Uma História da Alemanha no Museu do Louvre

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A Forja, de Adolf Friedrich Erdman von Menzel, glorifica os heróis do trabalho que ergueram a Prússia

Grande exposição histórico-retrospectiva, "Da Alemanha, 1800-1939: De Friedrich a Beckmann", até 24 de Junho.

No início desta semana, não estava anunciada a presença de François Hollande e Angela Merkel na inauguração da grande exposição histórico-retrospectiva Da Alemanha, 1800-1939: De Friedrich a Beckmann, que desde sexta-feira, e até 24 de Junho, pode ser visitada no Museu do Louvre, em Paris. Se tivessem estado presentes — ou se tal puder vir ainda a acontecer —, é bem provável que os dois estadistas tivessem dado as mãos, à imagem do que ambos já fizeram em tempos recentes, e também evocando o gesto histórico dos seus antecessores de há meio século atrás, Charles de Gaulle e Konrad Adenauer, que em Janeiro de 1963 assinaram em Paris um tratado de amizade entre os dois países recém-saídos da Segunda Guerra Mundial.

Trata-se, agora, de solidificar essa relação, mas numa perspectiva cultural. A cultura-Kultur — conceito nascido das ideias iluministas francesas, mas que foi igualmente a base sobre a qual se constituiu a Alemanha moderna, nomeadamente a partir de Goethe — é aqui a das imagens e da história da pintura, entre o paisagismo romântico de um Caspar David Friedrich (1774-1840) e a Nova Objectividade de um Max Beckmann (1884-1950). São estes dois pintores que balizam o período retratado na grande exposição que agora se apresenta no Louvre, curiosamente instalada na Galeria Napoleão, o imperador que está associado ao fim do Sacro-Império Romano-Germânico e à emergência daquilo que viria a ser a Alemanha moderna. “Multi-confessional, marcada por uma descontinuidade geográfica, por uma flutuação de fronteiras, por contextos políticos e culturais muito diferentes, e mesmo antagónicos, a Alemanha fez emergir a unidade subjacente ao conjunto dos seus cidadãos, da Baviera ao Báltico, da Renânia à Prússia”, nota o texto de apresentação da exposição comissariada por Sébastian Allard, Danièle Cohn e Johannes Grave.

Ao todo, são duas centenas de obras distribuídas por três núcleos temáticos: Apolíneo e Dionisíaco; A Paisagem como História, de Caspar David Friedrich a George Grosz; Ecce-Homo, Humano-Desumano. Começa sob os auspícios de Goethe e Nietzsche, e de um lugar simultaneamente temporal e geográfico que tanto vai beber à estética Grécia clássica como ao desejo de um presente germânico-alemão. Gottlieb Schick, Moritz von Schwind, Friedrich Schinkel, Arnold Böcklin, Hans von Marées, Franz von Stuck e os já referidos Caspar David Friedrich e Max Beckmann são os artistas em cena.

O desejo de erigir a pintura da Paisagem em pintura da História, fazendo da natureza a protagonista maior desta arte, é o denominador comum do segundo núcleo, com obras de Jacob Philip Hackert, Joseph Anton Koch, Carl Gustav Carus, Philip Otto Runge, Paul Klee, Otto Dix, Franz Radziwill e George Grosz, além de uma grande sala dedicada a Friedrich.

Finalmente, Ecce Homo, na sua dupla dimensão humano-desumano, abre com a famosa tela de Adolf Friedrich Erdman von Menzel, A Forja (1872-75), elogio dos novos ciclopes, os heróis do trabalho, sobre cujo imaginário se erigiu a Prússia, e atravessa o traumatismo da Primeira Guerra Mundial até ao advento do nazismo e da barbárie. Lovis Corinth, Otto Dix, George Grosz, Christian Schad e Max Beckmann ajudam também a traçar este percurso, que, na história da pintura, desemboca na famosa exposição Arte degenerada, organizada pelos nazis em Munique, em 1937. Bastariam mais dois anos para que nem a Arte nem a História voltassem a ser as mesmas...

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