O regresso de Murillo

Oito exposições a mostrar seis centenas de obras, concertos, filmes, edições e passeios fazem parte do programa inaugurado esta semana e que vai decorrer ao longo de todo o ano 2018.

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Casamento Místico de Santa Catarina

É um dos grandes vultos da pintora barroca espanhola, tem o seu nome numa porta do Museu do Prado, mas é em Sevilha, sua terra natal, que vão ocorrer as principais iniciativas de comemoração do 4.º centenário do nascimento de Bartolomé Esteban Murillo (1617-1682), que se cumpre no próximo dia 31 de Dezembro.

Ao longo de todo o ano de 2018, mas a começar já esta semana, a capital da Andaluzia vai celebrar este “pintor da luz e da cor”, cuja obra inovadora no século XVII – nas palavras do alcaide de Sevilha, Juan Espadas, citado pelo diário El País – ajuda a “contar a cidade inovadora do século XXI.

O pontapé-de-saída das comemorações estava agendado para esta quarta-feira, dia 29, com um concerto de Jordi Savall e da sua Capella Real da Catalunya e Hespèrion XXI no Teatro de la Maestranza, em Sevilha, a revisitar precisamente a música da época do pintor. Na apresentação do espectáculo, Savall comparou a pintura de Murillo a “uma obra polifónica”. Nas suas telas, “cabiam as vozes da sua cultura e da sua cidade, de todos esses personagens que ele transforma em divindades”, disse o músico a tocador de viola da gamba ao El País.

Também esta semana, no dia 28, o Museu de Belas Artes de Sevilha inaugurava a primeira das oito exposições que ao longo de um ano vão dar a conhecer cerca de 600 obras do pintor. Trata-se da mostra Murillo e os Capuchinhos de Sevilha. Reconstrução, que pela primeira vez revela o retábulo completo que o artista realizou para o Convento dos Capuchinhos.

A Igreja foi, de resto, o principal cliente de Murillo, o que fez com que a maioria das suas criações tenham tratado e celebrado a iconografia católica, em igrejas e capelas, mosteiros e conventos. Mas o artista cultivou também a pintura laica e de género ao longo da sua carreira.

No mesmo dia do concerto de abertura das comemorações em Sevilha, Joaquim Caetana fazia em Lisboa, no Museu Nacional de Arte Antiga (MNAA) – que tem na sua colecção a obra Casamento Místico de Santa Catarina (1640/55) –, uma conferência sobre o pintor andaluz.

Ao Ípsilon, este historiador de arte situa Murillo num período da história de Sevilha já marcado por modelos tardo-maneiristas e protobarrocos, que o pintor “adapta com grande eficácia para suplantar os seus mestres”. “Murillo arranja soluções legíveis e agradáveis, a que as pessoas aderem facilmente, para os problemas teológicos e estéticos da sociedade sevilhana do seu tempo”, acrescenta este conservador de pintura do MNAA, que destaca ainda na obra do artista, para lá de toda a iconografia religiosa mais reconhecida, “uma certa teoria social sobre o papel dos pobres”. “Ele é um excelente pintor de crianças, trata a infância e a proliferação de crianças pobres na sua terra através de uma crítica social amável”, acrescenta Joaquim Caetano, que refere também, no caso da sua pintura religiosa, o modo como Murillo “consegue encontrar um tipo de beleza para a imagem da Virgem, sempre bela mas não perturbadora, e que não seja um convite à sedução e ao pecado”.

Temas que certamente vão igualmente marcar as sucessivas iniciativas em volta de Murillo em Sevilha em 2018, nomeadamente no congresso internacional que, em Março, abordará Murillo perante o seu Centenário: perspectivas historiográficas e culturais. O comissário geral do simpósio será Benito Navarrete Prieto, o grande especialista na obra do pintor, e que acaba de publicar em Espanha o seu novo estudo, sob o título Murillo y las Metáforas de la Imagen.

Prieto é ainda o curador de Murillo y su estela en Sevilla, que vai expor, a partir de 6 de Dezembro, 62 obras do pintor no Convento de Santa Clara. Ainda até final do corrente ano, serão abertas as mostras Murillo na Catedral de Sevilha. O olhar da Santidade, na catedral (8 de Dezembro); Murillo e a Faculdade de Belas Artes. 400 anos depois, na Sala Santa Inês desta instituição (12 de Dezembro); e Los Neve. Mercaderes, hidalgos y mecenas en la época de Murillo, no Arquivo Geral da Andaluzia (18 de Dezembro). Ao longo do próximo ano abrirão quatro outras exposições, além da organização de passeios, visitas guiadas, estreia de filmes e concertos dedicados ao autor de figuras icónicas como a Imaculada Conceição ou o Bom Pastor com cara de menino.

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