Épicos olímpicos

Os rankings colaboram com o espectáculo desportivo: dão-nos uma falsa segurança para mais bem sermos surpreendidos.

Como é que vão ser os Agostos sem Jogos Olímpicos? Mal começámos a vê-los, ficámos viciados. Também é bom ver o Rio de Janeiro em directo: até os automóveis a passar ao longe são bonitos.

Todos os dias há heroínas e heróis. A ginasta Simone Biles conta, com o corpo, histórias impossíveis, sonhos de voar, chamadas à terra, gozos, desafios, danças contra a realidade. A música e as palavras ficam com medo quando a vêem, pela maneira enfática e triunfal como ela mostra não precisar delas. Se Samuel Beckett fosse vivo decerto escreveria uma peça sem palavras, só para ela. Verdade se diga, ela não precisa dele para nada.

Na terça-feira à noite o herói foi Park Sangyoung, o esgrimista da Coreia do Sul que conquistou a medalha de ouro de espada. Com 20 anos de idade e 21.º no ranking mundial despachou 15-9 um emproado suíço-alemão, Benjamin Steffen. O treinador de Steffen, visivelmente desiludido, gritava, como só um suiço-alemão é capaz, “Pas d’émotion! Pas d’émotion!”

Cheio de emoção, Park Sangyoung, o atirador mais novo da competição conseguiu vencer o mais velho, o húngaro Geza Imre. Estava a perder 14-9 e conseguiu recuperar até ficar 14-14. Depois deu o golpe da vitória, vencendo 15-14. Foi épico. Ninguém estava à espera de tal campeão, excepto o campeão, que não estava à espera de mais nada, como se viu.

Os rankings, afinal, colaboram com o espectáculo desportivo: dão-nos uma falsa segurança para mais bem sermos surpreendidos. E levantados da complacência.

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