadeia de valor. Não de valor humano, esse diminui tal qual o apetite de alguém que compra 30 quilogramas de gambas para o jantar. É certo que o marisco é algo de fácil digestão, a ver vamos se a corrupção também o é.

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