Ele decidiu ser pai aos 20 (para espantar a solidão e o medo)

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"Sempre tive tudo que quis, em miúdo. Fui à Disney World, o Pai Natal trouxe-me sempre aquilo que lhe pedi, mas por alguma razão, nunca foi suficiente. Acho que era uma criança muito solitária. Sou filho único e sempre quis ter um irmão ou irmã com quem pudesse brincar. Essa infância nunca terminou. Cresci e tornei-me cada vez mais fraco, mais patético. Um dia pensei 'vou dar à luz um filho e ele irá ajudar-me a encontrar um rumo'. 'Ele será o mais forte, irá ser um animal feroz que irá romper com todas as profecias de falhanço que determinei para mim.'" Assim foi. Andrew tinha 20 anos no dia em que nasceu o primeiro filho. "Vi a cabeça a sair do ventre e foi magnífico. O cabelo era crespo e rebelde, mesmo coberto de sangue. Fiquei muito orgulhoso." Mas ao contrário do seu desejo, não foi um rapaz que nasceu, mas sim uma menina. "Sempre quis um filho, não uma filha. No início não senti nada. Pensei apenas, 'agora estamos os dois perdidos, somos ambos patéticos e dependentes'." (Este depoimento pode ser ouvido no vídeo feito em 2009 "Daddy's Confession", publicado no website da fotógrafa russa Viktoria Sorochinski, autora do projecto fotográfico "Daddy", que apresenta agora ao P3.) O primeiro momento de viragem, segundo o pai, ocorreu quando Lucy era ainda pequena. "Um dia, ela tentou fugir. Como um lobo. Fiquei impressionado com a força, a coragem... Parecia que ela desafiava a morte. Fazia coisas que outros encarariam como estupidez ou princípio suicida, mas eu via apenas o fogo azul dos seus olhos, via apenas um ser completamente dominante sobre a ideia de morte, rendição ou medo. Foi muito bonito." A fotógrafa Sorochinski descreve Andrew, no seu website, como "um jovem confuso que decidiu ter um filho aos 20 anos de idade". Em entrevista ao P3, explica: "o jovem pai estava a atravessar uma fase de conflito interno". "O seu desejo de ter um filho tranformou-se numa realidade inesperada, a de ter uma filha. Ao mesmo tempo que tinha de lidar com as suas memórias de infância e com a relação conturbada com o seu pai — ao mesmo tempo que se sentia fraco e com medo —, sentia a pressão de ter de ser um modelo para a filha. O monólogo que partilha no vídeo é baseado em sentimentos reais, mas é também um pouco ficcionado (como, aliás, é todo o projecto). Da última vez que vi Andrew, ele disse-me que não estava seguro das coisas que tinha dito, que não sabia se eram reais. Na minha opinião, ele cresceu com a sua filha e os seus sentimentos em relação a ela mudaram, evoluiram. Hoje em dia, acho que ele é um dos pais mais carinhosos e responsáveis que alguma vez conheci. Ele quer que Lucy viva a sua vida de forma o mais significante possível e que tenha consciência das coisas que diz, faz e das opções que toma. Esta é a sua principal preocupação. Abdicou da própria vida e carreira para poder acompanhar o crescimento da filha e eu, enquanto artista, quis enfatizar isso. Numa das vezes que falámos, ele confessou-me que este projecto tem um grande significado para si por ser um testemunho de todo o tempo e esforço que dedicou à relação. No momento em que ela estiver crescida e ele puder centrar-se nas suas necessidades e aspirações profissionais, o projecto irá lembrá-lo dos tempos maravilhosos que passaram juntos." A imaturidade revelou-se um factor preponderante na relação que se estabeleceu entre eles. "Quando eu os vejo juntos, vejo dois amigos, talvez irmãos. Acho que essa sensação advém do facto de ele ser um pai ainda muito jovem e de continuar à procura de si mesmo. Ele, no fundo, cresce em conjunto com ela." Viktoria tem, hoje em dia, dificuldade em definir a sua relação com os dois retratados. Não se vêem com muita frequência, mas crê que existe uma ligação forte entre eles, "talvez kármica". "Sempre que nos vemos, parece que sempre estivemos em contacto e continuamos a ser capazes de falar sobre assuntos pessoais. A maior parte das vezes, claro, sou eu quem escuta..." Antes de "Daddy", Viktoria desenvolveu o projecto "Anna&Eve", centrado no laço entre mãe e filha, e acredita que talvez exista um propósito superior, que desconhece, que a liga a estas famílias. "Ainda estou a tentar perceber o motivo por que nos cruzámos."