A operação PISA

É por completa ignorância do que são os testes PISA que dos seus resultados se tiram conclusões sobre a melhoria da escola e da preparação dos alunos.

Assistimos nas duas últimas semanas a uma aberrante aliança entre os que criticam a ideologia da avaliação e os que entendem que a escola e os alunos devem ser continuamente submetidos a uma “monitorização” como factor de exigência. Ambos os sectores se regozijaram com o sucesso obtido pelos alunos portugueses nos testes PISA e, por conseguinte, com o ranking de Portugal no universo dos países da OCDE. Uma paz duradoura teria unido os dois campos se não fosse uma divergência quanto à atribuição dos méritos e a reivindicação dos louros pelas instâncias ministeriais. O prémio maior coube aos professores (mais até do que aos alunos), pois à partida ninguém dava nada por eles. Não é fácil ser professor quando a escola é a instituição mais sacrificada pelos poderes que se legitimam pelos critérios da “opinião” e já não tem validade a regra que diz: “a família educa e a escola instrui”.

Os dois campos não se aliaram apenas num comum regozijo. Aliaram-se também na difusão de uma ideia fraudulenta do que são os testes PISA (acrónimo de Program for International Student Assessment). Eles não avaliam a aquisição de conhecimentos fixados pelos programas escolares, mas as competências ou atitudes entendidas como necessárias para uma vida adulta autónoma, para resolver os problemas da “vida real” e da “vida futura”. É verdade que os testes não são estranhos aos objectivos fundamentais dos sistemas de ensino (e, nesse sentido, têm um valor indicativo) mas não se referem a um “corpus” de conhecimentos que fazem parte dos programas escolares. São testes que medem “competências gerais” (por exemplo, pede-se ao aluno que descubra as regras do funcionamento de um novo aparelho de ar condicionado cujo manual de instruções se perdeu), ou seja, o grau de literacia em três domínios: a leitura, as ciências e a matemática. “Literacia” e “competência” são palavras-chave do idioma PISA. Não se trata de saber a matemática dos programas escolares, mas de ter um certo grau de literacia na “cultura matemática”; também não se trata de saber ler os textos que geralmente parecem nos manuais escolares, mas de saber preencher formulários e lidar com documentos oficiais. Aos 15 anos, um aluno terá aprendido na escola que ler não é apenas decifrar e que a compreensão de um texto (sobretudo de um texto literário), implica uma série de operações complexas. Ora, nada disto importa à literacia testada pelos exercícios PISA. Miserável e incompetente seria a escola que transpusesse para os seus métodos e os seus programas o que é requerido pelo PISA. Uma das críticas mais insistentes a estes testes (sim, eles são muito criticados, ainda que por cá só suscitem um respeito venerando) é o facto de colocarem questões bizarras sobre situações irreais; e de avaliarem saberes, aquisições e comportamentos estritamente miméticos; e de estarem obcecados com a “literacia” e as “competências” enquanto ferramentas para a vida pragmática e para a integração nos mercados (sim, porque estes testes não são nada neutros). Mas também são criticados por isto: as “performances” dos alunos testados variam consoante eles foram mais ou menos treinados pelos professores para superar as manhas e os truques dos testes e evitar as armadilhas. De tal modo que uma das críticas mais frequentes é a de que eles não medem o que pretendem medir.

Os testes PISA são uma espécie de rendimento intelectual mínimo para pobres escolarizados. Pobre da escola, pobres dos alunos, pobres dos professores, quando legitimados por um capital que, embora não devam negligenciar, é de fraco rendimento e perigoso como orientação. 

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