As bandeiras de Vladimir estão unidas por um nó que nunca será desatado

Chegou ao fim a caminhada de Cabo Verde na CAN 2013. Mas o bem já estava feito, apesar da eliminação.

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Em Almada, sofreu-se por Cabo Verde Enric Vives Rubio

Quando um guarda-redes sobe até à área adversária é sempre sinal de desespero. Foi o que fez Vozinha, guarda-redes da selecção de Cabo Verde, já com poucos segundos para se jogar no encontro com a selecção do Gana para os quartos-de-final da Taça das Nações Africanas, que se está a realizar na África do Sul. Tentou ser mais um corpo no meio de tantos. Canto marcado, a bola nem sequer chegou perto do guardião. Em contra-ataque Mubarak levou a bola nos pés e fez o 2-0 com tuda a facilidade do mundo, porque Vozinha não foi rápido o suficiente para chegar à sua baliza antes de o avançado ganês confirmar a eliminação dos “tubarões azuis” nesta sua primeira participação na CAN.

Foi neste momento que o auditório do Teatro Municipal de Almada, onde dezenas de caboverdianos acompanhavam o que se passava em Port Elizabeth, se começou a esvaziar. Tinham sido duas horas de emoções fortes e esperança permanente. Palmas e gritos a cada remate, a cada desarme salvador, assobios a cada decisão do árbitro, muitos quando este assinalou um penálti aos 52’ por falta de Carlitos sobre Asamoah Gyan. “Vamos lá, Vozinha”, foi o apelo feito por um adepto envolto na bandeira quase toda azul de Cabo Verde. Vozinha não conseguiu responder ao desafio feito em Almada, a quase 9000km do estádio Nelson Mandela.

Pelo contrário, Dauda, guardião do Gana, segurou tudo. “Penso que foi o melhor jogador em campo. Cabo Verde atacou mais e podia ter marcado vários golos”, resumiu José Maria Neves, primeiro-ministro de Cabo Verde, que esteve neste sábado à tarde em Almada a assistir ao jogo. Foram, pelo menos, três defesas daquelas que se descrevem “impossíveis”. Mas o bem já estava feito, apesar da eliminação da CAN.

“Conto ver a selecção nos próximos Mundiais. A partir de agora, temos mais responsabilidades. É algo de extraordinário para o país, um exemplo para a juventude. Estamos habituados a uma vida dura, mas temos conseguido ir para além dos nossos limites. Podemos sonhar, desde que tenhamos empenho e muito trabalho”, garante o governante, para quem o comportamento da selecção de Lúcio Antunes terá influência decisiva quando alguns jogadores de origem caboverdiana tiverem de escolher entre representarem Portugal (como fizeram, por exemplo, Nani e Rolando) e Cabo Verde: “Vão pensar duas vezes. Vamos ter mais jogadores que estão pelo mundo a jogar por Cabo Verde. Este foi o primeiro passo.”

Algumas (não muitas) bandeiras de Cabo Verde coloriam o auditório e uma delas destacava-se das outras. Era a de Vladimir Almeida e estava ligada numa das pontas, com um nó, a uma de Portugal. Ele mostrava as duas quando lhe pediam para tirar fotografias, com a filha mais nova, Daniela, e com a irmã, Arminda. As bandeiras unidas eram o símbolo da sua fidelidade dividida entre o país onde nasceu e o país onde vive desde os dez anos.

“Vim de São Vicente aos dez anos com os meus irmãos”, recorda este engenheiro civil de 53 anos, contando logo a seguir a história das suas bandeiras. Foram unidas em 2006, quando a selecção portuguesa defrontou Cabo Verde em Évora e Vladimir gritou por cada um dos quatro golos portugueses e pelo único de Cabo Verde. E se se voltarem a defrontar num Mundial, por quem torcerá Vladimir? Não consegue escolher. “Empate”.
 

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