Cartas à Directora
Bataclan
Era disto mesmo que os refugiados estavam a precisar. Nada melhor que esta tragédia parisiense para incendiar os ânimos dos muitos que não conseguem distinguir entre gente normal, por acaso muçulmana, e extremistas sanguinariamente loucos, que até podem ser noruegueses (lembram-se do Anders Behring Breivik?) mas que, por razões geopolíticas óbvias, nestes últimos tempos, costumam ser de inspiração oriunda do médio-oriente. Fico à espera, e nem sequer preciso de me sentar, das doutas emanações cranianas de não sei quantos “especialistas” que, sem dúvidas metafísicas, apontarão o dedo acusador a todos os muçulmanos, sobretudo os mais frágeis, como são os refugiados. Nas imagens que vou vendo destes, encontro muitas e muitas crianças parecidas com os meus netos, a par de outros, mais velhos, que se pareceriam com os meus pais se estes ainda fossem vivos. Uns e outros de aparência totalmente indefesa. Em paralelo com estes “especialistas”, teremos de “aturar” gente com mais responsabilidades, designamente governantes, sejam polacos, húngaros ou eslovacos, a aproveitarem seraficamente a tragédia para levarem a água ao seu moinho ideológico. Em França, para já o país mais ferido, teremos brevemente uma extrema-direita eleitoral a clamar: “nós não tínhamos avisado?”. Os muçulmanos de todo o mundo, gente pacífica e moderada na sua esmagadora maioria, têm um papel urgente a desempenhar, e que não se pode limitar a manifestações de rua em que gritem o seu repúdio pelos inqualificáveis crimes cometidos, mas provar inequivocamente, por todos os meios possíveis, que Islão não é terrorismo. Mesmo que muitos não os queiram ouvir, não estão dispensados dessa ingente tarefa. Para bem de todos nós.
José A. Rodrigues, Vila Nova de Gaia
Amar mais a vida
Escrevo para manifestar a minha tristeza, a minha indignação - recordo Indignai-vos do francês Stéphane Hessel , publicado em 2011 - e preocupação face aos últimos acontecimentos bárbaros em Paris.
Claro que temos medo. Tal como escreveu hoje Miguel Esteves Cardoso, "o medo é a única coisa que podemos ter", mas que não nos pode destruir.
Algumas páginas atrás, Jorge Almeida Fernandes (J.A.F.) intitulou a sua crónica de «O medo e o resto» e definiu-o como "uma das mais poderosas paixões" e disse "temos medo do terrorismo". E citou as palavras terríveis de Bin Laden: «Nós temos jovens que amam a morte mais do que vós amais a vida.»
Não consigo compreender como em menos de um ano a França volta a ser vítima do terrorismo, ela que tem a maior comunidade muçulmana na Europa, 5 milhões de pessoas e é (por isso?) o país mais exposto ao terrorismo da «segunda geração», como escreveu o jornalista do Público.
Este assunto colocou para segundo plano a crise política em Portugal. Na primeira página da edição de hoje do Público, uma foto da Torre de Belém a 3 cores com a pergunta dos franceses "Em nome de quê?"; no editorial, a pergunta do Público: "Que Europa sobreviverá a Paris?". O terror em Paris teve destaque até à página 21. E apenas na página 26, a referência direta a esta "grave crise política" pela mão de Manuel Carvalho.
Não, não estou a criticar a opção editorial do PÚBLICO.
A segurança, a paz e a vida das pessoas tem que ser a nossa maior preocupação e deve secundarizar tudo, suspender a política e seus jogos (a campanha eleitoral para as eleições regionais foi suspensa em França). Tudo se encerra, fecham-se portas, tudo se silencia. Podemos adiar a política por algumas horas e dias quando o que importa é cuidar uns dos outros, pensar nos outros. Foi bonito de ver as filas de gente disposta a dar sangue para fazer face às necessidades após os atentados (os centros de doação de sangue de Paris entraram ontem em "colapso").
A Europa reza pelas vítimas de 13 de Novembro ...
Como disse alguém, "Terrorismo deixou de ser uma coisa do outro, passou a ser uma coisa minha".
Para finalizar, e voltando de novo ao texto de J.A.F., temos também medo "das medidas que se tomam contra o terrorismo".
Temos, nós europeus, ocidentais, que amar ainda mais a vida para nos tornar-nos mais fortes que eles!!
Céu Mota, Sta Maria da Feira