O "avozinho" que estabeleceu um recorde do pós-Guerra

Ángel Vicioso regressou à Volta a França mais de uma década depois da sua última participação.

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Vincent West/Reuters

Na edição de todos os recordes, há um que tem passado despercebido. Ainda a caravana não tinha partido do Mont-Saint-Michel e já Ángel Vicioso tinha entrado na história da Volta a França, ao tornar-se no primeiro corredor desde a II Guerra Mundial a regressar à prova após dez anos de ausência. Onze anos depois da sua última participação, o quase quarentão da Katusha voltou à sua corrida maldita pela porta grande e apagou do livro dos recordes o nome de Robert Ducard, que tardou nove anos (entre 1952 e 1962) a merecer novo chamamento para a "Grande Boucle".

“Pode-se dizer que estou a viver uma segunda juventude”, confessou, visivelmente feliz, antes do "Grand Départ". Mas Vicioso nem sempre pensou assim, por "culpa" das más experiências que viveu nas três participações anteriores. “Em 2003, fracturei o cúbito e o rádio; em 2004, abandonei com problemas no joelho; em 2005, consegui acabar na 64.ª posição, sofrendo mais do que o aceitável. Jurei que não voltaria, porque passei francamente mal”. 

Não foi, no entanto, a promessa que fez a quente que o manteve afastado quase ad eternum da Volta a França, mas sim o passado salpicado por "casos" de doping. Apanhado no turbilhão da Operación Puerto (2006), o aragonês não teve a sorte de outros e foi relegado para as divisões inferiores da modalidade. Profissional desde 1999, Vicioso passou por todas as grandes equipas do ciclismo espanhol (Kelme, Once e Liberty Seguros), antes de vir parar à portuguesa LA-MSS.

O salto para o outro lado da fronteira, que lhe proporcionou o triunfo na Volta às Astúrias (2008), não o libertou da sina do doping, antes pelo contrário. A LA-MSS acabou com estrondo, quando uma investigação conjunta da Polícia Judiciária e do Conselho Nacional Antidopagem (CNAD) desmantelou um esquema de dopagem organizado. Outra vez no desemprego, encontrou um lugar na Andalucia-Cajasur, por onde ficou até 2011, quando decidiu mudar-se para a Androni Giocattoli. Foi na formação italiana que o já veterano espanhol comprou o bilhete de regresso à elite, carimbado com um triunfo na segunda etapa do Giro, a mais importante das 14 vitórias que constituem o seu currículo.

Nas cinco temporadas na Katusha, Vicioso enfrentou novos problemas relacionados com doping (em 2013, esteve suspenso provisoriamente pela equipa por ter mentido para faltar a uma sessão do julgamento da Operación Puerto), mas transformou-se na sombra de Joaquim Rodríguez. “Vivo e treino com ele em Andorra”. Pela amizade que os une, "Purito" quis tê-lo ao seu lado nesta Volta a França (a sua última, segundo se soube no dia de descanso) e o ciclista com cara de "avozinho" respondeu ao chamamento, sagrando-se vice-campeão espanhol de fundo.

“Parece que o tempo não passa por mim, mas tenho 39 anos. Estar no Tour já é um prémio”, sublinhou. Satisfeito com o regresso à prova-rainha do ciclismo, o corredor da Katusha nem quer pensar em ganhar etapas. “Os tipos vão muito rápido. É a prova por excelência e a exigência é brutal. Ainda assim, não posso descartar entrar numa fuga e provocar surpresa. Nada é impossível nesta vida”. 

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