Parte dos alunos pode ter de sair da Secundária Alexandre Herculano

Escola no Porto esteve esta quinta-feira sem aulas e alunos devem faltar de novo sexta-feira, por causa dos riscos para a sua segurança.

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No ginásio, só com um toldo é possível evitar a chuva durante as aulas. Nelson Garrido

A chuva que esta quinta-feira regressou ao Porto encheu os baldes espalhados pela Secundária Alexandre Herculano e a paciência de alunos, pais e direcção desta escola no Bonfim que há anos esperam uma intervenção de fundo no edifício centenário, que está extremamente degradado. As aulas foram interrompidas por pressão dos alunos e os responsáveis pelo estabelecimento admitem ser necessário transferir algumas turmas para outras escolas do agrupamento até à execução das obras prometidas desde 2009.

Nesta qinta-feira à noite, o Ministério da Educação informou que, “com o objectivo de acautelar as condições de segurança dos alunos, [hoje] não existirão actividades lectivas na Escola Secundária Alexandre Herculano, as quais serão retomadas na segunda-feira”. Antes, o Ministério da Educação já tinha garantido que os seus serviços estavam “a trabalhar no sentido de encontrar uma solução imediata que garanta a regularização das actividades lectivas”. A direcção do agrupamento reúne-se hoje de manhã com o director regional de Educação, esperando que seja encontrada uma solução provisória para um problema que se arrasta “há demasiado tempo” e que não foi resolvido, apesar da pressão da comunidade escolar e de várias forças políticas.

“O ministério tem de dar uma resposta inequívoca e estabelecer um timing, sob pena de entrarmos numa situação de descrédito”, insistia o director, notando que qualquer solução, passe ela pela instalação de contentores no pátio ou pela transferência de algumas turmas para outra escola do agrupamento, tem de ser adoptada rapidamente pois terá impactos nas actividades lectivas, obrigando, por exemplo, à reorganização de horários.

Neste edifício desenhado pelo arquitecto Marques da Silva e classificado como monumento nacional, a água entra por todos os lados e, ironia, a piscina – sim, leu bem, o projecto original incluiu uma piscina – é dos poucos espaços em condições de funcionamento, numa escola que já não é de elite, como foi há décadas e que acolhe alunos de condição social mais humilde.

“Estamos a oferecer a estas pessoas condições que replicam as desigualdades que já sentem lá fora”, insiste o director, Manuel Lima, repetindo um argumento que tem erguido de cada vez que o Alexandre, como é conhecido, é notícia. E ele tem sido notícia muitas vezes, pelo mesmo motivo. Sem obras de fundo há décadas, a água que já fizera apodrecer madeiras e paredes, que atirara pedaços de tecto ao chão – a “centímetros da cabeça de alunos”, nota – acabaria por voltar a fazer das suas. Foi ontem, primeiro dia chuvoso num inverno frio, mas seco que não tem feito a vida fácil a quem ali trabalha e estuda.

Segundo pais, estudantes e responsáveis pelo estabelecimento, o cenário de alunos enfiados em roupas e socorrendo-se de mantas, para aguentar o frio, já se tornou um hábito. Mariana Pereira, aluna do 12.º ano e presidente da associação de estudantes garante que só não traz um cobertor porque já traz a mochila muito cheia. “Muitos vidros estão partidos, e às vezes é mais frio na sala que no exterior”, afirma a estudante que não estava na escola de manhã, quando os colegas se manifestaram.

Já havia salas onde todas as carteiras eram arrastadas para a esquerda, porque à direita chovia. O toldo que tem um ar de instalação artística, no ginásio, não é de agora.  Mas esta quinta-feira, segundo Paula Nogueira e Fernando Barbosa, da associação de pais, os jovens “cansaram-se de serem obrigados a mudar de sala, por causa da chuva” e exprimiram a revolta. O director confessa que se sentiu um pouco assustado com o ajuntamento nos corredores, mas elogiou o seu “sentido cívico”. “Consegui impor alguma ordem, e convencê-los a voltarem às salas pelo respeito que eles me têm”, garante. Depois de ter ido sala a sala ouvir as queixas, cedeu aos seus argumentos e decidiu mandá-los para casa, avisando a tutela e os pais.  

Na mente de todos está um projecto de 2009, do Atelier 15, de Alexandre Alves Costa e Sérgio Fernandez, que prometia devolver o esplendor a esta obra importante da arquitectura portuguesa e as condições de que a escola precisa urgentemente, recorda o director, que chegou a assinar o contrato de execução da obra, orçada em 15 milhões de euros. Mas a chegada da troika travou a requalificação das escolas que estava a ser levada a cabo pela Parque Escolar e o Alexandre ficou a degradar-se ainda mais, cercado por estabelecimentos reabilitados para onde os alunos têm fugido.

O actual Governo recordava, nesta quinta-feira, que esta secundária está integrada na lista de escolas a reabilitar com fundos do programa Norte 2020 mas justificava a demora no lançamento de um novo concurso com a existência de um "processo de concertação" com a Câmara do Porto, o que o município nega. O executivo liderado por Rui Moreira não aceitou passar a ser o responsável por uma obra – e pelos eventuais riscos orçamentais – num edifício do Estado Central, e insiste ter há muito assumido que está disponível para pagar metade da comparticipação nacional necessária, apesar de nada o obrigar a isso.

O caso levou ontem o PCP a questionar de novo o Governo sobre os planos, e os prazos, para intervenção no Alexandre Herculano. A iniciativa comunista, que repete esforços anteriores do mesmo partido e de outras forças políticas, é mais uma no movimento de pressão para salvar a escola. No ano passado, em Maio, foi lançada a iniciativa "Não deixamos cair o Alexandre", que reuniu quase três mil assinaturas numa petição em defesa da concretização do projecto de reabilitação da escola. 

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