Plano de contingência de Fátima pode ser usado no Festival Eurovisão

Operação Fátima 2017 preparada para a visita do Papa correu bem. Plano de contigência pode ser aproveitado para outros eventos que envolvam grandes aglomerados no futuro, como o Festival Eurovisão de 2018.

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Salvador Sobral venceu este ano o Festival Eurovisão LUSA/SERGEY DOLZHENKO

É preciso reforçar o quadro do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM), pôr os hospitais a realizar, de forma regular, simulacros para responder a eventuais situações de catástrofe e criar normas nacionais para actuação em eventos de massas. Estas são algumas das recomendações que resultaram do trabalho da comissão que preparou o plano de contingência do Ministério da Saúde para as comemorações do centenário de Fátima. Um plano que, diz a comissão, pode ser aproveitado para eventos que envolvam grandes aglomerados no futuro, como outras peregrinações no Santuário de Fátima e o Festival Eurovisão da Canção do próximo ano, que se vai realizar em Portugal.

A maior parte do complexo processo correu bem, até porque não houve incidentes de relevo nem a enchente foi tão grande quanto se esperava – previa-se perto de um milhão de peregrinos e terão estado 500 mil pessoas a assistir à missa celebrada no dia 13 de Maio pelo Papa Francisco, segundo as contas do Vaticano. Mas há várias lições a retirar da experiência.

“Houve organização, apoio político, empenho de  recursos humanos muito motivados. Foi também uma oportunidade para actualizar planos de contingência em vários hospitais [foram 10 os envolvidos]. Agora, isto deve ser feito de uma forma regular, não apenas reactiva. Um atentado ou uma catástrofe podem acontecer em qualquer momento. É preciso envolver entidades e articular esforços, a máquina tem que estar permanentemente oleada”, preconiza António Marques, o presidente da Comissão de Gestão do Plano de Contingência do Ministério da Saúde para as Comemorações do Centenário de Fátima.

“É preciso criar uma estrutura para dar continuidade a este projecto, temos que manter acesa esta chama”, defende o médico do Centro Hospitalar Universitário do Porto que esteve envolvido na organização de eventos como o Euro 2004 ou o Mundial de Futebol no Brasil (2014).  

Estabelecendo uma analogia com as equipas da Fórmula 1, o anestesiologista frisa que este "é um trabalho em equipa, em que todo o conjunto perde se alguma das partes não for eficaz". É fulcral, frisa, que as entidades e os profissionais saibam exactamente o que fazer e como fazer no caso de haver um problema grave.

O trabalho, recorda-se no sumário executivo do relatório final a que o PÚBLICO teve acesso, começou muito antes da chegada do Papa Francisco a Fátima, com o apoio aos peregrinos durante o seu trajecto e com a montagem de um enorme dispositivo de socorro — que incluiu um hospital de campanha do INEM com 28 camas e um bloco operatório para situações de life-saving. Foram meses de preparação para esta operação de cinco dias (10 a 14 de Maio), durante os quais  não foram identificados problemas de saúde relevantes.

Apesar de os objectivos propostos terem sido “globalmente cumpridos”, foram detectadas várias “oportunidades de investimento”, desde logo no que se refere à participação do Exército. Embora tenha sido montado um dispositivo de quase cem tendas perto de Condeixa para prestar apoio aos peregrinos — e foram assistidas mais de quatro mil  — não foi possível montar um hospital de campanha como inicialmente se pensara, sublinha-se.

No relatório também merece realce o contributo do Instituto do Turismo, que distribuiu panfletos com recomendações técnicas: "Ficou desde logo registada a relevância de acautelar medidas preventivas com antecedência para outros eventos com risco acrescido face ao importante aglomerado de pessoas (como exemplo, Festival Eurosvisão em 2018)."

Chamando-se a atenção para a necessidade de melhorar a interacção com a Autoridade Nacional de Protecção Civil (ANPC), recomenda-se o reforço dos recursos do INEM, que se debate com “importantes carências em recursos humanos e capacidade (legal) de os remunerar adequadamente face ao trabalho realizado”. "O INEM tem que ter um quadro robusto”, enfatiza António Marques.

Também se destaca no documento a necessidade de estudar o desenvolvimento de novas ferramentas informáticas e de constituir uma reserva estratégica do medicamento que inclua stocks adequados de fármacos, nomeadamente para doenças crónicas (por exemplo insulina), uma vez que a actual reserva apenas está operacionalizada para o antídoto da varíola e para o oseltamivir (antiviral para ser usado em caso de epidemias de gripe).

Realça-se, a propósito, o investimento efectuado pelo Instituto Português do Sangue e Transplantação (IPST), que aproveitou este processo para fazer o levantamento da capacidade instalada e procedeu à revisão dos planos de contingência dos respectivos serviços de sangue e medicina transfusional, em articulação com os hospitais.

Ambulâncias descaracterizadas

Na operação de Fátima, de acordo com o balanço final, estiveram envolvidos cerca de 1400 elementos, 500 dos quais do INEM que, ao longo dos cinco dias, deram resposta a 1539 situações de doença. Houve 395 accionamentos de viaturas de emergência médica e de ambulâncias, 72 pessoas foram transferidas para os hospitais e foi necessário fazer três transportes de helicóptero.

O  vasto dispositivo do INEM — que incluiu dois helicópteros, 10 viaturas médicas de emergência e reanimação (VMER)  e duas viaturas de intervenção em catástrofe —, foi complementado no terreno com os meios e os operacionais de corporações de bombeiros e da ANPC, além dos dispositivos específicos dos Servitas de Nossa Senhora de Fátima e da Cruz Vermelha Portuguesa. Centenas de militares do Exército e da Força Aérea também estavam preparados para dar apoio, em caso de necessidade.

No terreno, foram colocadas estrategicamente ambulâncias de emergência médica descaracterizadas e preparadas para responder em caso de necessidade de socorro a chefes de Estado e outras individualidades, além dos dois helicópteros EH-101 do Exército mobilizados para transportar o Papa e a sua equipa. Meios que, explica António Marques, poderiam ser utilizados no caso de ser necessário evacuar um grande número de pessoas. “Não se pode garantir segurança a 100% mas pode-se reduzir muito o risco", remata.

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