No country for old women

Quando, em Junho de 2014, preparávamos no Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida (CNECV) o parecer sobre as vulnerabilidades das pessoas idosas, não esperávamos descobrir grandes novidades.

Era conhecida por todos a mudança na estrutura das sociedades em termos de idade e o facto de a preocupação sentida com o envelhecimento progressivo da população, sobretudo nos países europeus, não ser acompanhada pela valorização da ancianidade, totalmente arredada pela “cultura da juventude”. Além disso, havia a consciência de que a crise económica e a incapacidade de reverter os défices orçamentais tinham reduzido a abordagem desta fase da vida de uma pessoa à perceção de que é um encargo, um problema social a que é preciso dar solução prestando-lhe assistência. Queríamos contribuir para inverter esta perceção negativa injusta, distorcida e estigmatizante das pessoas com idade avançada, para prevenir a ameaça pressentida de conflito e de rutura intergeracional, promovendo uma mudança cultural. Era urgente reflectir sobre as vulnerabilidades em função da idade, chamando a atenção da sociedade para o cuidado dos seus membros mais idosos e sua relevância no plano da coesão e da cooperação intergeracional.

Foram-nos relatados novos perfis de vulnerabilidade associados à idade e apercebemo-nos da particular discriminação de género associada à discriminação em função da idade. Aceito os fundamentos antropológicos e bio-psico-afectivo-emocionais da diferença entre o homem e a mulher e da sua complementaridade, pelo que utilizo aqui a designação de “género” para indicar os elementos socio-culturais de diferenciação, ou seja, daqueles aspetos com origem cultural, histórica, geográfica ou social, relativos à distribuição de tarefas e de papéis, muitas vezes inerentes às estruturas de poder, e que influem na situação das mulheres, explicando a desigualdade e as injustiças.

A esperança média de vida passou de 68,5-65,3 para os homens e 71,5 para as mulheres em 1972 para 80 anos — 76,9 para os homens e 82,8 para as mulheres — em 2012. Igualmente relevante é o indicador “esperança média de vida saudável”, que é de 60,7 anos para os homens e de 58,7 anos para as mulheres. O cruzamento destes dois dados aponta para um período de vida expectavelmente “não saudável” de 11 anos para os homens e de 22 anos para as mulheres. Saliente-se ainda que é também nas mulheres que se verificam indicadores de saúde mais graves. A partir de determinada faixa etária, a situação de vulnerabilidade das mulheres agudiza-se. Em primeiro lugar, porque o número de mulheres idosas é superior ao dos homens; depois, pela realidade inegável da feminização da pobreza; mas a revelação mais extraordinária foi a da persistência de representações sociais em que as mulheres são as principais cuidadoras, portanto... devem cuidar de si próprias.

A verdade é que as mulheres continuam a ser as principais cuidadoras... É trágico saber que, depois de terem cuidado dos filhos, dos pais, do cônjuge, dos sogros, dos irmãos, dos netos e, às vezes, dos bisnetos, neste país ainda se espera que cada mulher acabe os seus dias a cuidar de si própria...

Docente da Escola de Direito da Universidade Católica Portuguesa, no Porto

A autora escreve segundo a regras do novo Acordo Ortográfico
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