Depois do incêndio, o Stop quer voltar à vida normal como espaço cultural

No centro comercial, espera-se que o fogo de terça-feira não atrapalhe o licenciamento como espaço cultural, que está em “velocidade cruzeiro”.

O incêndio de terça-feira foi o segundo no período de um ano e meio, no Stop
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O incêndio de terça-feira foi o segundo no período de um ano e meio, no Stop Nelson Garrido
Fuligem afectou várias salas, mesmo as que não foram atingidas pelo fogo
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Fuligem afectou várias salas, mesmo as que não foram atingidas pelo fogo Nelson Garrido

A esfregona pousada no chão da sala diz tudo: os irmãos Amorim estão a montar um quarteto de jazz, mas os últimos dias têm sido sobretudo passados em limpezas e a avaliar os estragos do incêndio da madrugada de terça-feira, que voltou a assustar os inquilinos do Centro Comercial Stop, no Porto. O fogo aconteceu numa sala do segundo piso, mas as consequências chegaram ao rés-do-chão, onde os Amorim arrendam uma sala.

Sexta-feira, quando a noite caiu, o Stop voltou a abrir o seu portão, por onde, nos últimos anos, entram diariamente dezenas de músicos para ali ensaiar. Uma equipa de limpeza, munida de baldes e esfregonas, tentava tirar do chão grandes quantidades de pó preto. Já se fazia rock, ao longe, mas os sinais do fogo estavam ainda bem presentes, a começar no cheiro.

Os Kopus Day, o quarteto de jazz que Carlos, Fernando e Nelson Amorim estão a criar, têm que esperar. “Ainda não tive tempo de contabilizar os prejuízos”, disse ao PÚBLICO Carlos Amorim, 69 anos, guitarrista. Para além de ali ensaiar, tem uma pequena oficina de electrónica, que presta apoio a alguns dos músicos que ensaiam no Stop – como Manel Cruz, dos extintos Ornatos Violeta, revela Carlos, orgulhoso.

As contas estão por fazer, mas Carlos já sabe que a água usada para combater as chamas infiltrou-se no espaço dos Kopus Day, enferrujando ferramentas e molhando amplificadores.

André Matos tem menos 40 anos do que Carlos. Tem um estúdio de gravação para uso pessoal mesmo em frente à sala onde deflagrou o fogo. Na sexta-feira, quando o PÚBLICO o encontrou no Stop, ainda não conhecia a dimensão dos estragos. Só sabia que o estúdio ficou “encharcado”. “Muitos músicos ficaram com as salas inundadas”.

A água não gosta de aparelhos electrónicos, nem das madeiras dos instrumentos, mas o fumo também “entra nos circuitos” e pode fazer das suas. Como a maioria dos músicos do Stop, André não tem seguro.

Autarquia com “maior abertura”
Em Junho de 2012, o Stop esteve nas notícias devido a um outro incêndio, que terá sido provocado por um curto-circuito num estúdio. As causas do fogo de terça-feira, que fez dois feridos ligeiros, estão ainda por apurar, mas o chefe dos trabalhadores auxiliares do Stop, Carlos Freire, disse ao PÚBLICO que terá começado com a queda de uma vela numa sala ocupada por um “professor de música já reformado”. “Podia acontecer em qualquer lado.”

Carlos Amorim, que trabalha com electrónica “desde 1959”, reconhece que, depois do fogo do ano passado, houve um “grande avanço” nas condições de segurança do Stop. Mas defende que o valor pago em condomínio (100 euros por mês, no seu caso) justificaria inspecções regulares às quase 150 salas do centro comercial.

“Há jovens que são capazes de ligar sete aparelhos numa tomada”, ilustra. Ele, mais experiente, joga pelo seguro: investiu 400 euros na melhoria de tomadas e cabos eléctricos e “nunca” deixa “nada ligado” à corrente quando abandona a sala.

Carlos Freire diz que, com os valores pagos pelas bandas, “as pessoas não podem exigir” muito mais. Em 2012, foram investidos cerca de 70 mil euros na melhoria do Stop, “um edifício antigo” que “não tinha condições”. Na terça-feira, tudo – detector de incêndio, portas corta-fogos, extintores, bocas-de-incêndio – funcionou como deve ser, garante.

O objectivo agora é retomar a vida normal e continuar a procurar, junto da Câmara do Porto, licenciar o Stop como um espaço cultural. O processo está em “velocidade cruzeiro” e não deve ser posto em causa pelo fogo, acredita Freire. Detectou na nova equipa à frente da autarquia “maior abertura” para o projecto, que dinamizou um centro comercial em decadência. “Não queremos que isto seja um Dallas.”

“Isto é um centro comercial que é mais um centro musical Stop. Dizem que é único na Europa”, diz Carlos Amorim. “Isto faz-nos falta.”
 

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