Governo aconselhado a assumir conta dos lesados do BES no défice

Responsável pelo estudo pedido pelo Governo diz que são poucas as hipóteses de a solução não contar para as contas do Estado. Riscos aumentam se o veículo a criar não ficar na dependência da CMVM ou do BdP.

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Jornal Publico

Se o veículo a criar não ficar na dependência da CMVM ou do BdP, aumentam riscos para o Estado. Apesar das garantias de António Costa, directa ou indirectamente a factura dos lesados do BES chegará aos contribuintes. O estudo da Universidade Católica sobre o impacto da medida conclui que muito dificilmente a solução encontrada não vai ao défice e, ainda, que seria mais “prudente” o Governo assumir esse impacto à partida.

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Se o veículo a criar não ficar na dependência da CMVM ou do BdP, aumentam riscos para o Estado. Apesar das garantias de António Costa, directa ou indirectamente a factura dos lesados do BES chegará aos contribuintes. O estudo da Universidade Católica sobre o impacto da medida conclui que muito dificilmente a solução encontrada não vai ao défice e, ainda, que seria mais “prudente” o Governo assumir esse impacto à partida.

Em declarações ao PÚBLICO, Ricardo Ferreira Reis, que coordenou o trabalho no Centro de Estudos Aplicados da Universidade, disse que “a impressão que o estudo deixa é que vai ser difícil esta solução escapar totalmente ao défice e mais vale que o valor seja logo assumido, transparente, prudente e respeitando a convenção da substância sobre a forma”.  

Mesmo assim, assinala uma vantagem neste modelo encontrado pelo grupo de trabalho: “Se a alternativa fosse deixar correr os processos em tribunal, “todos os valores que o Estado viesse a ser obrigado a pagar iam ao défice”, refere o coordenador do estudo.

Ricardo Reis explica que o estudo realizado teve como pressuposto a criação de um veículo, que assumirá os créditos dos lesados, contraindo uma dívida bancária para pagar aos clientes, “com uma garantia do Estado (de que a dívida seria paga) e essa garantia teria uma contragarantia do Fundo de Resolução [seria o último responsável pela dívida de 286 milhões de pagar aos clientes], que protegeria os contribuintes”. E a conclusão foi a de que, “se o veículo estiver no perímetro de consolidação do Estado (e definimos um conjunto de condições para estar), então logo que contrai a dívida ficará no défice. Se o veículo estiver fora do perímetro de consolidação do Estado então a garantia podia ficar fora do défice”. Mas ainda assim, salienta o responsável da Católica, “se o Eurostat entender que a garantia tem uma grande probabilidade de ser accionada, então pode discricionariamente determinar que se trata mais uma promessa de pagamento do que uma garantia e determinar a sua entrada em défice”. E há um precedente nesta matéria, em que o Eurostat obrigou à inclusão no défice (em 2011) do risco assumido pelo Estado em relação às auto-estradas sem portagens, conhecidas por Scuts.

Risco acrescido se não for a défice

Na prática, a solução só anularia o impacto no défice se o veículo a criar conseguisse recuperar mais do que os empréstimos à banca para pagar aos lesados, e as despesas de funcionamento, o que está longe de estar garantido, dada a quantidade e complexidade dos processos em curso nos tribunais, avançados por clientes particulares e por grandes investidores institucionais.

Ao contrário do pessimismo que está subjacente à solução encontrada ­– se existissem fundadas garantidas de cobrança dos créditos não seria necessário antecipar o valor e envolver o Estado – António Costa continua a defender que não serão os cofres públicos a pagar o que que não vier a ser recuperado. "A probabilidade de ser accionada a garantia é uma probabilidade diminuta e, por isso, o risco diminuto de que alguma vez isso possa vir a ser suportado pelos cofres públicos", afirmou o primeiro-ministro na Assembleia esta quinta-feira, considerando que essa responsabilidade será do Fundo de Resolução, ou seja, dos bancos.

O Fundo de Resolução está na esfera do Estado e está a ser financiado através de um “imposto” cobrado aos bancos, incluindo à pública Caixa Geral de Depósitos. E as perdas a suportar pelo Fundo do Fundo podem ser elevadas, uma vez que a venda do Novo Banco pode não cobrir o montante injectado na resolução do BES, a que acrescerão outras responsabilidades decorrentes dos processos judiciais em curso, e não se sabe quem pagará essa factura. Os bancos foram arrastados à força para o Fundo de Resolução e o próprio Banco Central Europeu pode ter uma palavra a dizer sobre mais esse encargo (a contragarantia).

O impacto apenas em défice (e não à dívida) não implica custos directos para os contribuintes, mas vai condicionar a gestão das contas públicas, o que não deixa de prejudicar os contribuintes.

O risco de tentar encontrar soluções que “escondam” o impacto no défice e na dívida por incorporar mais risco. Ou seja, se o veículo a criar não ficar na dependência da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) ou do Banco de Portugal (BdP), como tudo indica que ficará, o Estado perde o controlo sobre a recuperação dos créditos dos clientes e o risco em que incorre é maior. Por outro lado, se o Estado prestar uma garantia a uma entidade privada é imediatamente considerada ajuda de Estado e o Eurostat não deixará passar. O PÚBLICO apurou que o veículo ou fundo será criado na esfera de uma das duas entidades que estão na esfera do Estado e que está excluída a possibilidade de ficar na dependência do Fundo de Resolução.

O papel comercial foi emitido pelas empresas do Grupo Espírito Santo (ESI e Rioforte) e vendido pelo BES. No âmbito do acordo alcançado os cerca de dois mil clientes recuperarão 75% do capital investido com um máximo de 250.000 euros para as aplicações até 500.000 euros e de 50% para as aplicações acima deste valor. Depois de dois anos de negociações,  dos perto de 500 milhões de euros serão pagos 286 milhões.