Passos sem noção da realidade

Só um político sem caráter pode dizer aos cidadãos que o elegeram que os culpados pela crise são eles próprios, uma vez que não souberam resistir à tentação de aspirar a uma vida melhor.

Passos Coelho diz que o crescimento financiado teve consequências severas nas políticas de apoio social e que essa opção é responsável pela redução dos padrões de bem-estar social dos portugueses!

É forçoso dizer que Passos e os seus correligionários foram mais troikistas que a troika e, desse modo, levaram o país a uma recessão profunda e de consequências dramáticas e dilatadas.

A sua moção assume a desculpabilização pelos sacrifícios impostos aos portugueses nos últimos três anos, sobretudo quando declara que tiveram de questionar os “direitos adquiridos”, que ele considera geradores de injustiças relativas (!), não tanto para as corrigir, diz, mas apenas para salvaguardar o essencial, que não identifica.

Esses direitos adquiridos – que continua a pôr em causa – serão os relacionados com os pensionistas ou reformados que cumpriram as suas obrigações perante o Estado? Ou com os trabalhadores que, estando no desemprego, viram reduzida a duração e o valor das prestações que recebiam? Ou os excluídos que ficaram sem apoio social?

Passos apregoa uma visão personalista e humanista e, com ela, a intenção de preservar e salvaguardar socialmente os mais desprotegidos e que, contrariamente ao que dizem os seus opositores, inovou nos mecanismos de proteção (!), para tornar a sociedade mais inclusiva!

Alguém poderá acreditar nele? Então, os mais desprotegidos não foram os que mais sofreram e continuam a sofrer com os cortes e restrições que ele impôs? Que visão humanista é esta que, chegado ao Governo e contrariando as suas promessas, reduziu salários, subsídios de doença e de desemprego, cortou subsídio de Natal e de férias e outros apoios sociais?

Senhor primeiro-ministro, chega de mentira.

A desfocagem da realidade é de tal ordem que, na moção que leva ao congresso do seu partido, afirma que na Saúde pagou dívidas astronómicas, que alargou a rede de cuidados e aumentou os níveis de atendimento à população!

Mas como é possível dizer tamanha barbaridade, se o seu Governo, de forma insensível, mercantilista e obediente a interesses externos, decretou insuportáveis aumentos nas taxas moderadoras, agravou o pagamento de tratamentos, encerrou unidades de saúde e reduziu orçamentos hospitalares, com consequências terríveis no atendimento e tratamento dos doentes?

A desorientação é enorme e, por isso, tanto assegura que a recessão teve consequências severas nas políticas sociais, como diz que o seu partido preservou e salvaguardou o Estado social e garantiu que o serviço público de saúde, educação e apoio social nunca deixassem de cumprir com intensidade o seu papel! Então por que ataca o modelo de educação? Por que favorece o ensino privado e destrói o público?

Garante, na moção, nunca ter deixado de olhar para os grupos sociais mais vulneráveis, como os idosos, as crianças e as pessoas portadoras de deficiência! Acredito, mas estou convencido de que era apenas para ver como podia empobrecê-los mais do que já estavam.

Ou Passos não tem noção da realidade, ou tem muita lata.

Ex-deputado do PS

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