João Rendeiro, Fezas Vital e Paulo Guichard vão ser julgados por crime de burla qualificada

Os três ex-gestores do BPP são acusados de terem levado os accionistas da Privado Financeiras, veículo criado pelo banco para entrar na luta de poder do BCP, a investirem 100 milhões, sem lhes dar a conhecer que a sociedade já estava insolvente.

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Daniel Rocha
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Nelson Garrido

O juiz de instrução Carlos Alexandre acaba de emitir um despacho de pronúncia dos arguidos João Rendeiro, Salvador Fezas Vital e Paulo Guichard, confirmando a acusação do Ministério Público que os considerou culpados do crime de burla qualificada em co-autoria. Uma decisão que levará os três ex-gestores do BPP a julgamento, algo que a defesa dos arguidos procurou evitar.

Em causa está uma queixa-crime metida pelos accionistas da Privado Financeira (a maioria cliente do BPP e também accionista do banco liderado por Rendeiro), um veículo de investimento criado por João Rendeiro para entrar no BCP, no quadro da luta de poder que se travou dentro do maior banco privado português entre 2006 e 2008.

Em Março de 2008, a Privado Financeiras fez um aumento de capital de mais 100 milhões de euros (verba aplicada no BCP), subscrito pelos accionistas. Os queixosos alegam que a sua decisão de participar no aumento de capital foi realizada com base em dados errados, dado que a verdadeira situação financeira da sociedade, que já era negativa, lhes foi omitida.

O juiz considerou ainda que Rendeiro, Fezas Vital e Guichard esconderam aos accionistas do veículo não só o seu nível de endividamento (um empréstimo de 200 milhões de euros contraído junto do JP Morgan, assim como as condições em que foi negociado) e também um descoberto no BPP de 50 milhões de euros. Sem ter conhecimento que a PF já estava deficitária, os accionistas investiram 100 milhões de euros no aumento de capital da sociedade de investimento, uma operação que se destinava a reforçar até 5% a posição da PF no BCP. O despacho revela que Rendeiro, Fezas Vital e Guichard também subscreveram acções da Privado Financeiras, mobilizando um prémio que lhes foi entregue pelo BPP, em Janeiro de 2008, mas que deveria ter sido distribuído apenas no final de 2008. Recorde-se que, em Dezembro daquele ano, o banco colapsou e foi intervencionado. 

Segundo a acusação do Ministério Público, os três ex-gestores do BPP cometeram “um crime de burla qualificada, em co-autoria”, associado a “uma operação de aumento de capital, realizada no veículo de investimento Privado Financeiras”, em 2008. Esta situação gerou “prejuízos para cerca de uma centena de ofendidos” que poderão ser contabilizados pelo menos em cerca de “41 milhões de euros.”

Recorde-se que, em Abril de 2007, João Rendeiro apareceu a anunciar que tinha adquirido, através da sociedade Privado Financeiras, com sede na Bélgica, uma participação qualificada de 2% no BCP, um investimento de cerca de 200 milhões de euros. A instituição revelava ainda que se preparava para solicitar ao Banco de Portugal autorização para chegar aos 5%, o que implicaria um investimento total, a valores de então, de 547 milhões de euros. Rendeiro sustentou a entrada no BCP pelo “significativo potencial de valorização” da acção que ontem se negociou a 10 cêntimos. No ano seguinte, o fundador e ex-presidente do BPP veio pedir a intervenção pública, incapaz de cumprir com os compromissos assumidos com os credores e os clientes.
  
A investigação realizada pela 9.ª Secção do DIAP de Lisboa foi desencadeada em Fevereiro de 2010 após um grupo de clientes do BPP ter apresentado queixa contra os ex-administradores relacionados com a gestão da Privado Financeiras, tendo o Ministério Público, em Janeiro deste ano, deduzido uma acusação contra a equipa de Rendeiro. O juiz Carlos Alexandre confirmou-a hoje. Trata-se de um de vários processos que correm contra os três ex-gestores.   

Inquirida pelo PÚBLICO, a advogada Fátima Godinho, da Carneiro Pacheco & Associados, que dá apoio a cerca de uma vintena de ex-clientes do BPP, que apresentaram queixas contra os três ex-gestores, confirmou o despacho do juiz Carlos Alexandre, que remete o processo para julgamento final, mas revelou não poder pronunciar-se. 

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