Alandroal gastou 607 mil euros numa biblioteca que nunca foi concluída

A obra iniciada em 2005 estava quase concluída em 2007 mas a falência do empreiteiro suspendeu a construção. Agora o município está obrigado a devolver 370 mil euros, uma verba de que não dispõe.

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Edifício estava em fase final de conclusão, mas as obras pararam DR

O novo edifício da biblioteca municipal de Alandroal, programado para integrar a Rede Nacional de Bibliotecas Públicas, está praticamente concluído mas já apresenta evidentes sinais de degradação nas suas instalações e equipamentos. “A situação que temos é muito desoladora”, lamenta a presidente da Câmara, Mariana Chilra, explicando que os trabalhos estão parados desde 2007 após a falência do empreiteiro.

Quando assumiu funções, em 2013, a autarca deparou-se com um edifício em fase final de conclusão mas que já apresentava os “tectos falsos a cair aos bocados”, as redes eléctrica, de água e esgotos “danificadas” e as tubagens do sistema de ar condicionado “entupidas com ninhos de pássaros”. A recuperação destes equipamentos “vai exigir um tratamento volumoso em termos de custos”, antecipa Mariana Chilra, frisando que “a disponibilidade financeira que o município dispõe para fazer face à sua gestão normal situa-se nos 96 mil euros mensais”, o que torna inviável assumir mais este encargo.

Mariana Chilra salienta o excesso de endividamento no ano de 2010 e o incumprimento dos pagamentos em atraso relativo aos anos de 2011 e 2012.

Neste cenário de dificuldades financeiras, a autarca soma uma dívida de quase 370 mil euros à Comissão Coordenadora de Desenvolvimento Regional (CCDR) do Alentejo. A autarquia recebeu este montante do III Quadro Comunitário de Apoio para a construção da biblioteca. "Como a obra não ficou concluída até 31 de Dezembro de 2013 somos forçados a devolver o dinheiro que não temos”, assume a autarca.

Mariana Chilra disse ao PÚBLICO que já reuniu com a CCDR Alentejo a quem propôs o pagamento faseado dos cerca de 370 mil euros, em 84 prestações mensais, para sair “de uma situação de incumprimento e apresentar uma nova candidatura que permita concluir a obra”, mas ainda não recebeu resposta à solução apresentada.

O contencioso que está a ser dirimido com a CCDR estende-se à Direcção-Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas (DGLAB) que disponibilizou uma verba de 240 mil euros para o projecto do Alandroal. A autarca critica o comportamento da anterior gestão municipal por ter “descurado” as obrigações a que estava sujeita por força da candidatura que tinha apresentado à DGLAB para a construção da biblioteca.

Na consulta que o PÚBLICO fez à acta da reunião ordinária da Assembleia Municipal de Alandroal de 4 de Setembro de 2010, João Grilo, o presidente da câmara então em funções, explicou que quando assumiu funções em 2009 “já se tinha perdido o financiamento para concluir a obra e, ao mesmo tempo, estavam a pedir a devolução do dinheiro que já tinha sido investido ”.

"Assim, teríamos que arranjar um milhão de euros para acabar os trabalhos”, realçou João Grilo, garantindo que procurou negociar com as “entidades competentes” uma solução de financiamento que permitisse terminar o projecto. Como não foi possível superar o impasse a autarquia recusou-se "sempre a assinar qualquer acordo de devolução do dinheiro”, assumiu o então presidente da câmara, comprometendo-se a “arranjar forma de concluir a obra”, o que não foi conseguido.

Mariana Chilra adianta que o teor das informações entretanto facultadas pela DGLAB revelam que este organismo efectuou vários contactos com a câmara do Alandroal para que fornecesse elementos sobre o estado da obra. “Durante quatro anos, o anterior executivo nem sequer se dignou informar que os trabalhos estavam parados”, acusa. “Só com a nossa entrada em funções" é que os contactos foram retomados, refere a autarca, preocupada com a decisão que o Ministério das Finanças possa vir a tomar sobre a proposta apresentada pela DGLAB, onde se põe a hipótese de um alargamento do prazo para cumprimento do programa até 2016.

Se esta solução não for aprovada “é completamente inviável” concluir as obras da biblioteca onde já foram investidos, pelas contas da autarca, cerca de 607 mil euros. “E, provavelmente durante muitos anos, o Alandroal não vai ter a sua biblioteca”, admite a autarca, inconformada com “a morte de um sonho antes mesmo de se tornar realidade”.

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