Um adolescente com uma pistola na mão

Com apenas 17 anos, Rafael Lacayo Paladino nem tem idade legal para uso e porte de arma. Mas, dois anos e meio depois de começar a praticar a modalidade, representou a Nicarágua no tiro.

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Rafael Paladino foi o porta-estandarte da Nicarágua na cerimónia de abertura dos Jogos Stoyan Nenov/Reuters

Será a última das coisas que os pais querem ver nas mãos dos filhos: uma arma. Mas Rafael Lacayo Paladino sempre contou com o apoio da família e amigos desde que, há relativamente pouco tempo, começou a praticar a modalidade que o levou aos Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro. Com apenas 17 anos, o jovem representou a Nicarágua nas provas de tiro. Ficou longe dos lugares que deram acesso à discussão das medalhas, mas no final não escondia o orgulho por ter estado a competir com alguns dos melhores do mundo. Muitos deles tinham idade para ser (pelo menos) pais de Rafael.

A idade não é um obstáculo no tiro desportivo, e disso é bom exemplo o português João Costa, que aos 51 anos cumpre no Rio 2016 a quinta participação olímpica. O franzino nicaraguense, com o seu cabelo penteado com gel, é um exemplo da situação oposta — mas a juventude não condicionou em nada Lacayo Paladino. “Sinto-me tranquilo. Sou o sangue novo, como costuma dizer-se”, declarou ao PÚBLICO, com a sua voz tímida, após a qualificação na prova de pistola de ar comprimido a dez metros, em que foi 39.º, com 569 pontos. “Foi uma experiência muito emocionante. Competir com os melhores do mundo é uma experiência fantástica, fiquei feliz por estar aqui. Foi uma honra estar ao lado deles”, acrescentou.

Natural de Ticuantepe, perto da capital Manágua, Rafael Lacayo Paladino teve uma ascensão fulgurante no tiro. “Comecei a praticar a modalidade há dois anos e meio. É pouco tempo”, reconheceu o atirador, que, antes de partir para o Brasil, recebeu a bandeira nacional das mãos do presidente Daniel Ortega. O jovem foi escolhido como porta-estandarte da Nicarágua na cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos, tendo liderado a comitiva no desfile em pleno Maracanã.

A qualificação para o Rio 2016 foi obtida nos Jogos Pan-americanos de 2015, em Toronto. O 12.º lugar na prova de pistola de ar comprimido a 10 metros foi suficiente para garantir a presença nos Jogos Olímpicos. Para trás ficava um percurso recheado de dificuldades, em que chegou a ter de abdicar de participar em torneios de apuramento por causa dos custos que isso implicava — a federação nicaraguense de tiro não tinha orçamento disponível para apoiá-lo.

“Comecei a praticar tiro por pura curiosidade. Ao início, o que me atraía mais era a arma. A cor, o estilo... Com o passar do tempo comecei a interessar-me mais e a ganhar respeito pela disciplina e pelos valores desta modalidade. Graças aos meus amigos, continuei e cheguei até aqui”, sublinhou Lacayo Paladino.

Tudo começou com uma experiência na escola e, ultrapassada a estranheza inicial, o jovem nicaraguense mostrou dotes que lhe renderam uma alcunha: “El halcón” (o falcão). A comparação com a ave de rapina justifica-se pela concentração e sentidos apurados indispensáveis ao tiro. “É preciso ter a cabeça vazia, em branco. Só posso pensar naquilo que tenho de fazer naquele momento, em ter uma boa técnica, sabendo que isso é o caminho para um bom resultado”, explicou.

Conciliar a prática do tiro com os estudos não é simples, mas por enquanto Rafael Lacayo Paladino vai conseguindo fazê-lo. “Treino seis dias por semana, duas vezes ao dia. Umas três ou quatro horas. Nos treinos procuro adquirir a condição que me permita estar bem. Trabalho a confiança em mim próprio e também a mentalização daquilo que tenho de fazer”, disse na conversa com o PÚBLICO.

No futuro, confessou, gostava de enveredar por uma carreira ligada à engenharia. “Ainda estou na escola secundária. Quero terminar e depois continuar a estudar na área da engenharia. Gosto de soluções tecnológicas que ajudem a facilitar a vida às pessoas”, concluiu. Pontaria não lhe falta para acertar nos objectivos.

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