A Academia Britânica de Artes Cinematográficas e Televisivas (BAFTA, na sigla original) entregou domingo à noite os seus prémios dedicados à televisão e, sem surpresas, Wolf Hall e a BBC que a exibe foram os grandes vencedores da noite marcada pelos discursos a defender a independência do canal público britânico. Na produção estrangeira, Transparent foi a escolhida.

Numa cerimónia que decorreu no Royal Festival Hall em Londres, os BAFTA dedicados à televisão e rádio foram marcados por vários discursos de agradecimento que derivaram em defesas da BBC – esta semana será conhecido um documento do Governo britânico sobre o destino da estação pública que poderá revelar mudanças que condicionem a sua independência.

“Penso que a maior parte das pessoas concorda que a principal função da BBC é contar a verdade sobre os poderes instituídos, noticiar sem medo ou favorecimentos independentemente de quão desagradável isso possa ser para quem está no governo. É um canal público independente do governo, não um canal estatal… como fazem naqueles bastiões da democracia, a Rússia ou a Coreia do Norte”, disse o realizador de Wolf Hall, Peter Kosminsky, quando subiu ao palco para receber o prémio de melhor série dramática. Wolf Hall, baseada nos dois livros de Hillary Mantel (o homónimo Wolf Hall e Bring up the Bodies - O Livro Negro) sobre Thomas Cromwell e a corte de Henrique VIII e transmitida pela BBC2, competia com Humans (AMC/Channel 4), The Last Panthers (Canal+, Sky Atlantic) e No Offence (Channel 4).

A série, premiada nos Globos de Ouro deste ano e com oito nomeações para os Emmy de 2015), obteve também o prémio de melhor actor, entregue a Mark Rylance (duplamente premiado pela Academia britânica este ano, já que venceu também o BAFTA de melhor actor secundário por A Ponte dos Espiões, de Spielberg; viria também a receber o Óscar na mesma categoria), numa noite em que a melhor mini-série foi This is England '90 (Channel 4). Transparent, série original da Amazon sobre a transição de género de Maura Pfefferman, bateu The Good Wife, do canal generalista CBS, Narcos, do Netflix, e a série policial francesa Spiral do canal premium Canal Plus na categoria de série internacional.

A melhor actriz foi Suranne Jones, pelo seu papel em Doctor Foster, também da BBC, e o canal público venceu ainda pela sua longuíssima novela EastEnders.

Vários discursos da noite versaram então um dos temas do sector nas últimas semanas e, em particular, o Secretário da Cultura, John Whittingdale, que deve apresentar o seu relatório sobre a forma como a BBC será gerida em termos de conteúdos editoriais e de programação. Antevê-se que o documento divulgado na quinta-feira apresente algumas das propostas de mudança mais profundas de sempre para a vetusta estação pública. "Toda a gente nesta sala pode fazer o que faz por causa da BBC", lembrou domingo à noite James Nesbitt. "Não nos roubem isso". "Ai de qualquer governo ou empresa que tente interpor-se entre o povo britânico e o seu amor por uma boa piada, uma história verdadeira, uma boa música, um facto, uma ficção, bom comentário desportivo, jornalistas que conseguem manter-se firmes enquanto contam histórias de tragédias em Paris, pessoas que sabem cozinhar, fazer bolos", enumerou Mark Rylance. "Somos um país de contadores de histórias", prosseguiu, desejando "longa vida" a essa característica".

Segundo a imprensa britânica, constarão no relatório alterações definidas governamentalmente sobre a gestão de programas e audiências em horário nobre – na sequência de queixas do canal privado ITV quanto à exibição de sucessos de audiências nos horários mais vistos como forma de concorrência – ou dos horários dos noticiários. Em causa estará ainda a publicação detalhada dos salários das suas estrelas ou a redistribuição de parte do seu orçamento para produção de programação definida pelos legisladores.