As pessoas consomem drogas. E agora?

Hoje, dia 31 de Março, celebra-se o Dia Internacional do Drug Checking. Por que não adoptar as políticas de análise de substâncias?

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Peter Hershey/Unsplash

Esta é uma questão que certamente atormenta muitos decisores políticos e legisladores. Desde tempos antigos que o ser humano procura e consome substâncias para alterar o seu estado de consciência. Snifa, fuma, engole ou injeta drogas para amplificar, entorpecer ou distorcer os sentidos e alterar disposição, mesmo que isso envolva algum risco para a sua saúde. Diferentes governos tentaram abordagens distintas, umas mais liberais outras mais punitivas, para restringir este tipo de comportamentos. No entanto, há uma franja considerável da sociedade que consome, e irá continuar a consumir, drogas.

Há 16 anos Portugal deu um passo importante na politica de drogas, descriminalizando o consumo e a posse de determinadas quantidades para consumo pessoal. Uma medida que alcançou um enorme reconhecimento internacional e que nos permitiu resolver as elevadas taxas de consumos problemáticos dos anos 90. Hoje em dia as prevalências de consumo de drogas são baixas, quando comparados com os números encontrados em países com políticas repressivas quanto ao consumo, como, por exemplo, a Suécia.

Ainda assim, as drogas continuam populares: num inquérito feito em Portugal no dia da defesa nacional a 70 mil jovens de 18 anos, 31% dos inquiridos referiu já experimentou drogas pelo menos uma vez, sendo que 10% referiram a cannabis, 7% as anfetaminas e 5% a cocaína como substância consumida. Fica a dúvida, onde é que aqueles 30% de jovens inquiridos foram comprar as suas drogas?

A descriminalização das drogas foi uma tentativa, bem-sucedida, de resolver muitos dos problemas relacionados com o mercado da procura, como o acesso à informação e à saúde de quem consome ou o afastamento dos consumidores do sistema judicial. No entanto, os problemas associados ao mercado da oferta, ou seja, à venda de drogas, continuam presentes como se de um regime proibicionista se tratasse.

A produção e a venda de drogas continuam a ser realizadas sem qualquer regulação, sendo o lucro frequentemente a única força motriz dos dealers e a adulteração das drogas com outras substâncias, algumas mais tóxicas que as próprias drogas, muito frequente. Por exemplo, dados de análises a cocaína que circula na Europa indicam que nos últimos anos a adulteração da cocaína ronda os 40-60%, e que com grande frequência é detetada a mistura de outras substâncias como levamisole (um desparasitante que pode provocar doenças do sangue) ou a fenacetina (um analgésico tóxico para os rins).

Regular a produção

Sabendo que 1) as pessoas vão inevitavelmente comprar e consumir drogas, quer com um sistema legislativo mais repressivo quer no mais liberal e que 2) a produção e distribuição de drogas ficam a cargo de pessoas sem conhecimentos (e muitas vezes sem escrúpulos); quais devem ser as medidas a adotar por um Governo que quer proteger os seus cidadãos?

Para nós, sem muitas dúvidas, a regulação da produção e venda de drogas seria o princípio. Não de uma forma despreocupada e liberal, mas sim de forma cuidadosa, sofisticada e com restrições. Contudo, na impossibilidade imediata de vermos implementada esta regulamentação, faz sentido adotar outro tipo de medidas que protejam as pessoas que consomem drogas.

A disponibilização de serviços de análises das drogas (drug checking) aos potenciais consumidores, é uma das respostas sensatas possíveis. Este tipo de serviços, para além de permitir a deteção de adulterantes tóxicos ou letais, possibilita informar os potenciais consumidores sobre riscos, efeitos, doses e trabalhar estratégias de gestão de prazeres e riscos associados ao consumo.

No essencial permite a quem vai consumir, e obrigatoriamente tem que recorrer ao mercado ilegal, tomar uma decisão o mais informada possível sobre o seu consumo. Hoje, dia 31 de Março celebramos o Dia Internacional do Drug Checking, aproveitando para lembrar que os serviços de análise de substâncias, apesar de considerados medidas preventivas essenciais no âmbito das politicas de saúde pública, continuam sem financiamento em Portugal. 

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